Sonho se transforma em pesadelo para centenas de famílias

Em Quixeramobim, 952 famílias aguardam sorteios das casas do programa federal. Já em Quixadá, o empreendedorismo é forte e famílias vivem mais tranquilas

Escrito por Alex Pimentel - correspondente ,

Discriminação, falta de serviços básicos e incertezas, essas tem sido as barreiras enfrentadas por 952 famílias residentes nos conjuntos habitacionais Jardim Norte I e Edmilson Duarte Lino, na periferia de Quixeramobim. Após mais de cinco anos do inicio das obras de casas populares, através do Programa Minha Casa Minha Vida, ainda aguardam a legalização dos imóveis ocupados por elas. Enquanto a situação não é definida precisam estar unidas para evitarem o corte de energia elétrica e o despejo dessas duas áreas.

Moradores do Jardim Norte I, onde foram construídas 540 unidades residenciais, são até apontados como membros de facções criminosas. Surgiram boatos de o acesso ao conjunto ser controlado por uma facção criminosa, como tem ocorrido em algumas áreas da capital cearense, inclusive com expulsão de famílias, situação semelhante aos morros do Rio de Janeiro. Até a polícia estaria proibida de adentrar o “condomínio do crime”, como o lugar chegou a ser dominado nas redes sociais.

O comandante do Batalhão de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (BPRaio) em Quixeramobim, tenente PM Ednaldo Ferreira desconhece haver atuação de grupos criminosos nos dois conjuntos. As equipes do Raio nem a população têm dificuldade de adentrarem aqueles espaços. Para ele alguns malfeitores se infiltraram como moradores. O Batalhão especial começou a funcionar há três meses na cidade e desde então as prisões de traficantes e apreensões de armas de fogo tem sido constantes no Jardim Norte I.  

“Facções virtuais”, essa é a expressão atribuída pelo comandante do Raio ao quadro de pânico provocado através das redes socais, principalmente no WhatsApp, principal instrumento de comunicação da população. No fim de maio passado, boa parte das escolas da cidade paralisaram as aulas a partir de supostas ameaças de facções criminosas. O motivo seria a morte de um “faccionado” em confronto com a Polícia. As patrulhas do Raio agiram imediatamente, inspecionaram escola por escola, mas a direção de nenhuma delas confirmou ter recebido ameaça direta.

As lideranças dos dois habitacionais também atribuem aos fake news a propagação de pânico a partir de ações de membro de grupos do crime organizado. “Não existem facções por aqui. Somos todos famílias do bem, a maioria trabalhadores. Por esses motivos quando chega as 22 horas, já estão todos dentro de casa. O problema da gente é outro; a falta de água nas nossas casas e a certeza de acordamos todos os dias com um teto para nos abrigar, lamenta o vice-presidente da Associação dos Moradores do Edmilson Duarte Lino, Francisco Welington do Santos.  

Todas as moradias do conjunto estão sem água encanada. Falta instalar os hidrômetros. Segundo o líder comunitário a Defesa Civil do Município distribui água em caixas d’água distribuídas pelos quarteirões. Todavia o abastecimento não é suficiente para atender as necessidades diárias das famílias. O jeito é comprar água dos carros-pipa que circulam diariamente pelas ruas do conjunto. “Pagamos de R$ 10,00 a R$ 30,00 para encher as nossas caixas e alguns tambores de reserva”, ressalta a moradora Maria Augusta da Silva.

Sobre a situação das famílias ocupantes dos dois espaços do Minha Casa Minha Vida, a assessora técnica da Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social de Quixeramobim, Ana Edna Leite, informou estar próximo o fim do pesadelo desses moradores. O cadastro de 828 para o Jardim Norte I e de 483 para o Edmilson Duarte Lino já foram aprovados. O sorteio das casas deverá ocorrer no próximo mês. Será realizado pela Secretaria das Cidades, do Governo do Estado. As negociações já receberam os avais do Banco do Brasil, instituição financiadora, e dos construtores.      

Empreendedorismo popular

Quarteirões de oportunidades. Não demorou muito para o maior habitacional popular do programa Minha Casa Minha Vida do Interior do Ceará, o Residencial Rachel de Queiroz, em Quixadá, começar a ganhar vida própria. A cada esquina está surgindo um novo negócio, do espetinho à farmácia. Afinal, são milhares de famílias consumidoras - em números exatos 1.454 – com pelo menos um filho cada. Como a cidadela se estende por mais de 1 Km e fica situada a mais de 5 Km do Centro da cidade, podem comprar da água ao absorvente na vizinhança.

Essa foi a percepção do ex-funcionário de um supermercado situado no Centro de Quixadá. Quando passou a morar no Rachel de Queiroz não pensou suas vezes. Pediu as contas dos sete anos de trabalho e montou o seu próprio mercadinho. Foi só abrir as portas a e freguesia começar a aparecer. A satisfação foi bilateral. Ele, feliz com os resultados do novo negócio e os vizinhos a comodidade de terem tudo perto de casa.

As moradias foram entregues no fim de março passado. Diferente da situação em Quixeramobim alguns moradores logo criaram o grupo “Minha Casa Minha Vida” no aplicativo do celular. A autônoma Ana Claudia Chagas, uma das administradoras do serviço virtual, informou que foi criado a partir da união dos moradores, quando ainda aguardam o sorteio das casas. Tudo se tornou mais difícil. Sentiram-se abandonados e nesse desconforto perceberam a necessidade de um ajudar o outro. Do servente ao cabeleireiro, encontram tudo na comunidade.

Hoje, o habitacional conta com serviço de entrega de pão e de leite na porta de casa, transporte com passagem de R$ 2,50 até o Centro da cidade, das 6h às 20h; bem diferente do preço exorbitante cobrado pelos mototaxistas, de R$ 10,00 a R$ 20,00 pelo transporte e já começam a contar com os serviços de assistência social da prefeitura de Quixadá. O posto de saúde, não incluído no projeto do Residencial, e um posto policial deverão ser implantados em breve. Esses tipos de empreendimento cabem aos gestores públicos, comentam os moradores.

Programa nacional

Na política de habitação no Ceará a atual gestão estadual já entregou 15.263 unidades habitacionais pelo Programa Minha Casa, Minha Vida, através de parceria com o Governo Federal. Essas moradias totalizaram investimento de R$ 1 bilhão. Em 2017 foram entregues 3.422 moradias, totalizando o investimento de R$ 344,3 milhões. Ainda há previsão de entrega de mais 17.700 unidades até o fim de deste ano.

Em maio passado o Governo Federal anunciou a continuidade à consolidação da Política Nacional de Habitação, com a contratação para a construção de mais 2.494 unidades do Minha Casa Minha Vida no Ceará. As propostas selecionadas são da Faixa 1, que atende famílias com renda mensal de até R$ 1,8 mil, com subsídio de até 90% do valor do imóvel.

O Ceará vai receber 2.735 unidades habitacionais da Faixa 1 do Minha Casa, Minha. Fortaleza será a segunda cidade com maior número de habitações do Ceará, atrás apenas de Iguatu, com 899 imóveis para o Residencial Iguatu Novo Tempo I, Residencial Iguatu Novo Tempo II e Residencial Benderville Iguatu II. Ainda serão beneficiados os municípios de Aracati, com 300 novas habitações, Tianguá com 296, Viçosa do Ceará 248, Russas 225, Acaraú 208, Granja 151 e Pindoretama 96.

Ainda conforme o Ministério das Cidades, os imóveis poderão ser adquiridos a partir dos recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). O morador paga em até 120 prestações mensais de, no máximo, R$ 270, sem juros.