Queda de homicídios, chacinas e metas para policiais: como foi o primeiro ano de Roberto Sá na SSPDS
Nesse período, a facção criminosa carioca Comando Vermelho intensificou a atuação no Ceará, com uma sequência de ações ousadas, como a interferência nas eleições municipais e a série de ataques a provedores de internet
O primeiro ano de Roberto Sá como titular da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) foi marcado pela redução de homicídios e pela criação de um programa de metas para os agentes de segurança. Em contrapartida, as facções criminosas continuaram se digladiando no período, com o registro de duas chacinas, além de interferirem nas eleições municipais e atacarem provedores de internet.
Em entrevista ao Diário do Nordeste, Roberto Sá, que assumiu a Pasta em 3 de junho do ano passado, lembrou que chegou ao Ceará em um momento que o Estado vivenciava um aumento de homicídios acumulado em 2024 (entre janeiro e maio) em 23,7%, na comparação com igual período de 2023 (o índice saiu de 1.176 mortes violentas para 1.455 crimes, no outro ano).
O ano de 2024 terminou com 10,1% de aumento de homicídios no Ceará, na comparação com 2023 (3.272 crimes contra 2.970). Já em 2025, o Estado conseguiu "virar a chave" e acumular uma redução de mortes violentas acumulada - entre janeiro e maio - de 17,7%, ao comparar o número de 1.198 homicídios no ano corrente com 1.455 mortes, em igual período do ano passado.
"Isso, de certa forma, mostra que havia um pico, estabilizamos, reduzimos o crescimento e depois conseguimos reduzir, efetivamente, a ponto de chegar aqui. Eu dei um redirecionamento de ações imediatas, contando com as forças policiais, para aquilo que eu entendia que era um grande problema, naquele momento, enquanto aprofundava o diagnóstico para levar ao governador a necessidade de alguma reestruturação ao nível de política", explica Roberto Sá.
"Em nível de ação, eu imediatamente orientei que a Polícia Militar buscasse retomar sua característica, sua vocação e sua missão constitucional de dar mais visibilidade no seu patrulhamento, de forma que ela fosse mais vista e percebida pela população, e também buscando inibir a prática de ação criminosa."
Esse, segundo o secretário da Segurança, é o "serviço ordinário" da Polícia. No serviço "extraordinário", realizado por batalhões e delegacias especializadas, a SSPDS focou em pagar horas extras, para suprir a falta de efetivo, e empregar esse "reforço" nas áreas mais sensíveis do Estado, com forte atuação de facções criminosas e aumento de homicídios.
Logo no primeiro mês de gestão de Roberto Sá na Segurança Pública do Ceará, uma chacina com sete mortos e dois feridos foi registrada no Município de Viçosa do Ceará, na Região Norte. As investigações da Polícia Civil do Ceará (PCCE) apontaram que a matança foi promovida pela facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC), contra rivais do Comando Vermelho (CV).
Roberto Sá enfatiza que se deslocou para Viçosa do Ceará, junto de comandantes das polícias Civil e Militar e tropas especiais, para dar o "sentido de urgência" que o caso exigia. "Alguns episódios são tão inadmissíveis que a gente tem que chegar com toda força possível e não sair. Ficar (na região) e dobrar a aposta, ir para cima, porque o crime não pode prosperar. Ele vai estar nos desafiando o tempo todo, mas a cada ação ousada a nossa força tem que ser maior ainda", brada o secretário.
Veja também
Ações ousadas de facção carioca
Nos meses seguintes, a facção criminosa carioca Comando Vermelho intensificou a atuação no Ceará, com uma sequência de ações ousadas. Em outubro, a organização criminosa interferiu nas eleições municipais de Santa Quitéria, no Interior do Estado.
O prefeito eleito acabou cassado pela Justiça Eleitoral, pelo envolvimento com o crime organizado. No último sábado (31), uma operação na Rocinha, no Rio de Janeiro, tentou prender um líder do CV que teria dado ordens para ameaças e ataques a candidatos e eleitores de Santa Quitéria, mas ele fugiu.
