Consumo das famílias recua 0,3%

Um dos fatores que contribuíram para o fraco desempenho foi o comportamento da massa salarial

Escrito por Redação ,
Legenda: O aumento na taxa básica de juros também ajuda a explicar a queda, tanto no consumo das famílias quanto nos investimentos
Foto: Foto: VIVIANE PINHEIRO

Rio. Após uma sequência de 11 anos de resultado positivos, o consumo das famílias interrompeu o ciclo de crescimento. O crédito mais caro, os ganhos salariais mais modestos e a inflação pressionada contribuíram para reduzir o resultado do componente - que já foi o principal motor do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro - a uma alta de apenas 0,1% no terceiro trimestre, em relação ao mesmo período do ano anterior.

O desempenho, tido como estável, não era tão fraco desde o terceiro trimestre de 2003, quando houve queda de 1,5%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na comparação com o segundo trimestre deste ano, ainda houve um recuo de 0,3% no consumo das famílias, o pior resultado desde o quarto trimestre de 2008, auge da crise internacional.

"A gente continuou tendo crescimento da massa salarial real, que é uma mistura de crescimento do emprego e do salário real. Só que a taxa é bem menor que no trimestre anterior (segundo trimestre de 2014), de 4,1%", disse Rebeca Palis, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE. "E tem a manutenção da inflação e os juros mais altos do que estavam no ano anterior", completou.

Massa salarial

No terceiro trimestre deste ano, o crescimento da massa salarial real foi de 2,9%, lembrou o IBGE. "Do lado da demanda, a surpresa negativa ficou por conta do consumo das famílias", ressaltou a economista Alessandra Ribeiro, sócia da consultoria Tendências, para quem a perda de dinamismo do setor nos últimos trimestres está em linha com a fraqueza da criação de empregos, o crédito mais escasso e a confiança em queda.

A Fundação Getulio Vargas (FGV) já esperava que a confiança em baixa afetasse o desempenho do consumo das famílias. A Sondagem do Consumidor, realizada pelo Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV), mostra que a confiança dos consumidores em novembro diminuiu para 95,3 pontos, o menor patamar desde outubro de 2008, logo após o estouro da crise, em setembro daquele ano. "A gente esperava essa relação entre a confiança e a redução no consumo, porque a confiança já tem apresentado tendência de queda há 12 meses. A gente já observa o consumidor mais cauteloso, preferindo trocar as compras pela quitação de dívidas, preocupado com o encarecimento do crédito", disse Tabi Thuler, economista do Ibre/FGV.

O aumento na taxa básica de juros também ajuda a explicar a queda tanto no consumo das famílias quanto nos investimentos. A Selic ficou numa média de 10,9% no terceiro trimestre deste ano contra 8,5% no terceiro trimestre de 2013.

Taxas de juros

"Isso mostra que as taxas de juros mais altas já estão funcionando e que as famílias estão preocupadas em não consumir mais, com o endividamento, com medo de perder o emprego ali na frente", avaliou o ex-diretor do Banco Central e chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas.

Além disso, o crédito com recursos livres para pessoas físicas parou de crescer em termos reais. "O crescimento nominal foi de 5%. Se for deflacionar por algum índice de preços, provavelmente vai dar negativo", disse a gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

País fica quase na lanterna mundial

Rio. A queda de 0,2% na atividade econômica brasileira, no terceiro trimestre deste ano, em relação a igual período de 2013, deixou o País quase na lanterna do crescimento mundial. De uma lista de 34 economias, o Brasil ocupou a 31ª colocação, segundo levantamento da consultoria Austin Rating.

O desempenho brasileiro ficou abaixo do verificado em países como Grécia e Espanha, que ainda tentam se reerguer de crises severas, e foi o pior entre as grandes economias emergentes que compõem os Brics.

No topo deste grupo, a China cresceu 7,3%, no terceiro trimestre, ante igual período do ano passado, enquanto a Índia teve alta de 5,3%. Já o Produto Interno Bruto (PIB) da África do Sul, que vive quadro de inflação elevada, juros altos e atividade em recuperação, teve aumento de 1,4%. A Rússia, mesmo às voltas com a crise geopolítica envolvendo a Ucrânia, avançou 0,7%.

Piores resultados

O resultado brasileiro só não foi pior que a atividade de Itália, Japão e da própria Ucrânia. O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, responsável pelo estudo, atribui a má colocação do Brasil à gestão equivocada da política econômica.

"Há profundos problemas na gestão da política econômica, com destaque para a atabalhoada política monetária de juros relativamente altos, com inflação alta e atividade econômica em retração. Além, é claro, da política fiscal expansionista", disse Agostini, em relatório.

A recuperação, defendeu o economista, depende de mais investimentos e novos acordos multilaterais, diversificando o leque de países parceiros em termos de comércio. Hoje, os grandes consumidores das exportações brasileiras são China (commodities) e Argentina (manufaturados), que passam por ajustes. "Esses países não deverão manter a mesma contribuição observada em anos anteriores", previu Agostini. De julho a setembro deste ano, o desempenho do setor externo foi favorável ao crescimento na comparação com igual período de 2013.

Impostos influenciaram o resultado

Rio. O menor volume de impostos no terceiro trimestre puxou para baixo o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), no período, na comparação com o mesmo trimestre de 2013, segundo Rebeca Palis, gerente da coordenação de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). "(Impostos) puxou para baixo um pouquinho o PIB. Foi porque o volume dos impostos caiu mais nesse trimestre do que o valor adicionado", disse. O volume de impostos sobre produtos recuou 1,3%, enquanto o valor adicionado caiu 0,1%. No período, o PIB teve queda de 0,2%.

"Algumas atividades que pagam muito imposto, como a indústria, em alguns setores específicos, tiveram desempenho ruim. Daí ICMS e IPI tiveram queda", justificou, destacando que apenas impostos sobre produtos entram na conta.

Em nota, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, avaliou que "não se pode falar em aumento de impostos com esse PIB. Precisamos que haja redução de impostos e simplificação tributária, juros compatíveis com o padrão internacional e de uma infraestrutura que estimule o crescimento da produtividade. Somente a retomada do crescimento vai permitir que a economia volte a gerar mais empregos e renda e, assim, melhorar a qualidade de vida que o Brasil demanda e merece".

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