A oceanógrafa Lívia Nunes, de 41 anos, denuncia caso de racismo em uma academia no bairro Guararapes, em Fortaleza. De acordo com a vítima, a recepcionista do estabelecimento a viu com roupas brancas perto de uma família e deduziu que ela seria uma babá e não uma cliente.
O caso, que ocorreu em agosto, está sendo investigado pela Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE).
A Defensoria Pública do Estado do Ceará marcou uma audiência de conciliação para realizar um acordo de reparação entre as partes, mas a empresa não compareceu.
A defensora pública Lia Felismino explica que, por causa da ausência da academia à audiência, marcada para a última sexta-feira (23), foi feito um encaminhamento judicial, além do envio da ocorrência à autoridade policial por meio de uma notícia-crime na esfera criminal e uma ação de reparação de danos na esfera cível.
O Sistema Verdes Mares entrou em contato com a academia e aguarda posicionamento.
Relato da vítima
"Eu fui [para a academia] num horário que geralmente não ia. Eu não tinha ainda nem um mês na academia e eu só ia para a natação. Eu estava com um short branco, uma blusa branca e, embaixo, o meu maiô. Passaram na minha frente duas crianças com roupa de karatê e a mãe. A família branca. Todos passaram pelo reconhecimento facial. Na minha vez, a recepcionista se achou no direito de perguntar se eu estava acompanhando a mãe dos meninos, deduzindo que eu era babá. Eu olhei para ela não acreditando, porque esse não é o procedimento", detalhou Lívia sobre o episódio.
Ainda de acordo com a oceanógrafa, a gerente de vendas estava ao lado da recepcionista e só depois a reconheceu como cliente. Ela alega que a empresa não se retratou pela injúria racial.
"Ninguém se retratou com equivalência por essa injúria racial. Porque isso se chama racismo institucional. Foi uma violência que aconteceu no estabelecimento. Se você está vestido de branco, você não é um aluno. É deduzido que você é babá ou empregada que está cuidando dos filhos da mãe branca", argumentou a vítima.
Posicionamento da empresa
Lívia afirma que recebeu ligação da gerente e do sócio da academia na tentativa de um acordo. Ela resolveu fazer o B.O. após o proprietário dizer que estava se sentido ameaçado por ela.
"A gerente me ligou sem saber como lidar com essa situação, mostrando uma cultura completamente racista. Eles acreditam que só pelo fato de contratarem pessoas pretas eles já têm uma cultura antirracista. Não se retrataram, não perguntaram pra mim o que poderiam fazer, pediram 'desculpas' ao invés de' sinto muito'", alega.
Na negociação, Lívia pediu um ano e meio de academia como cortesia e a realização de campanhas antirracistas na empresa.
"O sócio ligou para mim, fez um discurso vazio de 48 minutos que quase me convencia, fui tentar entrar num acordo pedindo um ano e meio de academia, de graça, que não ia onerar nada para eles, porque eles pagam fixo os professores, e só iria se tivesse uma campanha antirracista. Até então, eu não tinha feito o B.O. Ele me respondeu que tinha se sentido ameaçado por mim. A partir daí, eu fui fazer o boletim, porque eu não vou aceitar frequentar um estabelecimento em que as pessoas deduzem uma profissão devido à minha cor. Eu não sou a minha cor", finaliza.
Denúncias
De acordo o artigo 20 da lei 7.716/89, é racismo praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. A pena é reclusão de um a três anos e multa.
Em casos de racismo, a Defensoria Pública orienta procurar uma das sedes do órgão para relatar o ocorrido e receber assistência. As denúncias se concentram no Núcleo de Direitos Humanos. Em Fortaleza, a sede fica localizada na avenida Pinto Bandeira, nº 1111, no bairro Luciano Cavalcante.
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS), a população pode contribuir com as investigações repassando informações que auxiliem os trabalhos policiais. Isso pode ser encaminhado para o número 181, o Disque-Denúncia da secretaria, ou para o (85) 3101-0181, WhatsApp por onde podem ser feitas denúncias via mensagem, áudio, vídeo e fotografia.
As informações podem ser encaminhadas ainda para o telefone (85) 3101-2047, do 4º DP. O sigilo e o anonimato são garantidos.