José Eduardo Agualusa participa do projeto Lives do Conhecimento sobre jornalismo e literatura

Jornalista e escritor angolano é presença confirmada, nesta quarta-feira (1), às 15h, em mais uma edição do projeto, uma iniciativa da Universidade de Fortaleza

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: José Eduardo Agualusa é um dos nomes mais importantes da literatura em língua portuguesa na contemporaneidade
Foto: Divulgação

Apesar de compartilharem a mesma matéria-prima de trabalho – a palavra –  o jornalismo e a literatura são dois campos bastante distintos. Enquanto o primeiro trata de narrar a realidade por meio de fatos, o segundo se apropria do real para construir ficção. O enlace entre os dois é o que se chama de Jornalismo Literário, cujo objetivo não foge à tarefa de informar, mantendo, portanto, a essência jornalística, contudo valendo-se de uma estrutura diferenciada das habituais reportagens, aprofundando cenários, perspectivas e personagens, além de contar com um vocabulário igualmente particular, próprio da literatura.

Permeada por aproximações e fronteiras, a relação tão próxima entre esses ramos atravessa diversos momentos históricos, como na época dos folhetins – publicados, de maneira seriada, em periódicos do século XIX. Foi por meio deles que incontornáveis obras da literatura brasileira vieram a público, a exemplo de “A Moreninha”, de Joaquim Manuel de Macedo, “Quincas Borba”, de Machado de Assis, e “O Guarani”, do cearense José de Alencar, entre outros. Também a própria existência da crônica – gênero comum às duas linguagens – nos jornais até hoje atesta a íntima sintonia entre eles.

“A literatura começa onde o jornalismo termina. Ou seja: o jornalismo apresenta os fatos; a literatura tem liberdade para ir além – eventualmente, deve mesmo ir além, construindo personagens, enredos e cenários imaginários. O jornalismo literário é uma disciplina quer da literatura, quer do jornalismo. Embora obrigado a cingir-se aos fatos, o jornalista literário tem liberdade para utilizar técnicas próprias da literatura”, explica José Eduardo Agualusa, jornalista e escritor angolano, uma das vozes mais importantes da criação em língua portuguesa na contemporaneidade.

Ele participará da próxima edição do projeto Lives do Conhecimento, realizado pela Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, nesta quarta-feira (1), a partir das 15h, com transmissão pelas redes sociais da instituição (facebook, instagram, youtube e TV Unifor, canal 181 da NET).

O tema será “O intermitente diálogo entre o jornalismo e a literatura” e contará com a mediação da professora e escritora Aíla Sampaio, do curso de Cinema e Audiovisual. Para garantir a participação, é necessário fazer inscrição prévia no site unifor.br.

Legenda: O autor angolano considera que o Brasil possui uma tradição de grandes cronistas e biógrafos
Foto: Divulgação

A presença do angolano nessa atividade da Universidade de Fortaleza soma-se a outras de grande envergadura nos contextos em que atuam, como é o caso da física Márcia Barbosa (na transmissão do dia 3 de junho); de João Candido Portinari (9/6),  filho de um dos maiores artistas do País; do professor, historiador e escritor Leandro Karnal (26/5), entre outros.

Ressonâncias

Agualusa, que esteve em Fortaleza no ano passado durante a Bienal Internacional do Livro do Ceará – na qual, entre outras atividades, participou da mesa “Viajantes: Lugares do mundo”, com Tércia Montenegro e mediação de Cleudene Aragão – considera que o Brasil possui uma tradição de grandes cronistas, começando, segundo ele, em Nelson Rodrigues e terminando em Luís Fernando Veríssimo.

“Tem também um grupo importante de grandes biógrafos. Entre os meus preferidos, estão Ruy Castro, Fernando Morais, Humberto Werneck, Vagner Fernandes e Lira Neto”, enumera.

