O quantitativo de tartarugas marinhas encalhadas no litoral cearense nos primeiros meses deste ano já é superior ao número registrado no semestre inicial de 2020, conforme dados do Instituto Verdeluz, Organização da Sociedade Civil (OSC) que monitora os animais no Estado.
Até agora, já são cerca de 50 animais encalhados. De janeiro a julho do ano passado, eram 32. No entanto, os números deste ano ainda podem ser majorados, visto que o balanço não foi consolidado.
O último registro aconteceu nesta segunda-feira (3), na praia da Igreja Velha, em Paracuru, litoral oeste do Ceará. Uma tartaruga da espécie aruanã ou tartaruga verde (Chelonia mydas) foi encontrada com vida por pescadores.
O animal, que estava com um ferimento na nadadeira, foi levado para a faixa de areia e devolvido ao mar por técnicos da Diretoria de Meio Ambiente, da Secretaria de Turismo, Cultura e Meio Ambiente (Setur).
Em um intervalo de 10 dias, três tartarugas foram encontradas em prais de Paracuru. Duas delas (24 e 28 de abril) estavam mortas. Segundo o Diretor de Meio Ambiente da Setur de Paracuru, Juarez Gomes, devido ao clima tropical, Paracuru é considerada área de desova de tartarugas marinhas.
Tartarugas encontradas
- 2017 - 10 encalhes: 2 vivas, 8 mortas
- 2018 - 24: 6 vivas, 18 mortas
- 2019 - 23: 2 vivas, 21 mortas
- *2020 (primeiro semestre) - 32: 3 vivas, 29 mortas
- *2021 (até abril) - 50: não foi divulgado quantas estavam mortas
Malu Vilanova, oceanógrafa e mestranda em Ciências Marinhas Tropicais, explica que "atualmente tem sido normal os altos números de encalhes devido a maior quantidade de tartarugas marinhas". As razões que levam estes animais a encalharem, no entanto, são diversos.
A especialista, que também é voluntária do Verdeluz desde 2013, elenca as principais. "Pode ser por conta da poluição que acaba afetando o animal e ele adoece ou morre; pode acontecer de a tartaruga ficar emaranhada em redes ou anzóis; há o risco de colisão com embarcações, enfim, são variados os motivos".
A poluição, citada por Malu, é uma das maiores causas de morte desses animais considerados "bastante resilientes".
Alguns animais acabam ingerindo os resíduos sólidos que poluem o mar e eles podem ficar com o sistema gastrointestinal completamente comprometido. Não consegue se alimentar nem excretar"
A poluição das águas por esgoto, ainda segundo a oceanógrafa, também afeta a saúde das tartarugas. "Facilita a transmissão de doenças, podendo causar tumores cutâneos que baixam a imunidade e podem fazer com que as tartarugas adquiram outras doenças, parasitas e etc".
Além da poluição, o descarte irregular de materiais de pesca é uma ameaça aos animais. Quando o pescador joga material perto de corais, local onde as tartarugas se alimentam, a linha pode enroscar e sufocar o animal.
Malu Vilanova ressalta que encalhe não é sinônimo de que o animal está morto. Porém, quando há o encalhe, é preciso agir rápido para que a tartaruga não morra. "Acontece delas ficarem muito cansadas e não conseguirem voltar ao mar. Acabam ressecando no sol até morrer. Também há casos delas ficaram presas em detritos na praia e também não consegue chegar à água", detalha.
Ameaça às tartarugas:
- Predadores naturais;
- Pesca com redes de espera, anzóis e redes de deriva;
- Poluição do oceano e fotopoluição;
- Trânsito de veículos nas praias de desova;
- Destruição do habitat para desova pela ocupação desordenada do litoral;
- Aquecimento global.
"Ausência de um Centro dificulta"
Apesar do alto número de animais encalhados no litoral cearense, não existem no Estado polos ou centros de resgate para tartarugas marinhas. Os animais recebidos pelo Instituto precisam ser transportados para o Projeto Cetáceos da Costa Branca, ligado à Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN).
"Isso dificulta muito nosso trabalho. E, além disso, diminui as chances de sobrevivência do animal que precisa viajar um longo percurso em condições não muito ideias e ainda estando debilitados", critica Malu. A voluntária afirma que desde 2013 o Verdeluz "luta pela instalação de um Centro" o Ceará.
Atualmente, segundo a especialista, "há uma proposta em andamento da Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema) de criação de um centro de primeiros socorros dentro do Labomar/UFC. Mas ainda está em trâmite". A criação seria um avanço, embora tímido. "Não seria uma reabilitação, apenas um quartenário, pois não temos para onde levar o animal".
O local de destino, conforme aponta Malu, seria o o Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Silvestres (Cetas). Contudo, no ano passado, o Diário do Nordeste mostrou que o local está sem receber animais. Em 2020, nenhum animal foi recebido e, em 2019, Cetas teve menor entrada de animais da última década.
Em nota, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) disse que o fechamento do local decorre de "diversas restrições técnicas".
Sem um centro especializado no Ceará, cabe ao Verdeluz apenas prestar os primeiros socorros e encaminhar o animal ao Rio Grande do Norte. "Fazemos os procedimentos emergenciais, como hidratar, colocar o animal em lugar úmidos e depois solicitar o encaminhamento para a base mais próxima [no Rio Grande do Norte]", pontua Vilanova.
Cuidados ao encontrar animais encalhados:
- Caso o animal esteja vivo ou o achado seja de um ninho de tartarugas, é necessário deixar um espaço livre entre o bicho e o mar.
- Sempre fazer registro fotográfico do local de encalhe. Assim, fica mais fácil para a equipe identificar a espécie e a localização do animal. Outras informações, como indicar um ponto de referência nas proximidades do achado, também são úteis.
- Quando o encalhe for de tartarugas vivas, o ideal é que o animal seja mantido na areia. Nunca movê-lo com o ventre para cima.
- Como os animais podem chegar em situação estressante, o mais indicado manter uma certa distância para evitar ataques. Por serem animais silvestres, as tartarugas podem transmitir algumas doenças, como a salmonela.
Após a identificação, deve ser contatado o Batalhão de Policiamento Ambiental (BPMA) na central 190, ou com o Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará (CBMCE), no número 193.