No começo, ainda na infância, em alguns casos, as pequenas artesãs sequer tinham dinheiro para garantir os instrumentos de produção do crochê. Faltava verba até para a agulha. Ainda assim, a tradição observada em casa e passada de mãe para filha seguia. Depois, apesar do domínio do ofício, a única possibilidade era a venda avulsa e informal na praia.
Com o tempo, veio a necessidade de formalização da atividade. Juntar-se a outras mulheres. Nasceu, em 2008, a Associação das Crocheteiras de Jericoacoara, no Ceará, e tem dado frutos. Mas as exigências continuam e expandir o trabalho, além de necessário, é caminho sem volta. Ao profissionalizar as tarefas, a nova geração tem aprimorado a tradição e atualizado as perspectivas de negócios. Os crochês de Jeri seguem ganhando adesão.
Do fazer que garantia majoritariamente colchas de cama e saídas de banho ao aperfeiçoamento da técnica que hoje resulta em colares, biquínis, bolsas, peças de decoração e jogos americanos, dentre outros. No início, somavam cerca de 40 mulheres. A praia era o posto de trabalho. Geralmente, divididas em duplas, ocupavam a frente de pousadas e hotéis. Com o passar do tempo, veio uma das primeiras oportunidades formais: o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) ofereceu oficinas de formação.
"Nós fomos vendo que juntas somos melhores e na capacitação fomos passando de uma pra outra a técnica e os acabamentos", explica Evilsa Marciano da Silva, crocheteira e primeira presidente da Associação. A variação de pontos também cresceu: ponto arroz, ponto alto, ponto abacaxi, meio ponto, assim como o conhecimento, detalha Evilsa, sobre empreendedorismo e designer.
Em 2010, as crocheteiras de Jericoacoara tiveram acesso a um espaço físico para abrigar e vender a produção. Devido a alguns dilemas, o local foi fechado e reativado em 2013. Hoje, a Associação, composta por 18 crocheteiras profissionais, segue na ativa e o empreendimento é ponto de exposição e venda na Rua Principal da Vila de Jericoacoara.
Lá, os produtos variam de R$ 10 a R$ 550. Se a loja física garante segurança, conforto e avanços, a arte das crocheteiras tem ganhado também visibilidade devido ao envolvimento das novas gerações. Uma das iniciativas é a venda online. Outra é a criação de perfis em redes sociais e aplicativos para divulgar a produção.
"O trabalho vai passando de mãe para filha. Quando a gente começou a montar, tivemos um pouco de dificuldade. Nem todas sabiam ler e escrever e começamos a botar as meninas que conseguiam mexer no computador e organizar conta no banco. Tínhamos a necessidade de colocar elas na parte administrativa e na divulgação", relata Maria Ferreira da Silva, atual presidente da Associação.
Jovens empreendedoras
As meninas apresentadas por Maria sãos as irmãs Jani da Silva, 25 anos, e Jeicy, 23 anos, que, desde pequenas, ganharam da mãe, Evilsa, os ensinamentos na arte da crocheteria. Quando adulta, vivenciando o fim do Ensino Médio e a entrada no mercado de trabalho, Jani percebeu que as opções de emprego como atendente ou recepcionista pouco lhe fariam feliz na localidade.
Anos depois, resgatou o conhecimento com o intuito de manter uma tradição familiar, mas em outra perspectiva. Em 2015, a dupla pôs as contas na ponta do lápis e decidiu trabalhar com a mãe no crochê.
Com a escolha, a Associação passou a contar com uma ajuda de fôlego. "Decidimos promovê-la, valorizar a arte do crochê e afastar um pouco essa imagem de que crochê é coisa de 'senhorinha'. Isso não existe mais aqui. É um crochê atual, onde conseguimos divulgar essa arte para o mundo todo de uma forma inovadora e atualizada".
A experiência conquistada no curso de Administração foi outro elemento decisivo na trajetória das irmãs. Enquanto Jeicy é dada aos números, ao cuidado de contas e contratos da loja, Jani dedica-se ao serviço de divulgação das peças. Além de atuar como modelo, ela organiza as sessões de fotos e gerencia o contato com o público no perfil da Associação na rede social Instagram.
A ferramenta tem sido decisiva. Em época de baixa estação, ajuda a manter o fluxo de vendas para clientes de outros estados brasileiros e também do exterior. "Quando vamos tirar as fotos dos produtos, elas (crocheteiras) ficam superempolgadas, querem saber como funciona. Se atualizam das novidades na moda. É muito prazeroso trabalhar com isso", ressalta Jani.
O consumo cresce, as mulheres continuam buscando inovações. A produção é feita em casa por cada associada, e a média de tempo de trabalho é individual. Mensalmente, o grupo se reúne para planejar as coleções. Na loja física, há revezamento e, pelo menos, duas integrantes atendem durante o dia. O preço dos crochês é tabelado e, no fim do mês, a artesã recebe o valor integral de cada peça sua vendida.
Os custos com a manutenção do espaço são divididos entre as crocheteiras. A renda, conforme a presidente da Associação, atualmente é "bem mais segura", chegando a um salário mínimo mensal. "Hoje, a renda é mais segura por conta da organização que a gente teve. A Associação tem muita força. E as meninas novas têm mais entendimento do que nós. Elas estudaram mais do que nós e a gente se organizou e está dando tudo certo. Eu tinha fé, porque muitas diziam que não ia dar certo. Mas nós não desistimos", comemora Maria. (Colaboração: Antonio Laudenir)
Serviço:
Associação das Crocheteiras de Jericoacoara (Rua Principal, Vila de Jericoacoara - Jijoca de Jericoacoara, Ceará). Horário de funcionamento: 9h às 21h
Vendas online:
Instagram: @mundojeri_croche,
WhatsApp: (88) 99747.6590
Email: artesanatomundojeri@gmail.Com