TJA 110 anos - Crônica sobre abraços, esperas e sonhos
Primeiro texto da série em comemoração aos 110 anos do Theatro José de Alencar traz as memórias da atriz e produtora Gabi Gomes, do Cangaias Coletivo Teatral
Nesses tempos de isolamento, o que me causa mais nostalgia são os aniversários dos amigos, pela impossibilidade do abraço aconchegante com desejos para uma vida melhor. Ah, o abraço! Me pego, aqui, muitas vezes, revendo antigas fotografias, de momentos festivos ou mesmo resgatando na memória tais momentos, e a sensação é bem parecida com a do abraço.
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Dentre as muitas fotos que revisitei, fui transportada para 2012: a primeira vez que pisei em um palco de teatro, sem ser para cumprimentar os artistas. Estava estreando uma peça, como conclusão de uma formação chamada Curso Princípios Básicos de Teatro (CPBT), que acontece no Theatro José de Alencar anualmente.
Era esse o lugar que eu queria chegar. O teatro. A primeira vez que eu pisei no TJA foi ainda criança para ver uma montagem de O Corcunda de Notre-Dame, não lembro de qual grupo. Minha prima mais velha era namorada do iluminador, então, por sorte ou amor ou os dois, ganhamos cortesias. Só assim para viver essa experiência que, na época, estava fora do orçamento.
É difícil descrever em palavras o que significou aquele dia, mas certamente dizer que “foi mágico” ajuda bastante. As cortinas, o tapete vermelho, o teto, todos aqueles andares com, aos meus olhos, infinitas cadeiras. Era tudo tão grandioso para um ser tão pequenino que nem eu, ali, tão criança. Ali, tão encantada.
Mas voltemos ao dia em que era eu, no palco, estreando para um público diverso, desconhecido, e no final, juntamente com os meus colegas, recebendo os aplausos e também os abraços que nem os que eu havia dado não fazia tanto tempo. A apresentação foi no Palco Principal, que honra! E que frio na barriga! O Theatro José de Alencar marca o início da minha trajetória artística. Um início apaixonado, com olhos brilhando, sem saber muito bem onde tudo ia dar.
E foram tantos dias comendo bolo de macaxeira com suco de caju na cantina do Muriçoca, tantas visitas guiadas sob os cuidados de Patrícia Dawson, tantas conversas ao chegar mais cedo na aula para poder ensaiar ou apenas trocar risos e afetos com os novos amigos, tantos figurinos provados no acervo e tantos mundos inventados. Ganhei uma casa. Minha avó brincava que era a minha casa número um, pois em casa mesmo eu chegava já na hora de dormir. Foi assim durante praticamente dois anos, entre residências artísticas, cursos, oficinas, ensaios e espetáculos que me marcam até hoje.
Olha, que curioso! A última vez que fui ao Theatro, antes da pandemia, não foi para me apresentar nem assistir a um espetáculo. Foi para carnavalizar. Um sábado de fevereiro no “Baile à fantasia do Zé de Alencar”. Admirei cada espaço, cada luz, cada fantasia. Dei muitos abraços. Festejei. Talvez estivesse festejando não só o carnaval.
Agora minhas palavras são diretamente para você, Zé! 110 anos! Deve ser a idade da sabedoria. Nesse seu aniversário eu não vou poder dar aquele abraço com desejos para uma vida melhor. Mas que bom que a sua história cruzou com a minha! Quantos sentimentos partilhados nos teus corredores! Quantos sorrisos, medo de pisar a primeira vez no palco, a emoção de realizar um sonho. Algumas frustrações, também. Acontece. Mas, ei! Vamos combinar de conversar sempre? Espero que cuidem muito bem de você! Dos seus arredores! Dos seus palcos e jardins! De cada canto. Nós, artistas, te amamos! Pode ter certeza que juntos seremos e faremos melhor! Espero que nos vejamos em breve. Dizem que a espera intensifica o momento do encontro. Que assim seja. Estou guardando aquele abraço e muito aconchego. Para você.
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