Um século de história nos separa da Semana de Arte Moderna. O evento, porém, segue despertando múltiplas reflexões e curiosidades – sobretudo a partir do que foi apresentado no Teatro Municipal de São Paulo durante aqueles três dias. As Artes Plásticas, nesse sentido, ocupam lugar de destaque, entregando algumas das mais icônicas criações em solo nacional.
Mas onde estão localizados os quadros mais famosos do modernismo? É possível ter fácil acesso a eles? A curadora de arte Regina Teixeira nos auxilia nessa jornada, citando obras presentes inclusive em Fortaleza. Segundo ela, a Semana de 22 apresentou ao público cerca de 100 trabalhos contemplando as Artes Visuais, cujo maior legado é a experimentação.
“Essa abertura para o novo, para aquilo que não é consagrado, de uma pesquisa estética, eram princípios que os integrantes da Semana pregavam. Eles fizeram esse trabalho não só nas artes visuais, mas também na música, na literatura, com a mesma vontade de renovação – algo que, hoje, tem continuidade de diversas maneiras”, aponta.
Regina é curadora da próxima exposição a entrar em cartaz no Espaço Cultural Unifor, equipamento da Universidade de Fortaleza. A mostra tem abertura prevista em 22 de março com o objetivo de demonstrar o impacto do movimento modernista na identidade brasileira. As peças em exibição serão de colecionadores particulares e públicos, com possibilidade de apreciação até dezembro deste ano.
“A exposição, de fato, é comemorativa da Semana de 22, mas também uma reflexão crítica – no sentido de entender que esse evento faz parte de um processo. Que existem coisas modernas que antecederam a Semana”, sublinha a curadora. Ela também é bastante clara: apesar de não haver na mostra obras que estiveram presentes na centenária ação, a maioria dos artistas consagrados do projeto estarão lá.
Abaixo, confira quais são e onde estão as mais representativas pinturas da Semana de Arte Moderna de 1922:
“Abaporu”, de Tarsila do Amaral
Comecemos por um dos principais símbolos do movimento modernista, a peça de arte brasileira mais cara do mundo. Curiosamente, o quadro “Abaporu”, de Tarsila do Amaral (1886-1973), não está no país de origem. Quem quiser ver o trabalho de pertinho precisa se dirigir ao Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires (Malba), na Argentina.
Hoje orçada em US$40 milhões, a peça foi comprada no ano de 1995 pelo empresário argentino Eduardo Constantino. À época, valeu US$1,3 milhão. Apesar da cifra, Constantino afirma que o quadro não está à venda e que o valor dele é imensurável.
Não à toa, o trabalho foi doado para o Malba, equipamento com uma das maiores coleções de arte brasileira e da América Latina. Entre os brasileiros no catálogo do museu portenho estão Hélio Oiticica, Candido Portinari, Lygia Clark, Di Cavalcanti e Augusto de Campos.
“A Estudante”, de Anita Malfatti
Já para conferir o quadro “A Estudante”, de Anita Malfatti (1889-1964) – também exposto durante a Semana de 22 – o itinerário é um pouco mais curto. A obra compõe o acervo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp).
No trabalho, Anita faz uso de deformação moderada, procurando fugir de modelos clássicos. A técnica, que contava com tintas diluídas aplicadas à tela, causou grande alvoroço na elite provinciana paulista, incluindo até mesmo o escritor Monteiro Lobato (1882-1948). A pintura foi feita nos Estados Unidos.
“A Mulher de Cabelos Verdes” e “O Rochedo”, de Anita Malfatti
Dobradinha de Anita Malfatti porque estas duas obras da pintora estão presentes em Fortaleza. “A Mulher de Cabelos Verdes” pertence à coleção do chanceler Airton Queiroz (1946-2017) e está presente no Espaço Cultural Unifor.
“O Rochedo” também entrará em exposição no mesmo equipamento. A peça, de 1915, foi elaborada em um dos períodos de maior produção artística de Anita Malfatti, quando residia nos Estados Unidos. Lá, a pintora se isolou numa ilha de pescadores na Costa do Maine chamada Monhegan Island – nome que serve de subtítulo à obra.
“Retrato de Ronald de Carvalho”, de Vicente do Rego Monteiro
Pernambucano, Vicente do Rego Monteiro (1899-1970) expôs no Teatro Municipal de São Paulo o quadro “Retrato de Ronald de Carvalho”. Atualmente, a tela pode ser visitada no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro. Além dela, Vicente exibiu outros sete trabalhos na Semana de Arte Moderna.
Na própria produção pictórica, Rego Monteiro mostra-se sintonizado com um estilo bastante específico do modernismo, o Art Déco, por meio do uso de curvas que buscam uma elegante regularidade geométrica.
Com isso – inspirado pela cerâmica marajoara e pela cultura indígena – o artista promove uma refinada e original estilização da temática indigenista brasileira, conferindo às telas densidade e volume. Ao romper com o caráter plano da pintura, aproxima-a da escultura.
“Amigos (boêmios)”, de Di Cavalcanti
Atualmente no acervo da Pinacoteca de São Paulo, “Amigos (boêmios)” foi criado em 1921 por Di Cavalcanti (1897-1976). O pintor carioca se destacou nas Artes Plásticas por retratar aspectos populares da cultura brasileira, a exemplo das favelas, do samba e do carnaval.
Desde 1916, Cavalcanti já publicava charges políticas para a revista Fon-Fon. No mesmo ano, expôs no Salão dos Humoristas uma série de ilustrações sobre a Balada do Cárcere de Reading, de Oscar Wilde (1854-1900).
Em 1917, começou a pintar sob a influência do estilo Art Nouveau. Neste mesmo ano, fez a primeira individual para a revista “A Cigarra”. Em 1922, foi presença confirmada na Semana de Arte Moderna.
“Retrato do Desembargador Gabriel Gonçalves Gomide”, de John Graz
Graz (1891-1980) participou da Semana de 22 por conta da amizade com Oswald de Andrade, expondo sete obras. Também foi um dos sócios-fundadores da Sociedade Pró-Arte Moderna (SPAM), em 1932.
Entre as obras escolhidas para fazer parte da exposição, estava a tela “Retrato do Desembargador Gabriel Gonçalves Gomide”, de 1917. O quadro integra o acervo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp).
John também exibiu a “Paisagem da Espanha”, pintada em 1920. A obra está em exibição na Pinacoteca do Estado de São Paulo.