Prefeituras aguardam efetivação de auxílio financeiro no Senado

Após passar na Câmara, cabe aos senadores aprovarem medida que obriga o Governo Federal a igualar os repasses do FPM e do FPE aos patamares de 2019, diante das perspectivas de perdas por conta do novo coronavírus

Escrito por Jéssica Welma , jessica.welma@verdesmares.com.br
Legenda: Após aprovação da Câmara, projeto de lei deve ser analisado pelos senadores
Foto: Foto: Agência Senado

Agravada pela crise na saúde, a crise financeira dos municípios tem intensificado a mobilização de gestores públicos por medidas de enfrentamento aos efeitos colaterais do combate à pandemia do coronavírus. Um dos principais focos, agora, é a aprovação no Senado de uma proposta que mantém nos patamares de 2019 os repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Na última quarta-feira (1º), a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que obriga o Governo Federal a garantir aos entes repasses iguais aos do ano passado. FPE e FPM dependem da arrecadação de Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que deve diminuir por conta da crise econômica relacionada ao novo coronavírus.

Pelo texto, a União terá de complementar eventual diminuição de repasses por perda de arrecadação enquanto durar a calamidade causada pela pandemia de Covid-19, ou seja, até 31 de dezembro de 2020. A diferença será paga aos entes federados na forma de auxílio emergencial.

A proposta aguarda ainda avaliação do Senado. Na última semana, a Casa também deveria ter votado proposta que antecipa repasse de 1% do FPM, mas a sessão virtual marcada para avaliar a proposta foi cancelada. Segundo o autor do projeto, senador Eduardo Braga (MDB-AM), o porcentual a ser antecipado equivalerá a R$ 4,81 bilhões, com previsão de pagamento para abril.

A realidade é que, até agora, nenhuma medida de socorro às prefeituras foi efetivada. "A medida é muito positiva, ela foi fruto de uma reunião que tivemos da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), domingo passado, com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele se comprometeu com a medida. É uma notícia positiva, é um fato importante para os municípios. Mas esse fato isoladamente não resolve o problema na sua inteireza", ressalta 1º vice-presidente nacional da FNP e prefeito de Aracaju (SE), Edvaldo Nogueira.

Em 2019, segundo dados do Tesouro Nacional, foram repassados R$ 93 bilhões aos municípios em FPM. No Ceará, as prefeituras receberam R$ 4,6 bilhões. Já o FPE de 2019 foi de R$ 5,7 bilhões para o Estado.

"Antes, seria por medida provisória, mas acabou sendo votado na Câmara. Para quem já ia ter baixa na arrecadação, é um aporte de dinheiro importante. Temos compromissos que são custos fixos", ressalta o presidente da Associação Cearense dos Municípios do Ceará (Aprece), Nilson Diniz, que também é prefeito da cidade de Cedro.

A redução na atividade econômica devido às medidas de isolamento tem impactos sobre impostos fundamentais para o funcionamento dos municípios, como o ISS (municipal) e o ICMS (estadual), ambos baseados na prestação de serviços e na circulação de mercadorias.

"O ISS foi o imposto que mais cresceu nos últimos anos nos municípios. Propusemos que o Governo encontre maneiras de nos ajudar a compensar a queda nesses impostos, como com a suspensão das dívidas dos municípios com os bancos e das dívidas com a União", cita Edvaldo como exemplo.

Ele ressalta que a suspensão não se trata de uma decisão definitiva, mas de um pedido de adiamento até que a pandemia perca força.

A proposta sob avaliação do Senado também proíbe a suspensão, retenção ou bloqueio de repasses a estados e municípios devedores enquanto durar a situação de calamidade pública decretada pelo Governo Federal. Ainda assim, estados e municípios têm se mobilizado para decretar estado de calamidade individualmente para destravar burocracias e garantir que não serão responsabilizados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Contribuições

Também foi incluída na proposta a suspensão da cobrança de contribuições previdenciárias pelas prefeituras durante os meses de março, abril e maio de 2020. "O não pagamento temporário da contribuição patronal do INSS vai dar uma ajuda também aos municípios. Hoje, 22% da folha é da contribuição patronal", ressalta Diniz.

