Comissão do Senado aprova indicados à diretoria da Ancine; dois respondem a processo por improbidade

Alex Braga Muniz e Vinicius Clay Araújo foram indicados pelo Planalto para compor os cargos na Agência Nacional de Cinema

Escrito por Diego Barbosa* , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: Criada em 2001, a Ancine fomenta, regula e fiscaliza a produção de cinema e de audiovisual do País
Foto: Divulgação

Em sessão realizada nesta terça-feira (6), a Comissão de Educação, Esporte e Cultura do Senado aprovou os nomes de Tiago Mafra dos Santos, Vinicius Clay Araújo Gomes e Alex Braga Muniz para a diretoria da Agência Nacional de Cinema (Ancine). Estes dois últimos, conforme reportagem do jornal Folha de São Paulo, respondem a processo por improbidade administrativa. Ambos foram indicados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para assumir a instituição.

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O plenário do Senado deve avaliar os nomes ainda nesta quinta-feira (8). Alex e Vinicius foram aprovados para os cargos de diretor-presidente e diretor da Agência, respectivamente. Em ação ingressada no fim do ano passado, o Ministério Público Federal acusou Braga, Araújo e mais dois servidores da Ancine de omissão no andamento e conclusão de processos administrativos de 782 projetos audiovisuais.

As iniciativas eram financiadas com recursos do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual), referentes aos editais de 2016, 2017 e 2018. Conforme a Procuradoria da República no Rio de Janeiro, "os demandados conscientemente ordenaram a seus subordinados que não dessem andamento a processos de projetos audiovisuais, omitiram dados que comprovam a paralisia do serviço e, ainda, recusam-se a comprometer-se com prazos ou medidas efetivas para solucionar o passivo de 782 projetos pendentes de análise".

Questionado sobre o processo durante a sabatina nesta terça, Braga afirmou que a Ancine tem adotado medidas para analisar os passivos e fazendo o possível para resolver o problema. Segundo ele, atualmente estão pendentes 208 projetos. "A lei de ação de improbidade tem um procedimento preparatório, ela não se torna uma ação antes que o juiz análise a defesa técnica. Nós apresentamos as defesas técnicas pedindo a absolvição", disse.

"Não estamos sendo acusados de lesar o erário nem de enriquecimento ilícito. São acusações até com certo grau de subjetividade", declarou aos senadores.
Alex Braga Muniz
Indicado à diretoria da Ancine

"Rombo" financeiro

Apoiada por outros senadores, a senadora Leila Barros (PSB-DF) cobrou detalhes a Alex Braga Muniz sobre a situação de “rombo” financeiro, resultante de editais de 2018, e “represamento” de recursos nos exercícios financeiros seguintes. De acordo com ela, estes deveriam ter sido aplicados para honrar compromissos assumidos anteriormente pela Agência. "Qual a interesse ou a vantagem de se manter o alto valor parado na conta?", questionou a senadora.

Muniz atribuiu os problemas ao processo cumulativo de anúncio de editais que eram lançados à conta de recursos orçamentários, impondo compromissos financeiros além dos disponíveis, o que levou a situação de “descompasso, desencontro de contas”. "Não era feita uma análise de capacidade operacional para lançamento dos editais, quiçá de disponibilidade financeira", explicou.

"Se eu vou anunciar um edital que objetiva selecionar 100 projetos, dois requisitos mínimos devem existir: eu devo ter capacidade de analisar os 100 projetos e eu tenho que ter recursos para financiar os 100 projetos, sob pena de frustrar expectativas e prestar um desserviço a uma atividade tão relevante. E isso era praticado rotineiramente e reiteradamente na Ancine", complementou.

Regularização da situação

Na mesma ocasião, Vinicius Clay Araújo também afirmou que "não houve improbidade" e que os atos praticados para regularizar a situação "foram, inclusive, considerados adequados e eficientes até aqui pelos órgãos de controle". Ele se referia a uma decisão recente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), no Rio de Janeiro, que suspendeu uma decisão liminar (provisória) contra a agência que pedia a finalização de projetos.

Nenhum dos dois apresentou declaração com a existência de ações judiciais nas quais são autores ou réus, conforme prevê o regimento interno do Senado. Eles argumentam que não são réus porque o Judiciário ainda não aceitou a denúncia do MPF. O senador Carlos Portinho (PL-RJ), que relatou a indicação de Braga, afirmou em seu parecer que "o indicado não é, no sentido legal, réu na ação, onde não houve até o presente momento o recebimento da denúncia e citação".