A Polícia ainda identificou suspeitas de interferência de facções criminosas nas eleições de Fortaleza, Caucaia, Sobral e Canindé. "Criamos um protocolo junto às nossas instituições de atendimento imediato da Polícia Militar, para garantir o direito de cidadania de candidatos e de eleitores. Mas também determinei à Polícia Civil que, na chegada da notícia, imediatamente iniciasse uma investigação e depois comunicasse à Polícia Federal", relata o secretário Roberto Sá sobre a atuação da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará no pleito eleitoral de 2024.
"O protocolo funcionou muito bem entre nossas forças, com a Polícia Federal, com o Ministério Público e com o Tribunal Regional Eleitoral. A ponto de que, em Santa Quitéria, o prefeito ter sido cassado. Mas foi um trabalho que começou com a investigação da Polícia Civil sobre a organização criminosa. Nas outras cidades, nós passamos todos os nossos trabalhos para a Tribunal Regional Eleitoral, a quem compete julgar esses casos, e para a Polícia Federal, que tem a competência primária de investigar isso."
Em março de 2025, o Comando Vermelho intensificou ameaças e ataques criminosos a provedores de internet, para extorquir empresas do ramo ou mesmo garantir o monopólio do serviço para operadoras ligadas à facção. Foram dezenas de ataques em Fortaleza, Caucaia, São Gonçalo do Amarante, Caridade e outros municípios. O Estado reagiu com a prisão de 57 suspeitos de participar dos crimes, em três fases da Operação Nocaute.
Dois meses depois, a facção carioca promoveu outra ação criminosa que assustou a população cearense: uma chacina em um campo de futebol society na Barra do Ceará, em Fortaleza, com quatro mortos. O território era dominado pela facção cearense Guardiões do Estado (GDE), segundo as investigações policiais.
Apesar da intensificação das ações do Comando Vermelho, o secretário Roberto Sá ponderou que "essa facção é uma preocupação também, junto com as outras. Todo grupo criminoso nos preocupa muito, mas essa realmente tem uma presença nacional e até internacional. Essa facção, junto com a de São Paulo (referindo-se ao PCC), já 'tem um pé' lá no Paraguai ou 'os dois pés', e em regiões que são fornecedoras de armas de fogo clandestinas".
Diversas lideranças do Comando Vermelho no Ceará foram alvos da operação na Rocinha. Porém, de 29 mandados de prisão preventiva que os policiais pretendiam cumprir, apenas um suspeito foi preso. O secretário Roberto Sá confirmou que esses criminosos, escondidos no Rio de Janeiro, ordenaram mais de 1.000 homicídios em território cearense, nos últimos anos.
"Por análise de inteligência de todos esses homicídios, que foram catalogados e investigados, alguns não se chegou à autoria do aperto do gatilho, mas no contexto da investigação e pela ordem de prisão que as investigações nos conduziram, é possível inferir que, de 2023 até 2025, essa facção e essas pessoas estiveram envolvidos na execução ou no mandato daqueles aproximadamente 1000 homicídios."
Reforços e investimentos na área
O secretário Roberto Sá acredita que os investimentos e os reforços na área da Segurança Pública também foram importantes para a redução de homicídios registrada no Ceará, em 2025.
No fim de 2024, o Estado anunciou uma reestruturação nas Forças de Segurança do Estado, com novas delegacias da Polícia Civil e batalhões da Polícia Militar e unificação dos cargos de escrivão e inspetor da PCCE, em "oficial investigador de Polícia". Um investimento de R$ 26 milhões ao ano, segundo o secretário.
devem ser pagos por ano para agentes de segurança, com o Sistema de Metas Integradas de Segurança Pública (Misp), lançado em fevereiro deste ano. Cada servidor pode receber até R$ 2 mil por quadrimestre e R$ 6 mil por ano, como gratificação pelos resultados da Segurança Pública do Ceará.
O objetivo da SSPDS é reduzir em até 11% o número de mortes violentas, no primeiro ano do Misp. "O retorno que eu tenho tido de policiais que eu tenho contato direto ou através dos comandos das polícias tem sido extremamente positivo. Agora ao final do primeiro ciclo, nós conseguimos fazer o pagamento na folha de pagamento, junto com o seu próprio pagamento, de forma que eles percebam que é um uma política de estado séria, que reconhece o esforço adicional do profissional", avalia Roberto Sá.
Segundo o secretário, o anúncio de quatro concursos públicos (para delegado e oficial investigador da Polícia Civil e soldado da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros) também irá colaborar com o trabalho das Forças de Segurança, nos próximos anos.