Legislativo Judiciário Executivo

Aliados e opositores de Sarto na Câmara Municipal travam queda de braço para emplacar CPIs

O líder do governo afirma que todos os processos de desafetações foram cumpridos conforme prevê a legislação e que não há o que “esconder”

Escrito por Bruno Leite , bruno.leite@svm.com.br
Plenário da Câmara
Legenda: Matéria chegou na casa nesta quarta-feira.
Foto: Érika Fonseca / CMFor

O tema das desafetações de terrenos pela Prefeitura Municipal voltou a movimentar a Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) nessa quarta-feira (17), quando um grupo de vereadores da bancada que faz oposição ao prefeito José Sarto (PDT) protocolou uma solicitação para a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) cujo objetivo seria investigar as vendas de terrenos públicos pelo gestor ao longo do mandato. A aceitação do pleito, no entanto, depende da fila de três outros pedidos, como prevê o regimento.

Pelo que consta no documento que formalizou o pedido da oposição, ao qual o Diário do Nordeste teve acesso, as medidas questionadas teriam sido objeto de denúncias e apresentariam indícios de irregularidades, além de terem sido tomadas “em favor de pessoas físicas e privadas, mediante o pagamento de valores demasiadamente abaixo do preço de mercado”.

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São mencionados no requerimento apresentado 18 projetos de lei que devem ser apurados, todos eles ingressados pelo Executivo em 2022. As áreas em questão, que foram objeto de desafetação, estão localizadas nos bairros Cambeba, Farias Brito, Messejana, Sapiranga, Presidente Kennedy, Aracapé, Bairro de Lourdes, Jangurussu, Carlito Pamplona, João XXIII, Planalto Ayrton Senna, Monte Castelo, Pedras e Santa Rosa.

Na justificativa, o grupo de parlamentares pontuou que seria “imprescindível” que a Casa aprovasse a abertura da CPI, “a fim de garantir a transparência, a lisura e a adequação dos procedimentos realizados no processo de desafetação dos imóveis em favor de ente privado, bem como identificar eventuais irregularidades e responsabilidades”. 

Subscreveram o requerimento os vereadores Léo Couto (PSB), Ana Paula (PSB), Adriana Almeida (PT), Júlio Brizzi (PT), Dr. Vicente (PT), Adriana Gerônimo (PSOL), Danilo Lopes (PSD), Ronivaldo Maia (PSD), Eudes Bringel (PSD), Cônsul do Povo (PSD), Estrela Barros (PSD), Tia Francisca (PSD), Bruno Mesquita (PSD), Anna Karina (PSOL), Julierme Sena (PL), Inspetor Alberto (PL) e Priscila Costa (PL). 

O quantitativo que deu entrada no pedido é de 17 legisladores, dois a mais que o número mínimo de 15 assinaturas, estipulado desta maneira pelo Regimento Interno da Casa Legislativa.

A iniciativa foi encampada por Couto, que, em contato com a reportagem, reforçou os argumentos utilizados para dar entrada no procedimento legislativo. “O Sarto pensa que pode mandar coisa para cá e que não tem ninguém olhando e fiscalizando. Tem terreno no Castelão com preço de metro quadrado por R$ 91", acusou. 

“São mais de 30 desafetações. Foi, de longe, o prefeito que mais desafetou ao longo da história, temos valores inferiores ao de mercado. Destas 30, cerca de 18 são com empresas privadas, dos quais algumas delas prestam serviço para a Prefeitura. São muitos indícios”, frisou o socialista.

Embate entre lados

Conforme prevê o regramento do Parlamento municipal, apenas três protocolos de CPI podem tramitar simultaneamente. A última protocolada foi a que visa apurar irregularidades no serviço de transporte por aplicativo na cidade de Fortaleza, liderada pelo vereador Márcio Martins (União) e ingressada no início de março. 

Martins também conduziu a movimentação de outras duas instalações de CPI que aguardam a análise da Presidência da CMFor: uma para investigar a qualidade do serviço na Enel e outra voltada para o acompanhamento dos serviços de água e saneamento prestados pela Cagece.

