A primeira-dama Michelle Bolsonaro atuou diretamente junto à presidência da Caixa Econômica Federal para beneficiar negócios de pessoas próximas a ela, por meio de linhas de crédito oferecidas pelo banco estatal. A informação foi divulgada nesta sexta-feira (1º) pela revista Crusoé.
Segundo a reportagem, do gabinete da primeira-dama da República saíram pedidos para que a Caixa atendesse a um grupo de empresas interessadas, todas elas ligadas a um círculo de pessoas próximas à família presidencial.
Michelle Bolsonaro chegou a registrar as demandas por e-mail e tratou do assunto em uma conversa com o presidente do banco, Pedro Guimarães, gestos que confrontam diretamente princípios básicos da administração pública, como o da impessoalidade.
"Tratamento diferenciado"
A partir da indicação de Michelle, pedidos "furaram a fila" dos interessados nos empréstimos do banco e passaram a ter um tratamento diferenciado, o que acabou sendo detectado pelos sistemas de controle da própria Caixa, que abriu uma apuração interna para investigar o caso.
Conforme revela a Crusoé, a maioria das operações de empréstimo ocorreu em uma agência de Taguatinga, cidade vizinha a Brasília, após a equipe de Pedro Guimarães encaminhar as demandas da primeira-dama. Praticamente todos os pedidos, segundo documentos da própria Caixa, foram atendidos logo em seguida.
As mensagens do gabinete da primeira-dama não apontavam especificamente em qual operação de crédito os empresários estavam interessados, mas todos os integrantes da lista foram atendidos pelo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), que tinha acabado de ser lançado pelo Governo.
Confeiteira, florista e "promoter" beneficiados
A lista de empresários atendidos inclui, por exemplo, a dona de uma rede de confeitarias em Brasília, Maria Amélia Campos, que costuma entregar seus doces no Palácio do Planalto. Houve ainda tratamento especial para o florista que atende Michelle e um "promoter" conhecido por organizar recepções e eventos.
Segundo a revista, a lista vip foi descoberta durante um procedimento de auditoria. Ao analisar processos de concessão de empréstimo, uma equipe da Caixa identificou que algumas empresas tinham sido indicadas pela sigla PEP - acrônimo para "pessoa exposta politicamente".
Ao checar sobre quem se tratava, a equipe chegou ao nome de Michelle Bolsonaro. Algumas das solicitações, segundo a reportagem, partiram do gabinete de Michelle Bolsonaro já acompanhadas dos documentos necessários para a liberação.
Não foram encontrados indícios de que os valores liberados extrapolaram os limites ou que as empresas beneficiadas não poderiam ser atendidas, mas o trâmite dos processos contrariou as regras e o fluxo de etapas que costumam ser obedecidas quando feitas por solicitantes comuns.
O empresário Rodrigo Resende, dono de uma tradicional floricultura de Brasília, admitiu ter a primeira-dama como cliente, mas negou que tenha obtido o financiamento graças a ela.
O que diz a Caixa
A Caixa declarou que "a concessão de crédito em todas as suas linhas passa por rigoroso processo de governança, compliance e análise de riscos independente".
No caso do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, o banco declarou à revista que, anteriormente à análise de crédito dos bancos operadores do programa, há uma avaliação de enquadramento por parte da Receita Federal, que notifica as empresas validadas.
"Apenas as empresas indicadas e munidas de aprovação pela Receita Federal passam pelo rito de governança da Caixa quando da solicitação do crédito, o que inclui análise por sistema de riscos, em um processo totalmente automatizado e sem interação humana. Ao todo, foram concedidos mais de 22 bilhões de reais pelo Pronampe a mais de 240 mil micro e pequenas empresas. Ademais, na condição de banco público, a Caixa recebe, por meio de sua área de Relacionamento Institucional, solicitações como dúvidas e consultas acerca de seus produtos e serviços, que são encaminhadas para avaliação técnica e impessoal pelas áreas negociais e posterior retorno diretamente aos clientes".
O Estadão Conteúdo questionou o Palácio do Planalto sobre o assunto. Não houve resposta até a publicação deste texto.