Bolsonaro abandona G20 mais cedo pelo segundo dia

Presidente demonstra não ter muita paciência para encontros internacionais

Escrito por Estadão Conteúdo ,
Legenda: Jair Bolsonaro participa de videoconferência da Cúpula do G20
Foto: Marcos Corrêa/PR

Assim como no sábado, o presidente Jair Bolsonaro abandonou mais cedo a reunião de cúpula das 20 maiores economias do globo (G20), que ocorreu neste final de semana de forma remota por causa da pandemia de coronavírus. No sábado, o presidente fez seu discurso durante a abertura do evento, mas delegou ao ministro das Relações Externas, Ernesto Araújo, a tarefa de permanecer como o representante do País no encontro.

Na agenda de Bolsonaro, constava uma visita à Macapá, capital do Amapá, Estado que sofreu há 20 dias um apagão e ainda não teve a situação completamente retomada. Lá, ele anunciou isenção do pagamento da conta de luz aos cidadãos e desfilou numa carreata com o corpo para fora do veículo onde estava, sendo protegido literalmente por um gaurda-costas na ocasião. Hoje, porém, o único compromisso público do presidente era a participação na cúpula.

No encerramento do evento, que foi transmitido por meio da internet, pode-se ver alguns dos líderes mais importantes do mundo participando da reunião até o final, como a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Emmanuel Macron. As imagens também mostraram outros chefes de Estado ou de governo, como o presidente da Argentina, Alberto Fernández; da África do Sul, Cyril Ramaphosa; e, claro, o rei da Arábia Saudita, Salman bin Abdulaziz Al Saud, o anfitrião desta edição.

Ao lado deles, novamente Araújo representando o Brasil. Curiosamente, outro presidente que não permaneceu até o encerramento da cúpula do G20 foi o americano Donald Trump, que sempre deixou claro não ser um entusiasta de organismos multilaterais. Para a tarefa, ele escalou o diretor do Conselho Econômico da Casa Branca, Larry Kudlow.

Bolsonaro também demonstra não ter muita paciência para encontros internacionais. No ano passado, durante a cúpula do G20 em Osaka (Japão), ele desistiu de se encontrar com o presidente chinês Xi Jinping, numa reunião bilateral porque o líder asiático não compareceu ao local do encontro na hora marcada - o presidente brasileiro aguardou por 10 minutos. No mês seguinte, já no Brasil, Bolsonaro cancelou uma reunião que teria com o chanceler da França, Jean-Yves Le Drian. Segundo Araújo, o encontro não se realizou por "problema de agenda" do presidente, mas no horário previsto para a reunião ele foi cortar o cabelo e transmitiu o momento por meio de suas redes sociais.

Amazônia

Em meio às críticas internacionais ao desmatamento no Brasil, Bolsonaro fez um discurso de defesa de sua política ambiental, durante a cúpula do G20. Bolsonaro criticou as "frases demagógicas" sobre a questão e afirmou que o governo continuará protegendo a Amazônia, o Pantanal e todos os biomas.

O discurso de Bolsonaro ocorreu em uma sessão da cúpula voltada para a sustentabilidade.  Bolsonaro falou a partir do Palácio do Planalto, em Brasília.

Nos últimos meses, o mundo tem olhado para a agenda ambiental brasileira por causa das polêmicas em torno da administração das florestas tropicais, em especial da Amazônia. Investidores internacionais já ameaçaram retirar recursos do País, caso o governo brasileiro não amplie a proteção ambiental.

Algumas cadeias varejistas gigantes, principalmente da Europa, também têm condicionado a continuidade das compras de produtos brasileiros a certificações de origem das matérias-primas. Preocupado com o cenário, o Itamaraty pediu a seus embaixadores e demais diplomatas no Exterior que tivessem uma postura mais proativa em relação à imprensa internacional, para passarem aos veículos de comunicação dados oficiais.

Em seu discurso no G20, Bolsonaro afirmou que iria apresentar a "realidade dos fatos". Segundo ele, o Brasil está disposto a buscar novos acordos comerciais com outros países e a assumir "novos e maiores compromissos nas áreas do desenvolvimento e da sustentabilidade".

"Ao mesmo tempo em que buscamos maior abertura econômica, estamos cientes de que os acordos comerciais sofrem cada vez mais influência da agenda ambiental", reconheceu o presidente.

Em sua fala, Bolsonaro procurou fazer a defesa do Brasil na área de sustentabilidade. Ao abordar o crescimento da agricultura nas últimas décadas, ele pontuou que "essa verdadeira revolução agrícola no Brasil foi realizada utilizando apenas 8% de nossas terras. Por isso, mais de 60% de nosso território ainda se encontra preservado com vegetação nativa".

Em outro momento, o presidente afirmou que o esforço na área de sustentabilidade deve estar concentrado na redução das emissões de carbono. "No cenário mundial, somos responsáveis por menos de 3% da emissão de carbono, mesmo sendo uma das dez maiores economias do mundo", disse. "Por isso, também nesse aspecto, mais uma vez tenho orgulho de dizer que o Brasil possui a matriz energética mais limpa entre os países integrantes do G20."

Estes comentários de Bolsonaro surgem em um ano marcado por crises na área ambiental. Em outubro, o Pantanal brasileiro foi atingido por milhares de focos de incêndio, em uma tragédia que repercutiu internacionalmente. Na metade do ano, a Amazônia também foi atingida por uma onda de incêndios florestais.

No G20, Bolsonaro defendeu a união entre conservação ambiental e prosperidade econômica e social. "O que apresento aqui são fatos, e não narrativas", afirmou, sem dizer claramente a quem se referia. "São dados concretos e não frases demagógicas que rebaixam o debate público e, no limite, ferem a própria causa que fingem apoiar", acrescentou.

Redes sociais

Durante a reunião do G20, Bolsonaro fez uma postagem no Twitter. Ele publicou um vídeo em que um gigante é atacado ao tentar defender uma pequena cidade de uma rocha. O vídeo, baseado na cena de um filme, é também uma analogia a uma publicação feita nas redes sociais por apoiadores do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, há um ano.

"BOM DIA A TODOS. Estou agora em reunião com o G-20", escreveu o presidente na publicação. O vídeo, que é um trecho do curta-metragem "Inércia", lançado em 2014, mostra um gigante correndo para tentar impedir que uma rocha atinja uma cidadezinha medieval à beira-mar.

Quando a criatura consegue segurar a pedra, esbarra sem querer em uma construção, que desaba. Nesse momento, ele começa a ser atacado pela cidade e, desapontado, acaba deixando a rocha destruir o que sobrou. A publicação também foi feita no Twitter do ministro das Comunicações, Fábio Faria. "Precisamos apoiar e ajudar esse gigante", escreveu Faria.

O mesmo vídeo foi divulgado por apoiadores de Modi em 2019. Ao final da exibição, aparece uma mensagem de apoio ao primeiro-ministro indiano. "Uma pessoa está indo muito bem, mas ainda assim a nação está culpando-o. Um dia, depois de os limites serem ultrapassados, ele pode perder o interesse", diz um trecho. "Isso é exatamente o que está acontecendo em nosso país e a pessoa a quem estamos nos referindo aqui não é outra senão nosso amado primeiro-ministro #NarendraModi."

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