“Protocolei as minhas (solicitações) há mais de um mês. São temas que inclusive já fui até a tribuna no ano passado e retrasado pedir as CPIs, falar delas. Nenhuma das três é coisa nova. Estou dialogando com o presidente com relação a da Uber, para avançar”, mencionou Martins ao ser procurado. 

E reforçou: “Fiz isso cumprindo a legislação, a lei orgânica. Os temas são de grande relevância para a cidade. Cada fortalezense que você perguntar, com toda certeza vai relatar insatisfações com os temas que protocolei”.

Na visão de Léo Couto, o ingresso dos três pedidos de CPI pelos membros da base ocorreu “estrategicamente” para “tentar emperrar” eventuais pleitos semelhantes por parte da oposição. “Mas entramos com um requerimento hoje, onde a gente detectou algumas irregularidades nessas CPIs que estão colocadas, exatamente para tentar avançar e dar procedimento para a nossa”, ponderou.

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A versão foi negada pelo líder do governo na Câmara, o vereador Iraguassú Filho (PDT). Ele afirma que todos os processos de desafetações foram cumpridos conforme prevê a legislação e que não há o que “esconder”.

“Na verdade, temos alguns requerimentos de CPI protocolados de demandas que são importantes para a cidade e que a gente está aguardando a instalação, aguardando o devido processo legal”, justificou, mencionando os temas que orientam as medidas, que, em suas palavras refletem discussões já realizadas pela Câmara durante os últimos meses.  

O parlamentar disse encarar com naturalidade a iniciativa oposicionista: “É um direito de qualquer vereador apresentar requerimento, de que teor seja. De CPI tem um rito de assinaturas, a oposição juntou as suas e a gente trata com a maior naturalidade possível”.

“Em relação ao mérito, não temos nenhum problema, porque em todos os processos de desafetação foram cumpridos ritos, passou pela avaliação de três engenheiros, como a legislação estabelece, se mandou o projeto com as informações necessárias, alguns, o presidente da Casa solicitou informações complementares. Ou seja, não há o que se esconder”, acrescentou o pedetista.

Martins, entretanto, se absteve de tecer comentários que relacionam o projeto como uma estratégia da base de Sarto, por acreditar que esta seja uma prerrogativa do líder governista. “Que o Léo Couto apresente, de forma clara, com fatos e com provas, quais são as atecnias que têm nas CPIs”, emendou.

Recapitulando as desafetações

No fim do ano passado, uma manobra da oposição fez com que o Governo Municipal tivesse uma derrota ao pautar projetos de desafetação na Câmara. Na ocasião, uma proposição que buscava desafetar terrenos públicos localizados nos bairros Castelão e Boa Vista foi rejeitada com 17 votos contrários contra apenas 10 favoráveis. Dois vereadores, ambos aliados a Sarto, se abstiveram. Dos 43 vereadores, 14 não votaram na proposta.

Com o revés na votação, outras propostas que tratavam sobre desafetação de terrenos foram retiradas de pauta. Ouvido pela reportagem um dia depois do ocorrido, Iraguassú reconheceu a derrota e disse que nenhum projeto tratando sobre o tema seria colocado em discussão em 2023. “Vamos debater melhor ano que vem, aprofundaremos o tema e entender melhor”, disse.

No início deste ano, quando foi novamente provocado a falar da pauta, ele revelou que o maior objetivo do grupo era que as mensagens do Executivo fossem menos polêmicas em 2024 e, para tanto, questões como as desafetações dos terrenos, apesar de serem objeto de debate técnico e de conversas entre a liderança e as pastas responsáveis, deveriam ficar fora de apreciação. “A princípio não serão pautadas”, demonstrou.

A Coordenação de Comunicação da Câmara Municipal de Fortaleza foi contatada para a instância poder se manifestar quanto a tramitação dos pedidos de CPI, incluindo o mais recente, de autoria da oposição. Não houve uma resposta até a publicação desta matéria. O conteúdo será atualizado caso haja uma devolutiva.

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