Volume de índigo que sai da produção poderia ser maior

No Ceará, um dos maiores do País em volume de índigo, a produção no 1º trimestre caiu 15%

Escrito por Redação ,

Segmento que fornece a matéria-prima para a fabricação das confecções, a indústria têxtil de jeans, na perspectiva nacional e também estadual, detém números importantes e possui representatividade na economia do País. Com produção estimada em 700 milhões de metros lineares por ano no Brasil, segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), o segmento coloca o Brasil em destaque dentre os grandes produtores mundiais de índigo. Apesar dos números vantajosos, a situação têxtil poderia estar em situação melhor, segundo a avaliação do diretor superintendente da Abit, Fernando Pimentel.

"Toda a indústria poderia estar melhor, na verdade. Estamos enfrentando dificuldades com relação à competitividade, principalmente depois da crise de 2008, que ainda traz consequências pesadas", afirma. As barreiras para o crescimento têxtil não se diferenciam muito dos entraves ao desenvolvimento da confecção: carga tributária, alta das taxas de juros, aumento da inflação e a importação de tecidos. "Precisamos de políticas que tragam competitividade com os produtores internacionais", cobra o presidente da Abit, destacando o potencial de crescimento que o setor possui.

No Ceará, um dos maiores do país em volume de índigo, a produção no primeiro trimestre de 2014 diminuiu 15%, valor um pouco superior ao de 2013. A queda, entretanto, é normal para o período, segundo a diretora executiva do Sindicato da Indústria de Fiação de Tecelagem Geral no Estado do Ceará (Sinditêxtil), Kelly Whitehurst.

Mesmo com a aparente estabilidade, a necessidade de atenção para o setor têxtil é reforçada por Whitehurst. "Faz-se necessário o desenvolvimento de uma política industrial consistente que venha, verdadeiramente, impactar o setor têxtil para essa atividade", destaca.

Desafios

Entre os produtores, é consenso que a importação de tecidos asiáticos, seguida da alta tributação, representam o maior desafio para a indústria têxtil. "O Brasil precisa encarar a indústria têxtil com mais seriedade. Competimos com países que não possuem o mínimo respeito às condições humanas de trabalho, com informalidade e trabalho quase escravo ou infantil, como Bangladesh, Índia, China e Paquistão", reforça o diretor executivo de operações da Vicunha Têxtil, Marcel Yoshimi Imaizumi.

Segundo ele, algumas fiações estão fechando devido à baixa demanda de fios, aumento de custos de insumos e energia cara. "O cenário atual para o mercado têxtil brasileiro não está bom", atesta. A Vicunha, com plantas industriais no Ceará, Rio Grande do Norte, Equador e Argentina, produz, mensalmente, 17 milhões de metros de tecido, sendo nove milhões no Ceará.

A escassez de mão-de-obra qualificada e as dificuldades logísticas também são citadas por Imaizumi, dentre as dificuldades do setor, que poderiam ser reduzidas também com melhorias na cadeia confeccionista.

O conselheiro da Santana Textiles, Laércio Rossi, destaca o endividamento da população brasileira como outro fator de influência na construção desse cenário desfavorável. "Por conta dos programas de incentivo ao crédito, as pessoas se endividam e deixam de comprar roupas", diz.

Sentindo também o peso da tributação, o conselheiro afirma que não está sendo possível repassar os custos da produção no preço da mercadoria produzida. "O custo da energia e os impostos descontados na folha pesam na produção", detalha. (JC)

Grandes marcas apostam em facções

Terceirizar a produção, por meio de parceria com facções, é regra adotada pela maioria das empresas donas de grandes marcas. Elas utilizam o sistema 'private label' ou etiqueta privada, contratando pequenas confecções para produzirem sob encomenda e atendendo as especificações de suas marcas. Depois de prontos os produtos recebem a etiqueta da marca. Enquanto os proprietários das grifes ganham em escala, os pequenos garantem espaço no mercado, faturando e gerando renda a partir da criação de mais postos de trabalho.

Exemplo de sucesso nesse campo, a fábrica Vision produz até 25 mil peças por mês para marcas consolidas no mercado, como a Fill Sete. "Nossa produção mensal varia de 20 mil a 25 mil peças. Mas já chegamos a produzir 44 mil peças/mês no ano passado. É sazonal. A demanda aumenta mesmo no segundo semestre. Nesse período a produção cresce naturalmente devido às vendas no fim do ano", explica Thiago Beco, proprietário da Vision.

