Hormônio da noite

A melatonina desempenha papel fundamental para regulação do relógio biológico do sono. Ela influencia nossa propensão maior ou menor para dormir ao longo das 24 horas. Entenda como o organismo produz o hormônio.

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Quando a noite chega, o corpo recebe sinais de que a hora de dormir se aproxima. Quem repassa a informação é a melatonina, hormônio produzido pela glândula pineal, uma pequena glândula endócrina localizada próxima da região central do cérebro. É na ausência da luz que a produção de melatonina acontece, atingindo um pico na madrugada, por volta de 2 horas. “A melatonina atua levando ao ‘relógio biológico’, localizado no sistema nervoso central, a informação se é noite (período escuro) ou dia (período claro). Desse modo, ela influencia nossa propensão maior ou menor para dormir ao longo das 24 horas”, explica Dr. Pedro Felipe de Bruin, professor do Departamento de Medicina Clínica e Coordenador do Laboratório de Sono e Ritmos Biológicos da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Além de influenciar nossa propensão para dormir, a melatonina sincroniza o ritmo de funcionamento dos diversos órgãos com o sono. “Essa ação é muito importante e permite, por exemplo, reduzir a taxa de metabolismo e a necessidade de ingerir alimentos durante as várias horas em que permanecemos dormindo. Finalmente, a melatonina pode exercer, em seres humanos, um efeito indutor do sono”, explica Dr. Pedro Felipe de Bruin.

Embora outros órgãos possam produzir melatonina em pequena quantidade para atuação local, tais como a retina e o trato gastrintestinal, praticamente toda a melatonina que circula no corpo é produzida pela glândula pineal. Como salienta ainda Dr. Pedro Felipe de Bruin, o hormônio do sono exerce outras funções importantes para o funcionamento do organismo, como ação antioxidante, anti-inflamatória, analgésica e antineoplásica.

Produção

A luz é o principal fator ambiental que controla a criação do hormônio do sono. A exposição à luz bloqueia imediatamente a glândula pineal de produzir a melatonina. Mas não estamos falando apenas de luz solar.

“A iluminação artificial pode ter intensidade suficiente para suprimir a produção de melatonina. Foi demonstrado que a luz emitida por equipamentos eletrônicos de tela, tais como computadores, tablets e telefones celulares, pode afetar a síntese de melatonina e, consequentemente, reduzir a sonolência, dificultando o início do sono”, afirma o Coordenador do Laboratório de Sono e Ritmos Biológicos da UFC
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A idade também conta, sendo indivíduos idosos aqueles que apresentam picos noturnos mais baixos dessa substância. “Outros fatores que podem afetar negativamente a produção de melatonina são o trabalho em turnos, a obesidade, certos tipos de medicamentos e algumas doenças. Fatores nutricionais também podem modificar a síntese de melatonina, porém, parecem ser de menor importância”, acrescenta Dr. Pedro Felipe de Bruin.

Quando a produção da melatonina fica reduzida, o ritmo de sono-vigília se altera, o que significa dificuldade para iniciar e manter o sono, além de alterações em outros ciclos biológicos. “Existem também evidências científicas fortes de que alterações da produção de melatonina podem estar envolvidas na gênese de doenças crônicas, tais como diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares, obesidade e câncer”, destaca o médico.

Medicamento

Quando o organismo não produz o suficiente, a melatonina sintética pode ser indicada em alguns casos. “A administração de melatonina tem-se mostrado benéfica no tratamento de vários distúrbios, entre os quais destacam-se: alguns tipos de insônia, particularmente em indivíduos idosos; a síndrome do ‘jet-lag’; alterações do sono secundárias ao trabalho em turno noturno ou rodiziante; ciclo sono-vigília diferente de 24 horas; síndrome do atraso da fase do sono; alterações do sono presentes em alguns tipos de cegueira e transtorno comportamental do sono REM”, elenca Dr. Pedro Felipe de Bruin.

O pesquisador salienta que, embora a maioria dos estudos tenha mostrado que, em indivíduos adultos, a administração de melatonina é relativamente segura e que efeitos colaterais graves são raros, a recomendação é que o uso do medicamento seja feito sempre sob recomendação e acompanhamento médico. Se usado sem orientação, pode causar tonturas, sonolência, dores de cabeça e náuseas. “Em crianças e adolescentes, existem ainda poucos estudos sobre os efeitos da administração de melatonina a longo prazo. O seu uso não é recomendado durante a gravidez e amamentação, pela ausência de informações científicas sobre a sua segurança nesses casos”, destaca.

Autoridades médicas alertam para o uso indiscriminado do hormônio sintético, vendido muitas vezes com promessas de emagrecimento, combate ao diabetes, controle de enxaqueca e até na proteção contra os danos do mal de Alzheimer. “Novas indicações para o seu uso, bem como de seus análogos farmacológicos, estão sendo investigadas. Infelizmente, nem sempre as informações veiculadas sobre a melatonina e seus efeitos em alguns meios de comunicação estão apoiadas em evidências científicas sólidas, e isso tem gerado, além de insegurança, o risco de uso inadequado dessa substância, junto com a possibilidade da ocorrência de efeitos adversos”, alerta o médico.