Legislativo Judiciário Executivo

CPI convoca reverendo que negociou 400 milhões de doses da AstraZeneca em nome do Governo Federal

Amilton Gomes de Paula chegou a negociar um valor três vezes maior que o pago em compra feita em janeiro

Escrito por Redação ,
Registro publicado pro Amilton Gomes de reunião no Ministério da Saúde
Legenda: Reverendo publicou fotos de uma reunião no Ministério da Saúde em rede social
Foto: reprodução/redes sociais

A CPI da Covid aprovou, nesta quarta-feira, (7) a convocação do reverendo Amilton Gomes de Paula, fundador da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah). O reverendo teria atuado na negociação da venda da vacina AstraZeneca em nome do Governo Federal. As informações são do portal G1.

Fundada em 1999 pelo reverendo, a Senah é organização evangélica sediada em Águas Claras (DF). A instituição desenvolve o Fest Vida, projeto de ação sociocultural no DF e nas cidades do entorno.

Conforme e-mails revelados pelo Jornal Nacional, o diretor de Imunização do Ministério da Saúde (MS), Lauricio Monteiro Cruz, chancelou que o reverendo e a Senah negociassem 400 milhões de doses da vacina com a empresa norte-americana Davati.

Em uma das mensagens, Amilton Gomes de Paula chega a tratar de valores do imunizante, pedindo a atualização do preço da AstraZeneca para 17,50 dólares por dose. O valor equivale ao triplo dos 5,25 dólares que o MS pagou em cada dose da vacina comprada de um laboratório da Índia em janeiro.

Amilton Gomes foi citado pela primeira vez na CPI no dia 1º de julho, em depoimento do policial militar Luiz Paulo Dominguetti. O PM se apresentou como representante da Davati Medical Supply, companhia que atuaria como intermediária na compra de vacinas.

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Segundo Dominguetti, ele recebeu uma cobrança de propina durante as negociações com o governo brasileiro. O PM teria participado de duas reuniões no MS — as quais teriam sido viabilizadas pelo reverendo — com Lauricio Cruz, o tenente-coronel Marcelo Blanco, ex-assessor do Departamento de Logística, e com o coronel Élcio Franco, secretário-executivo da Pasta àquela altura.

E-mails do reverendo

Lauricio Cruz, diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do MS, enviou, no dia 23 de fevereiro, e-mail para Amilton Gomes. O assunto da mensagem era "lista de presença e carta de proposta para fornecimento".

O e-mail começa agradecendo a disponibilidade da Senah, representada pelo reverendo, na apresentação de proposta comercial para o fornecimento de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca.

Ao fim, Cruz diz que "todos os processos de aquisição de vacinas no âmbito do Ministério da Saúde estão sendo direcionados pela Secretaria Executiva".

No dia 4 de março, o reverendo publicou fotos de uma reunião no MS em uma rede social, com Cruz em um dos registros. Na postagem, Amilton Gomes disse que a Senah fazia reunião na Pasta para "articulação mundial em busca de vacinas e para a consecução de uma grande quantidade dos imunizantes a ser disponibilizada no Brasil".

Em 9 de março, Cruz envia outro e-mail, endereçado a Herman Cardenas, presidente da Davati nos Estados Unidos. Na mensagem, ele informa que a Senah, representada por Amilton Gomes, esteve no Ministério da Saúde em agenda oficial da Secretaria de Vigilância em Saúde e no Departamento de Logística com a discussão sobre as tratativas sobre a vacina da "AstraZenica" e que o mesmo fora encaminhado para a Secretaria Executiva do Ministério da Saúde.

O diretor de Imunização deixa claro, em outro trecho do e-mail, que a Senah tinha aval da Pasta para negociar a compra de vacinas com a Davati. "Por fim, esperamos que os avanços de forma humanitária entre o Ministério e 'AstraZenica' pelo Instituto Nacional de Assuntos Humanitários", escreveu.

No dia seguinte, em 10 de março, o reverendo Amilton Gomes enviou e-mail em inglês para Herman Cardenas. No texto, ele agradece a confiança depositada na Senah em conduzir tratativas com o MS, incluindo que "as negociações estão em estágio final e a expectativa é que o contrato seja assinado em 12 de março de 2021".

O reverendo pede ainda que os dados para o preenchimento do contrato de aquisição dos imunizantes sejam enviados, além do SGS para ser enviado ao ministro quando ele requisitasse.

SGS é o nome de uma empresa de certificação que atesta a conformidade de determinado produto com as normas e regulamentações vigentes.

Reverendo diz o preço

Ao fim, Amilton Gomes faz um pedido. "Nós solicitamos com urgência o FCO atualizado, com o valor de US$ 17,50 como acordado em 5 de março e com a data de entrega". O FCO é uma sigla que equivale a "oferta completa de venda". Um dia depois, o reverendo envia uma nova mensagem, em inglês, reafirmando o papel da Senah para o presidente da Davati.

"A Senah, devidamente reconhecida como interlocutora na negociação referente à aquisição das vacinas AstraZeneca entre a companhia Davati e o Ministério da Saúde, vem através deste informar que em 12 de março, às dez da manhã, no horário do Brasil, haverá um encontro com o secretário-executivo do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco, para tratar de questões relacionadas à aquisição de vacinas da AstraZeneca via Davati, fortalecendo assim a confiabilidade dos laços para futuras aquisições", escreveu.

Amilton Gomes pede a presença de representantes da Davati no encontro, logo no dia seguinte. Cristiano Carvalho, representante da Davati no Brasil, afirmou ao Jornal Nacional, por telefone, que a reunião com Élcio Franco, na época secretário-executivo do MS, ocorreu dia 12 de março pela manhã.

Na agenda oficial de Franco, porém, havia uma reunião com o presidente do Instituto Força Brasil, coronel Hélcio Bruno de Almeida, em 12 de março. O representante da Davati afirma que ele também participou do encontro.

Élcio Franco foi exonerado do cargo em 26 de março, e o negócio com a Davati não foi concretizado.

Mais convocações

A CPI da Covid aprovou, também nessa quarta, convocação de William Amorim Santana, servidor do MS, e de Andrea Lima, CEO da empresa VTCLog.

William Santana trabalha no setor de Importação da Pasta, sendo subordinado a Luis Ricardo Miranda, irmão do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que denunciou irregularidades no contrato da vacina indiana Covaxin e pressão pela aprovação do imunizante.

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Após apurações da CPI, William foi mencionado como um dos servidores que indicaram irregularidades no contrato de aquisição da vacina.

Andrea Lima, por sua vez, por convocada a explicar os contratos mantidos com o MS. A empresa é responsável por receber, armazenar e controlar a distribuição de  todas as vacinas, soros, medicamentos e outros insumos da Pasta, conforme ressaltou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, no pedido de convocação.

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