Nos 30 anos sem Gonzaguinha, um legado musical celebrado por gerações

Cantor e compositor carioca, falecido em 29 de abril de 1991, segue como um dos expoentes da Música Popular Brasileira

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: Filho do Rei do Baião, Gonzaguinha se notabilizou pela postura sempre crítica e um estimado cancioneiro
Foto: Divulgação

O amor e a contestação andaram de mãos dadas na trajetória de Gonzaguinha (1945-1991). A música os consagrou, no mesmo compasso em que revelou ao mundo a face indistinta do rebento do Rei do Baião. O rosto estreito, com espesso bigode e cabelos, parecia já ali, no desenho da fronte, vibrar que a vida é bonita e mais sábio é quem fica com a pureza da resposta das crianças.

Não se trata de resumir a carreira do artista somente ao sucesso de “O que é, o que é” – composição aclamada em todo o território nacional e fora dele. Porém, esta é uma das canções que irrompem no decurso de um tempo e seguem percorrendo outras épocas, alcançando gerações e gerações. 

Neste 29 de abril – quando se completa exatos 30 anos do acidente automobilístico, na cidade de Marmeleiro, no Paraná, que abreviou a vida do músico carioca – talvez sejam os versos da famosa melodia que ecoem por entre rádios e lares, memórias e acontecimentos. 

Legenda: Aos 14 anos, o artista compôs sua primeira música, “Lembrança de primavera”, abrindo o horizonte profissional na seara
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Um levantamento feito pelo banco de dados do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), um dos maiores da América Latina, se debruçou sobre as obras musicais de Gonzaguinha e comprovou a pluralidade do artista. O estudo levou em conta as músicas dele mais gravadas e tocadas e os intérpretes que mais reproduziram suas canções.

No total, 294 canções e 348 gravações foram cadastradas no Ecad, sendo “O que é? O que é?” a música de autoria do compositor mais tocada nos últimos cinco anos e a mais gravada por outros intérpretes. Maria Bethânia, por sinal, lidera esse ranking entre os nomes responsáveis por sempre aquecer uma obra imortal.

Talento reverenciado

Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior nasceu em 22 de setembro de 1945, no Rio de Janeiro. Filho do cantor, compositor e sanfoneiro Luiz Gonzaga (1912-1989) e da cantora, compositora e dançarina Odaléia Guedes dos Santos (1925-1948), aos dois anos perdeu a mãe, vítima de tuberculose. O pai se casa novamente, mas a esposa rejeita o menino, que passou a ser criado pelos padrinhos de batismo, Leopoldina de Castro Xavier e Henrique Xavier Pinheiro (de apelido Baiano do Violão), com quem aprende a tocar o instrumento.

A infância é vivida no Morro de São Carlos, no bairro do Estácio, Rio de Janeiro. Durante a adolescência, Gonzaguinha frequentou colégios internos devido à preocupação de Gonzaga com os constantes atos de indisciplina do filho, o que só faz aumentar os conflitos entre eles. 

Legenda: Gonzaguinha e Luiz Gonzaga dividem o palco numa apresentação
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Aos 14 anos, o músico contraiu tuberculose pela primeira vez, doença que o afligiu outras vezes durante a vida. Com a mesma idade, compôs sua primeira música, “Lembrança de primavera”. A partir dali, viu o horizonte musical se abrir. Paralelamente aos estudos, estreou na carreira artística em 1968, participando do Festival Universitário de Música Popular, da TV Tupi, vencendo no ano seguinte com a canção “O trem”.

Filiando-se depois a alguns grupos musicais, em 1973 lançou “Luiz Gonzaga Jr.”, o primeiro dos 16 álbuns da carreira discográfica. Por sua vez, em 1980, se aproxima de Luiz Gonzaga e percorre o Brasil, com ele, a partir da turnê “A vida do viajante”. 

Anos depois, esse trabalho de itinerância daria origem a um disco da dupla. Em 2012, a história dos artistas ganhou adaptação cinematográfica do diretor Breno Silveira, no filme “Gonzaga – De pai para filho”.

De acordo com o Ecad, nos últimos cinco anos a maior parte dos rendimentos do cantor em direitos autorais pela execução pública de músicas foi proveniente dos segmentos de Rádio, Show e TVs, que correspondem a mais de 75% do que foi destinado a ele.

Os herdeiros continuam recebendo os direitos autorais por esse processo de reprodução musical. O pagamento é assegurado por 70 anos após a morte do autor – ou do último autor, em caso de parcerias – conforme determina a lei do direito autoral (9.610/98).

Diversidade

Também conforme dados do Ecad, além de  “O que é, o que é”, músicas como “Lindo Lago do Amor”, Sangrando”, “É” e “Começaria tudo outra vez” ocupam as primeiras posições no ranking de canções de Gonzaguinha mais tocadas nos últimos cinco anos nos principais segmentos de execução pública.

Informações presentes no portal do Itaú Cultural atestam que a obra do carioca alia canções contestatórias, de teor político-social, com um repertório de apelo romântico, o que o fez um sucesso de massa. A produção dele no início da carreira, contudo, se destaca pelo caráter anti comercial. Por essa característica e pela fisionomia sisuda, ganhou o apelido de “cantor rancor”.  

Legenda: A obra do carioca alia canções contestatórias, de teor político-social, com um repertório de apelo romântico
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Visado pela censura durante a ditadura militar brasileira, Gonzaguinha buscou despistar a fiscalização usando artifícios poéticos, como o duplo sentido. Embora parte representativa de sua produção esteja ancorada no samba, ele também enveredou por outros gêneros, a exemplo da valsa, rock, disco music e os ritmos nordestinos. Porém, são mesmo os boleros e as canções românticas que se destacam em seu repertório.

De forma gradual, sua obra igualmente acompanhou a abertura do cenário político. Ainda abraçando uma postura crítica, o compositor tornou-se mais otimista, resfolegando em êxtase em “E vamos à luta”, e dando lugar à esperança e à alegria definitiva em  “O que é, o que é”.

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