Abandono e precariedade marcam estação de Caio Prado

Associação dos Amigos de Caio Prado requereu, em 2007, a posse do imóvel para realizar a restauração
Fortaleza A história de uma cidade não se faz apenas com os relatos dos moradores mais antigos. Os prédios históricos, construídos geralmente há mais de um século, também têm sua parcela de contribuição para o resgate da memória de um povo. No entanto, cada vez que as paredes começam a ruir, a desmoronar, a história encontra-se ameaçada. E não é diferente com o que acontece com os prédios que serviram de estação de passageiros para a extinta estatal Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA), no Interior do Estado do Ceará.
Em várias cidades, os prédios encontram-se em condições precárias e a ação do tempo compromete o passado, a identidade de um povo. No distrito de Caio Prado, em Itapiúna, distante 110km da Capital, a Associação dos Amigos de Caio Prado espera que o antigo prédio não seja totalmente esquecido pelo poder público. De acordo com o presidente da Associação, Marcelo Oliveira, o prédio precisa de uma reforma urgente para que os gastos não sejam ainda mais elevados, caso não haja uma intervenção a curto prazo. A antiga estação está localizada perto da única lagoa do distrito, a Lagoa da Alzira.
O caso da estação de Caio Prado é peculiar. Em 2007, a Associação dos Amigos de Caio Prado requereu, depois de acertar os documentos junto à Prefeitura Municipal, à Secretaria do Patrimônio da União (SPU) a posse do imóvel da estação e seu entorno com o objetivo de realizar a restauração e gerar atendimento público por meio de uma biblioteca e ilha digital. De lá para cá, a SPU alega que não pode passar o imóvel para a associação porque o setor inventariante da RFSSA repassou-o à SPU sem o desmembramento oficial dos registros dos imóveis no cartório de cada cidade, o que acarreta a impossibilidade de doar a antiga estação.
Conforme o relato do presidente da Associação, os alpendres caíram, juntamente com todos os galpões. "Ficaram somente os do lado da frente, que eram de madeira e amianto", diz. E completa, argumentando que a degradação do prédio é constante. "Esta totalmente abandonado, mas serve para que pessoas utilizem o prédio para outros fins. Já paguei para fazer uma limpeza, mas isso não pode continuar porque não tenho que gastar meu dinheiro com a responsabilidade do poder público".
Além disso, boa parte da estrutura da antiga estação foi furtada por alguns moradores, que aproveitaram o abandono para retirar as portas. Marcelo Oliveira ainda destaca que boa parte do telhado foi quebrado e a estrutura atual do prédio serve apenas para encontros de moradores no período da noite. Apesar da intenção de reformar o prédio, Marcelo diz que a Associação dos Amigos de Caio Prado ainda não possui recursos suficientes para arcar com as despesas do prédio.
"Fizemos um ofício para a União na tentativa de fazer a recuperação do prédio, mas nos informaram que o prédio estava sendo destinado para outra secretaria. Acredito que preciso mais de R$ 100 mil", diz Marcelo. A intenção, com o reparo da antiga estação, seria a criação da sede da Associação dos Amigos de Caio Prado e a utilização do espaço para a promoção de cursos profissionalizantes, como informática e culinária, aos moradores do distrito.
Mas, para fazer a reforma, Marcelo Oliveira disse que seria preciso angariar recursos com diversas ações a serem empreendidas no município de Itapiúna. No entanto, o presidente da Associação conta que seria importante não deixar o patrimônio municipal no descaso.
Enquanto isso, as paredes da antiga estação continuam a cair pela ação do tempo e a história do povo poderá ficar registrada apenas na lembrança ou nos relatos orais dos moradores que relembram da época.
MAURÍCIO VIEIRA
REPÓRTER
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Associação dos Amigos de Caio Prado Distrito do Município de Itapiúna
Maciço de Baturité
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Sobral ganhou 1ª concessão
Sobral Foi por aqui onde surgiu a primeira concessão para a construção de estradas de ferro no Ceará. Deu-se com um decreto de 1857, em um empreendimento que deveria construir e explorar uma via férrea a qual, partindo de Camocim e imediações de Granja, seguiria para o Ipu, passando por Sobral. Mais tarde, em 1878 o governo imperial encampou a ferrovia e estabeleceu algumas mudanças no projeto original. Em 1882, nascia o projeto da primeira estrada de ferro construída no Ceará, a Via Férrea de Baturité. E, em 13 de março de 1873, chegavam a Fortaleza as primeiras locomotivas, desembarcadas no trapiche do Poço das Draga.
De lá para cá muita coisa mudou, as velhas estações entre as cidades da região que antes eram ponto de nostalgia, hoje viraram em algumas dessas cidades, velhos casarões em ruínas. Entre esses sobrados que estão praticamente abandonados e que não tem serventia nenhuma está uma das estações que era a mais movimentada da região norte. Os trens sempre lotados partiam de Fortaleza com destino a Crateús e Teresina no Piauí passando por Sobral, onde a parada era a mais demorada.
