Jericoacoara é berçário de cavalo-marinho

Escrito por Redação ,
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Jericoacoara. Cabeça com formato de cavalo, corpo duro como de tatu, cauda tipo de macaco, olhos parecidos de lagarto, bolsa aparentando canguru e camuflado como camaleão. Quem pode imaginar que a aparência de tantos animais em um só descreve um dos peixes mais mitológicos dos oceanos, o cavalo-marinho?

No lado oeste do Parque Nacional de Jericoacoara existe um berçário desses animais, bem nos arredores do braço de mar, que adentra o Rio Guriú e forma uma bela área de mangue. Lá pode ser visto os encantos da natureza preservada e rara. Depois de seis quilômetros de caminhada pela beira da praia, a entrada para um paraíso quase intocado, e que ainda carece de muita pesquisa e estudos científicos.

Uma das comunidades onde estão os cavalos-marinhos é a do Mangue Seco. O ponto de referência para entrada da comunidade é a barraca e a canoa abandonadas à beira-mar, que estão sendo cobertas pelas areias das dunas. Desse ponto, até o braço de mar onde estão os cavalos-marinhos, são outros cinco ou seis quilômetros, totalmente “off road”, cruzando áreas de mangue, estradas de chão e, ainda, trechos com água pelas pernas.

Há muitos anos, os nativos fazem passeios de canoas com turistas. O objetivo é para apreciar os cavalos-marinhos em seu “habitat” natural.

No entanto, recentemente, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), antigo Ibama, reuniu pouco mais de 10 jovens das comunidades do Guriú e Mangue Seco para conversar a respeito da importância da preservação da riqueza natural que possuem.

Conscientização

De acordo com o analista ambiental, Lúcio Santos, a conscientização dos nativos é fundamental na necessidade de preservação transmitida aos visitantes do Parque Nacional. Ele destacou que o projeto de proteção ao cavalo-marinho prevê educação e normatização dos passeios.

“Essa espécie está ficando rara no mundo inteiro e nós temos uma população bem conservada. Conversamos com moradores para que eles sejam multiplicadores da educação ambiental que preservará o lugar deles”, disse Lúcio.

Segundo o analista ambiental, “duas coisas são fundamentais: nunca pegar o animal com as mãos, somente em recipiente de vidro transparente, e depois devolvê-lo ao mesmo local de onde foi retirado. A outra é não permitir que turistas usem protetor solar e entrem na água junto aos cavalos-marinhos”, destaca ele, que também é especialista em Diversidade e Conservação da Fauna.

“Vunerável”

Tanta preocupação se deve, principalmente, porque quase todas as espécies de cavalos-marinhos, inclusive as duas registradas no Brasil (Hippocampus erectus e Hippocampus reidi), estão listadas na categoria “vulnerável”, na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas de Extinção, da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

PRESERVAÇÃO AMEAÇADA
Não existe controle da pesca da espécie

Jericoacoara. No Brasil, infelizmente, ainda não há controle da pesca do cavalo-marinho. Também não existem leis de proteção específica. Como conseqüência, as muitas peculiaridades que envolvem a aura de mística desses animais ficam ameaçadas. Entre as principais, está o fato de o macho possuir uma espécie de bolsa, que o permite ficar “grávido”. De acordo com relatos de pesquisadores, na época da procriação, o macho prende-se pela cauda em algum suporte e, na seqüência, a fêmea fixa-se ao seu lado, no mesmo local.

Durante a cópula, os dois seguem em rodopios, colados frente-a-frente e, depois, a fêmea enfia seu longo “ovopositor” na bolsa do macho, e deposita seus óvulos. Depois de fechada a bolsa receptora, inicia-se o período de gestação, que gera, em média, 500 indivíduos. Sabe-se, porém, que a taxa de sobrevivência é baixa, em torno de 3%, principalmente, por serem presas fáceis para outros animais carnívoros que habitam os manguezais.

Outra curiosidade dos exóticos peixinhos é que eles navegam na vertical, de cabeça para cima e cauda para baixo, a pele varia de cor conforme o ambiente e, entre suas principais virtudes, está a de serem monogâmicos. Estudos comprovam que, em liberdade, o casal de cavalos-marinhos permanece junto todo ciclo da vida.

Esse é um dos motivos cruciais para nunca mudá-los de lugar na natureza. Eles possuem hábitos alimentares carnívoros, sendo seus favoritos camarões, crustáceos, alevinos, larvas e outros peixes, desde que estejam vivos.

Mas, infelizmente, não é somente a degradação ambiental que ameaça os cavalos-marinhos. Algumas pessoas ainda matam e secam o peixe para utilizá-lo como adorno ou amuleto, e muitos comercializam o animal vivo para colocá-los em aquários como peixes ornamentais. Os cavalos-marinhos também são muito utilizados na fabricação de remédios caseiros, sob o pretexto de serem úteis para tratamento de asma, coração, pressão, rins, impotência sexual e outros.

Um dos moradores da localidade de Mangue Seco, Valdenir de Andrade, que hoje trabalha para preservar o lugar onde mora, lembra que, em 2000, uma empresa vinha, constantemente, buscar cavalos-marinhos vivos para abastecer aquários da Capital.

“Eles vinham de carro e só queriam comprar os coloridos. Pagava R$ 1,00 por cada bicho. Naquela época, tinha muito cavalo amarelo, vermelho, laranjinha. Hoje, é mais fácil encontrar o da cor preta”, lamenta o nativo que garante não deixar mais ninguém destruir o lugar dos animais.