Segundo o TRF-2, porém, "por não se tratar de processo penal, mas sim civil, não há inquérito nem recebimento de denúncia prévios ao início da ação". "Sendo assim, eles se tornaram réus no momento da distribuição da ação".

Para além disso, Araújo, durante a sabatina, defendeu a preservação da política setorial da Ancine, lembrando que, no Brasil, em 2018, o valor adicionado pelo setor audiovisual à economia brasileira foi de R$ 26,7 bilhões – maior que a de indústrias como a farmacêutica, a têxtil e a de componentes eletrônicos.

O indicado também cobrou maior regionalização das produções brasileiras e espera a inauguração de mais salas de cinema, especialmente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, nas cidades do interior e comunidades carentes, dentro do desafio de tornar o produto mais acessível.

"As salas de cinema ainda representam considerável fonte de receita para as produções audiovisuais, além de constituírem espaço relevante para a cultura, o entretenimento e a socialização", sublinhou.
Vinicius Clay Araújo Gomes
Indicado à diretoria da Ancine

Histórico

Graduado em Direito, Alex Braga Muniz entrou na Advocacia-Geral da União (AGU) em 2002 e, no ano seguinte, foi designado para a procuradoria da Ancine. De 2009 a 2017, como procurador-chefe, ele respondeu pelos atos jurídicos da agência. Em 2019, assumiu o cargo de presidente da Ancine interinamente após o afastamento de Christian de Castro.

Vinicius Clay Araújo Gomes, por sua vez, é servidor na Ancine desde 2006, onde ocupou funções como a de coordenador de Desenvolvimento de Mercado e secretário de Políticas de Financiamento. Desde fevereiro de 2020, ocupa o cargo de diretor-substituto.

O outro nome aprovado pela comissão do Senado, Tiago Mafra dos Santos, foi indicado para o cargo de diretor da Ancine. Desde 2006, ele ocupa o posto de especialista em regulação da Atividade Cinematográfica e Audiovisual na agência. 

Durante a sessão realizada pela Comissão do Senado, respondeu a questionamento sobre a regulação do serviço de VOD (Video on demand), um setor de mercado que “vai passar, inclusive, a própria TV paga”, disse.

Tiago defendeu o papel da agência reguladora de “regular por informação”, mas, citando análise na Secretaria de Políticas Regulatórias da Ancine, entendeu que a imposição de cotas para conteúdo nacional é inadequada par um segmento que funciona por catálogo. 

"Na verdade, o que isso vai fazer é a redução: você vai provocar a redução de catálogos e aumento na assinatura. Eu acho que uma preocupação anterior não é pensar essencialmente na garantia do conteúdo brasileiro nessas plataformas, mas o acesso, a ampliação do acesso a elas, lembrando que são tecnologias de fruição de audiovisual via internet".
Tiago Mafra dos Santos
Indicado à diretoria da Ancine

A Ancine é uma agência reguladora e foi criada em 2001. Entre as atribuições da órgão estão o fomento, a regulação e a fiscalização do cinema e do audiovisual do País. A agência tem status de autarquia especial e hoje é vinculada do Ministério do Turismo.

Cinemateca Brasileira

Outra instituição dedicada ao Cinema e ao Audiovisual brasileiro que está sendo foco de constantes debates é a Cinemateca Brasileira. Conforme reportagem do Diário do Nordeste publicada no último dia 7 de junho, o lugar está de portas fechadas para o público há mais de um ano e vem sendo gerido diretamente pelo Governo Federal desde julho de 2020. Antes, era a Associação Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), uma Organização Social (OS), que estava tomando conta do acervo de 250 mil rolos de filmes.

Mediante encerramento do contrato em 31 de dezembro de 2019, a OS ainda manteve pelos sete meses seguintes uma equipe técnica improvisada, sem recursos e salários, a fim de não abandonar o equipamento. Na época, funcionários e entidades realizaram diversos protestos afirmando que a instituição passava pela maior crise desde a sua fundação, em 1946. 

Ao assumir a Secretaria Especial da Cultura do Governo Federal, Mário Frias assumiu as chaves do equipamento com a Acerp, mas pouca coisa teria mudado desde então, segundo funcionários que preferiram manter o anonimato.

No último dia 12 de maio de 2021, o Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP), que ainda em julho passado havia entrado com uma ação contra a União por abandono da Cinemateca, concedeu 45 dias para a pasta comprovar as ações implementadas pela preservação do patrimônio.

 

*Com informações da Folhapress e da Agência Senado

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