Réu por matar esposa e a jogar em viaduto no Ceará vai para a prisão domiciliar

A decisão determinava que ele fosse para um hospital psiquiátrico, mas como a única unidade para presos está interditada ele foi para prisão domiciliar após justiça concordar com laudo de médico

Quatro anos e meio após a morte de Ana Angélica Pereira Capistrano, o ex-esposo da vítima, Carlos Alberto Soares Capistrano foi beneficiado com a prisão domiciliar. O assassinato é um dos feminicídios em Fortaleza de maior repercussão, devido ao requinte de crueldade da mulher ter sido empurrada de um carro em movimento e jogada em viaduto, mesmo após os disparos.

A decisão de levar Carlos à prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico, foi embasada na impossibilidade de o réu ser mantido em hospital psiquiátrico, já que a única unidade para presos no Ceará está interditada devido a uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Familiares de Ana Angélica consideram a ida do réu para a prisão domiciliar "como injusta" e dizem temer por suas vidas

ENTENDA A DECISÃO

Em 2022, um laudo assinado por uma médica de uma cooperativa de psiquiatras contratada pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) concluiu que o acusado tem sinais e sintomas compatíveis com o diagnóstico de transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool, e tinha capacidade de entendimento e autodeterminação reduzida quanto ao ilícito cometido.

A acusação recorreu e o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) entendeu que devido à complexidade do caso, não seria indicada uma liberdade irrestrita a Carlos "sendo inequívoca a necessidade de se resguardar a ordem pública, por intermédio de medida cautelar de internação provisória em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, cuja duração e eventual prorrogação ficarão a cargo do Juízo processante, balizadas pelo novo laudo pericial pendente de realização de exame".

Quando o juízo da 1ª Vara do Júri teve ciência da decisão da internação e determinou o cumprimento, "evidenciou a Política Antimanicomial implementada pelo CNJ através da Resolução n. 487/2023, o que motivou a interdição do Hospital Mental Stênio Gomes, conforme Portaria n. 5/2023"

O hospital ainda teria emitido um documento sem especificar o tratamento a ser efetivado e sem apontar o grau de sanidade mental do réu. Consta ainda na decisão que o psiquiatra da Coordenação de Saúde (Cosap) da unidade penitenciária disse que o preso não tinha "necessidade de acompanhamento psiquiátrico no momento".

"Diante da urgência que o caso reclama, entendo que subsiste a necessidade de submeter o acusado a prisão domiciliar (para que não reste configurado o constrangimento ilegal ao acusado que não mais conta com ordem de prisão preventiva em seu desfavor), já que não há Hospital Psiquiátrico disponível para sua internação nos termos em que estabelecidos pelo TJCE, nem há, ainda, a indicação precisa de seu atual estado de saúde"
Juiz da 1ª Vara do Júri de Fortaleza
Trecho da decisão do dia 6 de junho de 2024

A Justiça oficiou a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (Sesa) para que a Pasta informe em qual hospital da rede estadual Carlos Alberto deve ser encaminhado para cumprir eventual tratamento ambulatorial no caso de constatação de insanidade mental.

A conclusão do incidente de insanidade mental do acusado deve acontecer ainda neste ano, já que há perícia designada para o próximo dia 8 de outubro, às 14h30.

AMEAÇAS

Ainda no início de 2020, dias após o crime, a Secretaria de Segurança Pública (SSPDS) confirmou que Ana Angélica Pereira Capistrano já havia feito um Boletim de Ocorrência (B.O.) contra Carlos Alberto, em 2018. Segundo o órgão, Angélica denunciou o companheiro por ameaça, mas não retornou no prazo legal para dar prosseguimento aos trabalhos policiais, já que o crime precisa da representação da vítima.

Testemunhas contaram que o homem jogou o corpo da vítima para fora do carro na Avenida Coronel Matos Dourado e, em seguida, fugiu. Equipes do Comando de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (CPRaio) da Polícia Militar do Ceará (PMCE) foram acionadas e abordaram o motorista na Rua Raimundo Arruda, no bairro Parquelândia.

Os militares atiraram nos pneus do carro até que o homem parou o veículo e disparou contra si mesmo. Ele foi levado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) até um hospital na Capital para receber atendimento médico. A mulher chegou a ser socorrida e levada para uma unidade de saúde, mas teve morte cerebral confirmada pelo hospital.

VERSÃO DO ACUSADO

O acusado disse à médica psiquiátrica tentar lembrar do fato, mas não conseguir. Segundo ele, naquele dia havia saído com a esposa rumo a um supermercado, quando "no meio do caminho, pegou uma via alternativa e procurou um lugar ermo para conversar com ela".

Na versão do acusado, ele se sente em um pesadelo e não teria "a menor noção do que fez" se não fossem as câmeras que flagraram o feminicídio. A perita considerou que o ilícito aconteceu de forma impulsiva e sem requintes de premeditação.