Conforme o empresário, quando a demanda supera a capacidade produtiva da empresa, a solução é terceirizar firmando parceria com outras facções de menor porte. "Em nossa fábrica temos hoje 60 funcionários diretos. Além deles são cerca de mais de 150 indiretos, entre trabalhadores das facções que temos parceria e beneficiadores de lavanderias", explica. A produção da Vision reúne quatro marcas diferentes. "A maior parte da nossa produção é destinada a Fill Sete, que representa 80% do nosso faturamento. Os 20% restantes se divide entre outros três clientes. Produzimos camisas, calças, shorts, jaquetas, bermudas. Tudo jeans e sarja".

Viabilidade

Thiago Beco trabalha com 'private label' por opção. "Já tive marca própria - a Cronic. Estou no mercado desde 2005, mas vendi minha marca em 2011 para me dedicar às outras etiquetas. Para mim foi muito mais rentável e viável. Não conseguia conciliar as duas produções - dos clientes 'private label' e da marca própria", afirma.

Segundo ele, a complicação estava em dividir as linhas de produção, os estoques, a logística, o controle de caixa, além de ter de administrar os diferentes prazos. "Nem todos têm sucesso com marca própria. Meu perfil é mais produzir para os outros. Além disso, o mercado do jeans já foi mais aquecido. E toda marca tem vida útil", argumenta. Empreendedor, Beco afirma que sua confecção vai muito além de uma simples facção. "No ramo da confecção, as facções normalmente recebem as peças já cortadas e fazem o trabalho de fechar cada uma delas. A Vision funciona como uma indústria, desde o desenvolvimento da peça piloto até a entrega dos produtos no centro de distribuição do cliente. A gente engloba várias etapas do processo de produção, além da facção", observa.

Outro diferencial da Vision, segundo ele, é manter uma equipe própria para pesquisar tendências de moda.

"Esse é um serviço agregado que prestamos aos nossos clientes. Uma ferramenta a mais para facilitar o poder de escolha das peças para suas coleções", diz. A coordenação da equipe de estilo, informe, é de sua esposa, a designer Maiara Gusmão.

Fabricação própria otimizou produção e lucratividade

O processo inverso, de facção à marca própria, foi experimentado pelo empresário Marcus Venicius Rocha Silva, que também preside o Sindconfecções no Ceará. Depois de produzir durante muitos anos para grandes magazines de reputação nacional, ele decidiu apostar na própria marca, otimizando, assim, a produção e conseguindo ampliar a sua margem de lucro.

"Lancei minha marca no mercado em 2012, a Dogville. Hoje produzo 12 mil peças por mês. Estou mais otimista do que antes, quando fabricava 60 mil peças/mês para terceiros. A vantagem de sair de grandes clientes para fazer minha própria distribuição é, em primeiro lugar, o aumento de competitividade".

Segundo o empresário, produzindo a própria marca, é possível agregar valor ao produto e otimizar a produção. "Então, mesmo reduzindo a produção, posso ter um lucro maior. Até porque, os grandes magazines, entre ano e sai ano, continuam segurando o preço que pagam às facções", afirma o empresário.

Além de produzir roupas em jeans, a Dogville fabrica também peças de tactel e malha. "Nossa marca está crescendo no mercado em torno de 25% a 30% ao ano", garante o Venicius, que diz depositar na etiqueta sua segurança de futuro.

Como líder classista, Marcus Venicius está trabalhando para fomentar as marcas cearenses a agregarem valor a seus produtos e, assim, começarem a despontar no mercado. "Há uma tendência nos últimos três anos de as empresas buscarem ter vida própria, aqui no Ceará", afirma.

Retorno

Ele cita como exemplo a empresa Sol e Água, que trabalha com moda praia. "Antes ela produzia 80 mil conjuntos por mês para grandes magazines e hoje faz 40 mil para a própria marca".

Outro caso citado pelo presidente do Sindconfecções é o da Lepel Nordeste, que além de produzir para grandes lojas, está dedicando 30% de sua produção para a própria marca - Diuncorpo Lingerie. De acordo com Venicius, a transformação de facções em marcas é positiva para a moda cearense. "A gente vai passar a ter identidade. Com isso o DNA da confecção no Ceará muda de status, deixando de ser produtor de confecção para ser lançador de marca", fala. (AC)

Ângela Cavalcante
Repórter

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