STF retoma nesta quarta debate sobre dados sigilosos com incerteza quanto ao Coaf

O processo ganhou relevância política porque, no âmbito dele, Toffoli suspendeu todas as investigações do país que usaram dados detalhados do antigo Coaf e da Receita Federal sem autorização judicial prévia

Escrito por Folhapress ,
Legenda: A sessão plenária, marcada para as 14h, deve começar com o voto do ministro Edson Fachin
Foto: Agência Brasil

O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta quarta-feira (27) o julgamento de um processo que discute o compartilhamento de dados bancários e fiscais de órgãos de controle – como a Receita e o antigo Coaf – com o Ministério Público e a polícia sem autorização judicial prévia.

A sessão plenária, marcada para as 14h, deve começar com o voto do ministro Edson Fachin. Já votaram na semana passada os ministros Dias Toffoli (relator) e Alexandre de Moraes. Faltam nove votos.

O processo ganhou relevância política porque, no âmbito dele, Toffoli suspendeu todas as investigações do país que usaram dados detalhados do antigo Coaf e da Receita Federal sem autorização judicial prévia.

Na ocasião, em julho, o presidente do STF atendeu a um pedido do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, que era investigado pelo Ministério Público do Rio sob suspeita de ter desviado parte dos salários de servidores de seu antigo gabinete na Assembleia fluminense.

A investigação sobre Flávio foi paralisada após a decisão de Toffoli, assim como outras 935 em todo o país, segundo levantamento da PGR (Procuradoria-Geral da República). A suspensão desses casos vale até que o plenário do Supremo termine de julgar o processo.

Em agosto, o Coaf foi rebatizado de UIF (Unidade de Inteligência Financeira) pelo governo Bolsonaro.

Critérios para a atuação da UIF

Uma das discussões que devem surgir nesta quarta-feira é se os ministros vão definir parâmetros para a atuação da UIF, como quer Toffoli, ou se vão restringir a análise à atuação da Receita.

Originalmente, o processo em julgamento (um recurso extraordinário) tratava somente do repasse de dados sigilosos pela Receita Federal. O tema da UIF entrou no processo com o pedido da defesa de Flávio, que pegou carona em um processo que já tramitava no Supremo desde 2017.

A defesa do filho do presidente sustentou que o Ministério Público do Rio pediu diretamente à UIF informações sobre ele, realizando uma verdadeira quebra de sigilo bancário sem controle judicial.

Em seus votos na semana passada, tanto Toffoli como Moraes incluíram a questão da UIF. Mas os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Marco Aurélio e Edson Fachin questionaram a decisão de Toffoli de julgar o tema da UIF com o da Receita.

Hoje há uma leve tendência de a maioria do plenário limitar o julgamento à atuação da Receita, na avaliação de alguns ministros e auxiliares consultados pela reportagem.
A PGR afirmou que a expansão do objeto do processo foi indevida e sem base legal. O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu aos ministros para restringir a discussão à Receita, mas o pleito não foi colocado em votação.

Para os dois ministros que já votaram, o compartilhamento de dados sigilosos pela Receita e pela UIF com o Ministério Público é constitucional e pode continuar sendo feito. Toffoli, contudo, propôs limites para o procedimento.

No caso da UIF, o ministro votou por proibi-la de fazer os relatórios de inteligência financeira (RIFs) "por encomenda" do Ministério Público e da polícia quando o alvo não estiver sendo formalmente investigado ou quando não tiver havido um relatório anterior sobre ele.

No caso da Receita, Toffoli propôs restringir as informações repassadas. Para ele, as representações fiscais para fins penais (RFFPs), feitas pela Receita, não podem ser compartilhadas com a íntegra da declaração de Imposto de Renda do contribuinte nem com extratos bancários.

Se o Ministério Público quiser obter tais documentos, na visão de Toffoli, os procuradores precisam pedir quebra de sigilo pela via judicial. Se prevalecer a proposta de Toffoli para a atuação da UIF, é possível que a Justiça venha a debater, posteriormente, a nulidade da investigação sobre Flávio.

A apuração sobre ele partiu de um relatório de inteligência financeira que identificou movimentações atípicas de R$ 1,2 milhão nas contas de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.

Depois de receber o relatório sobre Queiroz, o Ministério Público pediu ao Coaf informações sobre Flávio. O Ministério Público do Rio afirmou em nota, na semana passada, que a investigação sobre Flávio seguiu os procedimentos legais.

Veja todos os pontos da tese proposta por Toffoli 
Sobre a UIF (Unidade de Inteligência Financeira), antigo Coaf:

- É constitucional o compartilhamento, pela UIF, dos relatórios de inteligência financeira (RIFs) com o Ministério Público e a polícia para fins de investigação criminal;
- A UIF não é órgão de investigação penal, e, sim, de inteligência, competindo-lhe receber informações de instituições, como bancos, examiná-las e repassá-las às autoridades de investigação quando houver movimentações suspeitas. Ou seja, a UIF não pode pedir informações aos bancos;
- O conteúdo e a forma de disseminação dos RIFs, tal como são feitos hoje, preservam o sigilo financeiro, pois, embora possam constar deles dados específicos sobre certas movimentações, os relatórios não fornecem extrato completo de todas as transações de determinado cidadão;
- São lícitos os pedidos de informação complementar feitos pelo Ministério Público e pela polícia à UIF. A unidade tem autonomia e independência para analisar esses pedidos;
- Todavia, não é possível que a UIF faça relatórios por encomenda do Ministério Público e da polícia se não tiver emitido anteriormente, de forma espontânea, um alerta sobre determinada pessoa ou se não houver algum procedimento formal de investigação sobre essa pessoa;
- Os RIFs são meios de obtenção de prova e não constituem prova criminal;
- O recebimento das comunicações, a produção e o repasse de informações sobre as movimentações devem ser realizados única e exclusivamente por meio dos sistemas eletrônicos oficiais e seguros (vedado o uso de email, por exemplo).

Sobre a Receita:
- É constitucional o envio das representações fiscais para fins penais (RFFPs) para o Ministério Público Federal contendo informações sobre crimes contra a ordem tributária, contra previdência, descaminho e lavagem de dinheiro;
- Porém, é vedado o repasse de documentos como extratos bancários e declaração de Imposto de Renda;
- O Ministério Público Federal receberá as representações e instaurará procedimento investigatório devendo comunicar imediatamente o juiz responsável.

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