Agricultor investe em projeto para captação de água e despreza carros-pipas

Agricultor usou recursos do próprio bolso para obter água e ajudar 12 famílias na comunidade de Bom Jesus de Baixo, em Canindé

Escrito por Antônio Carlos Alves ,

Em muitas comunidades espalhadas no sertão nordestino, que enfrenta o terceiro ano seguido de uma estiagem que já é considerada a maior dos últimos 60 anos, a chegada dos carros-pipas é motivo de comemoração. Na comunidade de Bom Jesus de Baixo, em Canindé,o panorama é diferente. Lá não falta água para uma comunidade de doze famílias, graças à iniciativa de um agricultor, que utilizou, há vinte anos, dinheiro do próprio bolso para providenciar o que o poder público não foi capaz de fazer.  

O produtor rural Francisco Teixeira Paiva, 65 anos, o Picolé, e sua esposa, Jacinta Lima Paiva, 60 anos, residentes na localidade de Bom Jesus de Baixo, distante 35 quilômetros de Canindé, são criativos quando a questão é buscar meios de conviver com a estiagem.

Eles montaram um sistema de captação de água  capaz de garantir não só o consumo humano e animal como permitir a manutenção da lavoura. Eles apostaram na construção de um sistema de abastecimento simplificado, que puxa água de uma distância de 600 metros até  12 residências localizadas no entorno de sua pequena propriedade.

"Por aqui, estamos conseguindo manter o rebanho bovino, caprino, galinhas e porcos, além do plantio de manga, caju, banana, goiaba e capim", garante Francisco  Teixeira.

O processo é desenvolvido em duas etapas. A primeira puxa água do leito do rio Cangati, de um cacimbão de 10 metros de profundidade, com seis metros de água, até uma caixa instalada a 300 metros, com capacidade para 16 mil litros. Na segunda etapa, a água é bombeada até chegar às famílias, onde passa a ser armazenada em reservatórios como tambores e caixas de amianto.

Os custos para o projeto pioneiro nos Sertões de Canindé (atualizados com valores de hoje) ficaram em torno de R$ 1.500,00. Na construção do cacimbão, foram colocados dez anéis. As duas bombas tipo "sapinho", nome dado porque vivem permanentemente dentro da água para não queimar, foram compradas por R$ 360,00. A manutenção, ao longo de todo esse tempo, também é bancada pelo agricultor.

Picolé viveu 50 anos sem ajuda de equipamentos ou técnicas para passar pela estiagem, mas tudo se tornou mais fácil quando ele melhorou a captação de água na propriedade. “Não perdi nenhum animal durante a seca e ainda consegui ajudar alguns vizinhos”, comentou.

Apesar de ser um homem do campo tradicional, simples, Picolé garante que "o Semiárido apresenta muitas alternativas. A estiagem é uma questão da natureza, que não vai mudar, apesar de a gente saber que a falta d'água aconteceu também durante todos esses anos por falta de atitudes políticas e empenho em se criar situações favoráveis para o homem do sertão".

Mesmo com a pior seca dos últimos 60 anos, o carro-pipa nunca foi aguardado pelas doze famílias. Em Monte Vilar, que fica apenas a 2 quilômetros de Bom Jesus de Baixo, a comunidade depende desse tipo de assistência oficial.