Entre esses passageiros estava o estudante universitário e hoje advogado Francisco Anastácio Prado, ou Chico Prado. Ele conta que o tempo de viagem entre Sobral e Fortaleza era algo em torno de oito a dez horas. O prazer da viagem afastava o cansaço. "Era tudo muito romântico. A gente almoçava dentro do trem que oferecia um serviço de bordo de causar inveja", descreve Prado.
Por Sobral, o trem passava em três horários diferentes. Mas era o das 10h que provocava o maior alvoroço. "Muita gente chegava a Sobral e aproveitava o intervalo de duas horas para fazer compras, visitar a cidade e rever amigos", diz a comerciante Isabel Vasconcelos. Ela relembra que quando chegou à Estação Ferroviária de Sobral viu um progresso promissor. E foi em frente à velha estação que montou seu estabelecimento comercial que ainda mantém até hoje. "Isso aqui era uma verdadeira festa. Mas hoje está muito perigoso", relembra Isabel.
WILSON GOMES
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Secretaria Infra-Estrutura de Sobral
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Iguatu quer implantar museu
Iguatu Na jurisdição do Ceará, que inclui áreas dos Estados do Piauí e Paraíba, há imóveis operacionais e não operacionais da extinta Rede Ferroviária Federal. Os que estão em funcionamento foram transferidos para o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit) e estão sob a guarda da empresa Transnordestina Logística. A maior parte, cerca de 1500, passa por um processo demorado, desde maio de 2003, de levantamento a fim de ser encaminhada à Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Os prédios sofreram destinação diversa após a privatização do sistema ferroviário federal.
Até 2003 a determinação era alienação do patrimônio, isto é, venda dos imóveis não operacionais. Antigas estações de trem e galpões foram adquiridos pelos municípios. Alguns permanecem fechados, pertencentes ao patrimônio da União, outros já são utilizados pelas Prefeituras, mas há aqueles que aguardam transferência para o município.
Iguatu comprou, em 2000, uma área de 1.485m quadrados, que inclui um galpão da antiga estação de trem. Em 2006, a administração quitou débitos remanescentes, mas aguarda até hoje a transferência da propriedade. "A demora nesse processo de inventariança traz prejuízo e atrasa a implantação de projetos culturais", observa a procuradora jurídica do município, Juliana Dantas. "O município comprou o imóvel, mas não pode exercer o seu direito constitucional de propriedade", diz.
A idéia inicial era implantar uma escola de música popular, mas o atraso obrigou a Prefeitura a construir um novo imóvel. Atualmente, o galpão está funcionando como arquivo provisório do INSS, enquanto a sede do órgão passa por reforma. Antes, já foi ocupado por famílias vítimas de enchente. "O nosso objetivo é implantar o museu histórico do município", revela a secretária de Cultura, Diana Mendonça. "Estamos aguardando a liberação do imóvel".
O prédio principal da antiga estação de trem é ocupado parcialmente com dois escritórios que dão apoio aos maquinistas, abastecimento das locomotivas de transporte de carga e serviço de manutenção da rede ferroviária. No dia-a-dia são apenas dois funcionários em atividade burocrática. O restante das salas estão ociosas ou servindo de depósito. Na área externa também se observa a redução do ritmo de trabalho, bem diferente da época áurea do serviço férreo. "A plataforma ficava repleta de funcionários, passageiros, vendedores", lembra o aposentado, Francisco Oliveira Paes. "Hoje está um vazio que dói no coração".
No Cedro, alguns imóveis foram adquiridos e outros foram cedidos ao município pela antiga Rede Ferroviária. O prédio da antiga estação ferroviária que durante um período de cinco décadas registrou intensa movimentação de passageiros e de transporte de mercadorias, há cinco anos guarda um museu histórico, com acervo que reúne móveis, fotos, ferramentas, oratórios, rádios antigos, dentre outras peças. "Sempre há visita de alunos e de moradores", disse o coordenador do Departamento Municipal de Cultura, João Rodrigues. Em outro imóvel já funcionou almoxarifado e depósito de merenda escolar, mas hoje está desativado.
Após extinção da antiga RFFSA foi criada, por Medida Provisória e posteriormente transformada em lei, uma nova empresa, a Inventariança da extinta RFFSA, que tem a obrigação de fazer o levantamento de todos os bens móveis e imóveis. Os imóveis não operacionais serão transferidos para a Secretaria do Patrimônio da União, no Rio de Janeiro.
HONÓRIO BARBOSA
REPÓRTER
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Inventariança da extinta Rffsa
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Procuradoria do Município de Iguatu
(88) 3581. 6310