A regra pode ser prorrogada enquanto durar o estado de calamidade relacionado à pandemia de Covid-19.

"Essas medidas de redução de despesa, como a suspensão das dívidas com bancos privados e públicos e a suspensão do recolhimento, dariam uma economia grande para os municípios aguentarem, mesmo que sejam suspensos e que depois sejam renegociados, não é calote", pontua Edvaldo Nogueira.

Interior

Para quem vive o dia a dia da gestão municipal, o cenário tem sido cada vez mais caótico. A prefeita de Alto Santo, Íris Gadelha, afirma que as perspectivas de a gestão fechar as contas e garantir o cumprimento das demandas sociais são "desanimadoras".

"Nada do que se está prometendo de auxílio emergencial chegou para a gente. Recebemos R$ 48 mil que compramos de EPIs: máscaras, coletes, capas descartáveis para equipar nossos médicos e nossos enfermeiros e temos feito higienização na cidade. Segunda-feira sai o pagamento dos idosos, mas não temos policiamento para evitar a aglomeração e meu hospital é de pequeno porte", conta a prefeita.

Além disso, ainda há impasses sobre o cronograma da educação. "Nosso propósito é, quando retornarem as aulas, darmos uma hora a mais de aula para pagar o ano letivo, porque não temos estrutura para as aulas serem online, é muito pobre a realidade de muitos municípios", ressalta. Segundo ela, também não há dinheiro em caixa para que sejam antecipados os pagamentos de férias dos professores.

"Estamos de olho na questão sanitária, na econômica e principalmente na social. É um dilema, pois é pressão pra você fazer mais gasto, mas ao mesmo tempo uma pressão para diminuir as receitas", pontua Diniz.

Congresso quer controle com PEC

Apesar dos apelos do Executivo, o Congresso quer manter a prerrogativa de barrar decisões do Governo que forem consideradas irregulares no enfrentamento do novo coronavírus.

Esse arbítrio está previsto na proposta que cria o Orçamento de guerra, que flexibiliza regras para gastos no combate à pandemia e facilita a fiscalização das medidas a serem adotadas pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

"Nós vamos dar o poder que o Governo precisa (para controlar o vírus), só estamos dizendo que, se o governo errar, o Congresso pode corrigir, sustar a decisão", disse o relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), Hugo Motta (Republicanos-PB). Ontem, em conversa por videoconferência promovida por um banco com investidores, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse considerar possível concluir hoje a votação em dois turnos da proposta que cria um Orçamento excepcional para o Governo conseguir lidar com a pandemia. A ideia é retirar amarras para que a equipe de Bolsonaro tenha mais agilidade e flexibilidade em medidas emergenciais.

As decisões serão tomadas por um comitê de gestão da crise, a ser presidido por Bolsonaro e composto por ministros e representantes de estados e municípios.

A ideia é separar o Orçamento fiscal, que reúne desembolsos recorrentes com Previdência Social e custeio da máquina pública, por exemplo, do Orçamento extraordinário, criado para medidas a serem tomadas durante a pandemia da Covid-19.

Após o reconhecimento do decreto de emergência do Estado e da Capital previsto para hoje, a expectativa é de que a medida avance para os municípios. "Estamos buscando uma decisão em conjunto, nenhum prefeito declarou nenhuma medida, porque o nosso parâmetro é o governador (Camilo Santana)", diz Íris.

Recursos parados

Foi encaminhado pelo Senado à sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro, o projeto que libera recursos parados em contas de estados e municípios para ações de combate à pandemia do novo coronavírus. Ele poderá sancionar ou vetar, total ou integralmente, a matéria.

Ministério da Saúde

Esse projeto permite que estados e municípios tenham mais flexibilidade no uso de recursos destinados à saúde - mais especificamente, no uso dos saldos de repasses de anos anteriores provenientes do Ministério da Saúde, mesmo que para outras finalidades.

Alcolumbre de volta

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anunciou ontem que retornará ao comando do Legislativo após isolamento domiciliar causado pela Covid-19. Davi, que havia contraído a doença, anunciou que seus dois últimos testes para identificar a presença do vírus apresentaram resultado negativo. Ele frisou ser necessário o isolamento social.

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