O autor de “O vendedor de passados”, “A sociedade dos sonhadores involuntários”, entre outros premiados livros, comenta ainda que, nas reportagens sob sua assinatura – atualmente escreve para o jornal português Público, o brasileiro O Globo e o portal Rede Angola – faz um esforço para utilizar alguns recursos literários, sem comprometer a verdade factual.

“Uma boa reportagem, como uma boa ficção, tem de conseguir envolver o leitor, levando-o a colocar-se na pele das diferentes personagens”, diz.

Mesmo estabelecendo esse paralelismo, o escritor reforça que há fronteiras entre jornalismo e literatura. Ao refletir, por exemplo, sobre uma boa biografia, acredita que deve ter qualidade literária, mas está iminentemente comprometida com os fatos conhecidos, ou seja, algum tipo de verdade histórica. A ficção, não.

Nesse sentido, recomenda alguns livros que julga serem relevantes para quem deseja se aprofundar nessas questões por vezes tão complexas. “Gosto muito da reportagem que Gabriel García Márquez escreveu sobre Angola, ‘Operação Carlota’. Sou também um grande admirador da obra do jornalista polonês Ridzard Kapuscinsky, em particular de um dos seus primeiros livros, ‘Mais um dia de vida’, sobre Angola às vésperas da independência. Parece-me, contudo, que por vezes Kapuscinsky é mais escritor que jornalista. Também gosto muito do grande clássico da literatura de viagens, “Na Patagónia”, do Bruce Chatwin. É um dos livros da minha vida”.

Legenda: Para Agualusa, a literatura começa onde o jornalismo termina
Foto: Divulgação

Aprendizados

Numa reflexão própria, a obra “Na rota das especiarias – Diário de uma viagem a Flores, Bali, Java e Timor Lorosae” (Dom Quixote, 2008) é considerada por Agualusa como aquela de sua autoria que mais se insere no universo de comunicação entre literatura e jornalismo. A narrativa parte de uma viagem que o escritor fez, entre 8 e 29 de abril de 2001, a convite da Dra. Helena Vaz da Silva, presidente da direção do Centro Nacional de Cultura. 

Intitulada “Percursos em busca da presença portuguesa pelo mundo”, a jornada teve como missão recuperar elos com o povo indonésio, com quem os portugueses mantiveram relações comerciais entre 1512 e 1769, além de realizar prospecções que abrissem caminho para cooperações nas áreas social, cultural e econômica.

Embora com essa e tantas outras experiência no ramo, o angolano, a julgar pelos eventos em que é convidado a falar, não costuma tratar da relação entre jornalismo e literatura e nem sobre jornalismo literário. Assim, a oportunidade de participar do projeto “Lives do Conhecimento” desenvolvendo essa temática é vista por ele como um farto momento de troca de saberes. “Creio que irei aprender bastante”.

Para além das questões relacionadas à atividade, o novo livro de Agualusa, “Os Vivos e os Outros”, chega ao Brasil em outubro, com grande desejo do escritor de lançá-lo presencialmente. O romance, finalizado no ano passado na Ilha de Moçambique, versa sobre um fim de mundo, mas também sobre o recomeço dele. 

Sob outro panorama, o autor também comenta a respeito de como está vivenciando a pandemia do novo coronavírus. Desde março, ele se encontra em Lisboa (POR), onde possui um apartamento. Chegou após participar de um festival literário em Marrocos, e diz que está sempre lendo e escrevendo. 

Quanto à ideia de como ficará o panorama mundial pós-pandemia, é enfático:

“Não creio que o mundo vá mudar muito devido à atual pandemia. Talvez passemos a recorrer mais ao teletrabalho e a aproveitar melhor as potencialidades das redes sociais e da realização de eventos virtuais”.


Serviço
Projeto Lives do Conhecimento, com José Eduardo Agualusa e Aíla Sampaio
Nesta quarta-feira (1), às 15h, por meio dos canais de transmissão da Universidade de Fortaleza (facebook, instagram, youtube e TV Unifor, canal 181 da NET). Inscrições pelo site unifor.br

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