Montado no pavão misterioso, mestre Simas espalha seus cordéis
O Brasil que eu quero é o do mestre Luiz Antonio Simas — este carioca, filho e neto de nordestinos — e do artista Jô Oliveira, pernambucano que corre mundo, indo e voltando.
Simas está na praça com um novo lançamento, “7 Cordéis Brasileiros” (ed. Oficina Raquel), livro ilustrado pelo Jô. É um rebuliço em toda a feira. Pense em uma notícia extraordinária. Deixo aqui uma resenha para guiar os futuros leitores e leitoras da obra.
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Vou fazer a louvação, louvação, do que deve ser louvado. É o que bem merece — Gilberto Gil sabe disso! — o mestre Luiz Antonio Simas e os saberes que compartilha na praça.
Na crônica futeboleira, na mesa redonda ou na aula pública, Simas semeia e devolve, como um camisa 10 das antigas, a bola do conhecimento que recebeu da maloca.
O professor devolve e pega na frente. Na tabelinha permanente que leva ao gol e à festa.
Nessa fartura imodesta, exalto agora Jô Oliveira: Pernambuco falando para o mundo — com o sotaque cosmopolita de todas as lendas. Da pedra que canta de uma certa ilha, Jô pinta e borda as brasilidades.
Repare como o homem ilustra, na rotação de uma ciranda, refazendo os Nordestes na pena das invenções. Coisa de quem domina os mapas, além dos mistérios universais. Jô Oliveira no rastro de Simas é o Brasil de sonhos e almanaques.
São dois Brasis que se completam no azougue da peleja. Como dois violeiros em busca da rima perfeita, o santo graal das melhores possibilidades artísticas. O luxo de tê-los juntos, leitores, é precisão e requinte. Desfrute.
Simas tem o faro da folia, nos cinco sentidos de vidente, nariz que antecipa no vento — sente só o aroma da esquina! — o sabor das oferendas. Prossiga.
Nas espumas flutuantes ou nos mares de cevada, o professor molha a sua verve, afina a sintaxe, sintoniza o batuque, ajeita a gramática. Vamos nessa.
Louvados sejam Nosso Jesus Cristinho, os pretos velhos e os santos cervejeiros. Louvados sejam vós do timaço da santa ceia das biroscas.
Com a graça de Seu Sete de Lira e a bênção de Zé Limeira, um Simas carioca, um Simas paraíba, um Simas brasileiríssimo pendura agora seus cordéis na feira dos melhores botequins.
Um fuzarqueiro exu, repare só, pega o professor pelo braço, em pleno forró, e o guia na fresta do repente. O cheiro do jabá que vem lá de São Cristóvão abre os nossos apetites.
Sem negacionismos, Simas rima — na responsa da saúde pública — o republicanismo de Zé Gotinha.
Com uma espada de São Jorge, o professor risca céus, e pede passagem para uma das estrofes mais brilhantes das galáxias de Gutenberg:
“E como se não bastasse
A festa do santo de rinha
Nesse dia também nasce
Outro santo: Pixinguinha
Que além de padroeiro
Do choro, era suburbano
Macumbeiro, bachiano
Carioca e cervejeiro”.
Montado em um pavão misterioso, Simas sobrevoa os dozes pares de França, Oropa e Bahia... A aterrissagem, senhoras e senhores, se dará em Angicos, sob a licença de Paulo Freire, que o recebe para a boniteza infinita. Repare na experiência em terras potiguares, leitores & leitoras: o professor dos professores decifra o sentido das coisas, tijolo por tijolo, em um mutirão pedagógico. Eva nunca mais viu só a uva, Eva ficou sabida, Eva trocou de cartilha.
E viva a Oficina Raquel, bravíssima editora do Brasil, que traz para essa feira os cordéis mais tremulantes da paróquia. Tem até as desventuras da fraqueza napoleônica. Com peixeira de baiano não se brinca, ô coisado, vade retro miserável das costas-ocas.
Luiz Antonio Simas & Jô Oliveira. Não tem louvação que dê conta! Admiráveis brasileiros que este cronista ostenta.
Brava gente, à leitura. E seu garçom faz o favor, de nos trazer mais uma, com a benção dos santos cervejeiros, saravá, meus guias. Ô Deus salve os engradados, os oratórios de boteco, nos altares mais ecumênicos. Sem esquecer a marvada, a benzida, a abridora dos caminhos no meu país de São Saruê.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.