Os festejos em homenagem à São José, padroeiro do Ceará, precisaram ser feitos à distância no interior do Ceará, diante do decreto de lockdown em todo o estado - em vigor desde o último dia 13 - por conta do crescimento de casos de Covid-19. As celebrações em paróquias e igrejas passaram a ser transmitidas ao vivo por redes sociais e os devotos tiveram que se contentar em acompanhar de casa.
O santo é padroeiro do Ceará e de sete municípios - Aquiraz, Missão Velha, Maracanaú, Catarina, Ubajara, Granja e Potengi, da Arquidiocese em Fortaleza, da Diocese de Iguatu e de 19 paróquias, além de centenas de capelas espalhadas em vilas e distritos em todos os 184 municípios.
O impedimento da presença dos devotos às igrejas trouxe sentimento de tristeza, mas não abala a fé fortalecida há séculos do sertanejo cearense.
“Eu queria ter ido para a igreja, mas não foi permitido. Rezei em casa e assisti a missa pelo rádio”, disse a dona de casa, aposentada, Marilena Costa.
O monsenhor Afonso Queiroga, da diocese de Iguatu, que tem São José como padroeiro, pontuou que “milhares acompanham as missas e novenas por meio das redes sociais e emissoras de rádio”.
Neste ano, a catedral de São José, em Iguatu, está vazia. Apenas o celebrante, alguns músicos e o sacristão acompanham e transmitem a missa. “É estranho quando a gente lembra de anos anteriores com a igreja lotada, com missas e novenas bem participativas”, pontuou o sacristão Vandeir Fernandes. “Mas se Deus quiser, no próximo ano, tudo voltará ao normal”.
O pároco Wallace Neto, da catedral de São José, disse que neste ano a celebração é diferente e que os fiéis acompanham as missas e novenas, pela internet. “É a igreja doméstica, cada um em sua casa, celebrando com fé”, disse. “A devoção e a fé estão fortalecidas no coração de cada um”.
Neste dia 19, a catedral de São José celebrou missa solene às 9 horas e, ao meio-dia, a Oração do Ângelus. Às 15 horas, haverá o Santo Terço da Misericórdia, às 18 horas, a missa do dia, e às 19 horas a programação inclui uma corrente de oração pelas vítimas da Covid-19.
Rural
Na localidade de Baú, zona rural de Iguatu, na região Centro-Sul cearense, há 125 anos há forte devoção ao padroeiro do lugar e do Ceará. “É o nosso santo protetor, o pai adotivo de Jesus Cristo”, ressalta o veterinário e um dos coordenadores da festa religiosa, Mauro Nogueira. “No ano passado, tivemos que suspender a missa, por causa do primeiro lockdown na véspera do encerramento da festa religiosa e neste ano o novenário não pode ser presencial. É muito triste tudo que está acontecendo. Dá uma dor no peito”.
Há uma relação entre São José e as chuvas no Ceará. Em período de estiagem, a data dedicada ao santo é considerada o limite. “Se não chover até o Dia de São José, o sertanejo perde a esperança no inverno”, observa o diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguatu, Evanilson Saraiva. “Outros já acreditam que chovendo no dia 19, o inverno está garantido”.
Monsenhor Queiroga separa a ocorrência de seca e de chuva da vontade dos santos e de Deus. “Há um forte sentimento de religiosidade popular entre os católicos, os sertanejos, que precisa ser compreendido e respeitado”, frisou. “Os mistérios de Deus, entretanto, são incompreensíveis e cada devoto carrega a sua fé, a sua experiência particular”.
Para o agricultor, José Bezerra, que carrega o nome do santo, celebrar o padroeiro do Ceará “faz parte de um costume que vem dos pais”. Ele plantou uma roça de quase um hectare de milho e está confiante.
“Com certeza, a nossa fé está viva e São José vai mandar um bom inverno e nos proteger dessa doença horrível”, espera Bezerra.
A dona de casa Maria Oliveira todos os anos participa da missa dedicada à São José, na localidade de Baú, sob a sombra de um fícus-benjamin. “No ano passado e neste a missa não foi celebrada, mas com a vacina e com fé em Jesus e em São José, no próximo ano vamos, sim, ter a missa cheia de gente como é de costume”.
João Souza, agricultor, perdeu a mãe dele há 17 dias para Covid e agora já está colhendo feijão. “Plantei quatro hectares de milho e se Deus quiser e São José, vou tirar uma boa safra. O inverno aqui está bom, não tenho o que reclamar”.
Emocionado com a morte da mãe e a ausência das novenas e missas, lembrou que desde criança participa da festa religiosa dedicada ao padroeiro, na localidade de Baú. “Nos dá uma tristeza danada, mas se Deus quiser tudo vai passar, com as bênçãos de São José de Senhora Sant’Ana”.
Origem
A religiosidade do homem e da mulher do campo remonta à colonização com a sua herança católica, advinda de Portugal, que aqui ganhou contornos próprios de uma expressão ora mística, ora popular, quase sempre fugindo da imposição oficial da Igreja em direção à fé nos santos, caracterizada por uma religiosidade popular típica do sertanejo – ao fazer questão de tocar, beijar e rezar em direção às imagens sacras.
“São José é um dos santos mais populares”, observa o monsenhor Afonso Queiroga. “É o patriarca da Igreja, é o exemplo de obediência, é o pai adotivo de Jesus Cristo”.