Assaltos a ônibus caem 63% em nove meses na Grande Fortaleza

Relatos de usuários e motoristas comprovam medo de situações de violência durante locomoção no dia a dia. Órgãos de segurança e empresas articulam estratégias para prevenir ocorrências e prender responsáveis.

Escrito por Redação , seguranca@verdesmares.com.br
Legenda: Presença de policiais militares nos ônibus em Fortaleza.
Foto: Foto: Camila Lima

O caminho de muitos cearenses à escola, trabalho ou lazer pode ser interrompido por atos criminosos que põem em risco a segurança pessoal e patrimonial de passageiros e motoristas. De janeiro a setembro deste ano, foram registrados 385 assaltos a coletivos na Grande Fortaleza, uma média de 42 por mês, segundo o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus).

O valor é 63% menor que os 1.046 contabilizados em igual período do ano passado. Apesar da redução, quem precisa lidar com transporte público ou particular compartilha medos diários de assaltos e violências sexuais, principalmente na Região Metropolitana de Fortaleza.

Nem pacientes em tratamento do câncer escaparam de uma ação criminosa, na madrugada da última quinta-feira (31). Um ônibus que trazia pessoas do Crato, no Cariri, para consultas em um hospital de Fortaleza, foi abordado por bandidos na Capital. Os assaltantes chegaram a atirar contra o veículo. A maioria dos passageiros teve pertences como dinheiro e celulares levados, mas, com medo, preferiu não falar do episódio.

O monitoramento dos assaltos a coletivos é realizado em entre o Sindiônibus e a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), que se reúnem mensalmente. Em um dos encontros, em abril, o secretário André Costa frisou que o transporte coletivo é encarado como prioridade porque, "em um único assalto, você tem dezenas de vítimas que, quando chegam em casa, repassam essa sensação de insegurança para seus familiares, vizinhos e amigos".

"É um evento bastante nocivo", considera, lembrando o "alto risco" da ação de uma pessoa armada dentro do confinamento do espaço. "Se um bandido decidir efetuar um disparo, tem potencial altamente lesivo", explica Costa.

Uma das ações recorrentes é a Operação Passageiro Seguro, que consiste em abordagens a coletivos em localidades onde há maior incidência de crimes na Capital e na Região Metropolitana. As ações são orientadas a partir de informações enviadas pelo próprio Sindiônibus.

Rastreamento

Segundo João Luís Maciel, gerente de Operações do Sindicato, a entidade também notifica assaltos imediatamente à Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops), para que viaturas nas redondezas sejam acionadas. Ele garante que 100% da frota de 1.730 veículos possui rastreamento e câmeras de monitoramento, cujas imagens embasam inquéritos policiais instaurados pela Polícia Civil.

As ocorrências, embora pulverizadas na cidade, são comuns em bairros como Aerolândia, Messejana, Itaperi, Siqueira e Bom Jardim, conforme Maciel.

"Os assaltos começaram a diminuir sensivelmente. A gente sabia que, enquanto tivesse dinheiro, o ônibus seria atrativo. Pra acabar mesmo ou diminuir, veio o projeto de autoatendimento com pagamento com cartão eletrônico", informa o gerente de Operações. Segundo João Luís, não há alteração do itinerário de linhas "em horário nenhum", em função de possíveis assaltos.

Assaltos e assédio

A vendedora Lúcia Medeiros, 28, sabe bem como é a realidade dos ônibus: são, pelo menos, quatro por dia. "Uma loucura" rotineira que inclui um episódio em que "assaltantes entraram pra levar tudo, mas acharam que era pouco". Além dos assaltos, ela ainda se preocupa com o assédio sexual. Após ter presenciado casos do tipo, ela prefere não sentar do lado da janela pra não se sentir acuada por homens. "Fico mais do lado do corredor", confessa.

Para denunciar casos de assédio nos coletivos, foi lançado em março deste ano o botão "Nina", funcionalidade do aplicativo Meu Ônibus, que permite a gravação de vídeos de ocorrências para serem utilizados como evidência do crime pela Polícia Civil. Nele, é possível informar o número do veículo, o horário e o que aconteceu.

No transporte particular, quem não teve uma boa experiência com segurança foi a estudante Ana (nome fictício), de 16 anos. Desde dezembro do ano passado, ela não pega novas corridas em aplicativos porque ficou "muito assustada" após um assalto no bairro Benfica, por volta de 21h, na volta de um shopping para casa. "Meus pais não puderam me levar, daí, pelo fato de ser 'mais seguro', eu pedi um Uber", relembra a garota.

"As janelas do carro estavam abertas, e a 13 de Maio estava bem deserta. Então, vieram dois meninos de capacete e foram direto no banco de trás, onde eu estava. Pediram dinheiro e meu celular, mas eu disse que tava sem celular", conta Ana, que ficou "em choque" por já ter "medo de andar sozinha". Procurada pela reportagem, a SSPDS não forneceu dados sobre assaltos a esse tipo de transporte.

Na última quarta (30), um motorista de aplicativo conseguiu evitar uma ocorrência do tipo no bairro Canindezinho. Ele foi rendido com um simulacro de arma de fogo por um dos três passageiros do veículo, que ia em direção à Aerolândia. Durante o trajeto, o condutor avistou uma viatura da Guarda Municipal e conseguiu acioná-la usando os faróis. Dois adultos e uma adolescente foram capturados.

Violência sexual

Além dos roubos, outra preocupação é a violência sexual. Em agosto de 2018, um motorista de aplicativo foi preso em Fortaleza após denúncias de estupro. Em julho deste ano, Patrick Carneiro do Nascimento foi condenado a 14 anos e quatro meses de reclusão, inicialmente em regime fechado. Segundo a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE), o motorista usava outro nome no aplicativo; levava passageiras para imediações do bairro Dunas, geralmente à noite, as estuprava e subtraía objetos e valores, de forma violenta. Elas recorriam a condomínios para pedir ajuda.

Em nota, a 99 informou que a segurança é prioridade "antes, durante e depois das corridas". Entre os recursos disponíveis, estão a inteligência artificial para mapear e evitar riscos antes das corridas; compartilhamento de rotas disponíveis durante o trajeto; e uma central telefônica 24h para emergências que oferece apoio imediato. No fim de outubro, os veículos em Fortaleza passaram a receber câmeras de segurança conectadas à Central de Segurança da empresa. Os dispositivos garantem acesso às imagens em tempo real, e os dados são mantidos em confidencialidade.

A 99 também informa que revisou o cadastro de todos os motoristas, "inclusive presencialmente, em Fortaleza". Hoje, para se tornar parceiro, o condutor deve enviar uma foto segurando a carteira nacional de habilitação.

Já a Uber respondeu que todos os motoristas passam por checagem de antecedentes criminais e realiza reavaliação dos aprovados, pelo menos, uma vez por ano. Durante cada viagem, registrada por GPS, há cobertura de seguro da Uber para acidentes pessoais. Caso o passageiro precise reportar incidentes, a empresa possui equipe de suporte 24 horas. A denúncia pode ser feita no aplicativo ou site.

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