A Saúde e o dever de inclusão
A legislação não permite que a operadora negue o ingresso de beneficiários em razão de seu estado de saúde
A recusa de operadoras de plano de saúde em admitir pessoas com doenças pré-existentes, especialmente em planos coletivos por adesão ou empresariais, é uma das formas mais cruéis de discriminação institucionalizada no sistema de saúde suplementar brasileiro.
Meses atrás, foi revelado que uma administradora de benefícios tem adotado a prática de negar o ingresso de beneficiários com determinadas enfermidades, alegando cláusulas genéricas do contrato coletivo. A orientação transmitida aos atendentes é objetiva e alarmante: "recusar a adesão de qualquer pessoa com doença que exija tratamento ou acompanhamento médico frequente", mesmo que haja previsão de cumprimento de cobertura parcial temporária, como determina a Lei nº 9.656/98.
Trata-se de conduta flagrantemente ilegal. A legislação não permite que a operadora negue o ingresso de beneficiários em razão de seu estado de saúde. O que a lei prevê, no máximo, é a imposição de cobertura parcial temporária para procedimentos diretamente relacionados à doença pré-existente, pelo prazo de até 24 meses. Não há, portanto, base legal para exclusão do paciente do sistema privado de saúde.
Ao adotar tais práticas, a operadora não apenas desrespeita a legislação, mas também comete um ato de profundo desprezo à dignidade humana. Recusar um paciente por ser doente é inverter completamente a lógica da assistência à saúde: atender quem mais precisa deve ser obrigação, não exceção.
É urgente que a ANS atue, que o Ministério Público intervenha e que o Judiciário reafirme que planos de saúde não podem atuar como clubes seletivos. Saúde é direito, não privilégio de quem tem certidão de boa saúde.
O contrato de plano de saúde possui uma função social clara: garantir o cuidado com a vida e a saúde dos beneficiários. Não se trata de um serviço qualquer, mas de um serviço essencial, assim como o fornecimento de energia elétrica ou água. Por isso, não cabe à operadora escolher a quem atender com base em critérios econômicos ou de risco. O objetivo maior deve ser a proteção da saúde, e não exclusivamente o lucro. Quando uma operadora se esquece disso, ela fere não só a lei, mas também a ética e o próprio compromisso social que assumiu.