Meu celular, minha vida

É medida rotineira a "vasculhada" de aparelhos celulares quando de abordagens policiais, independentemente de ordem judicial.

Um celular, porém, não pode ser considerado como um bem material qualquer. Smartphones comportam uma infinitude de informações e de documentos intrinsecamente ligados à esfera privada, da pessoa abordada e de terceiros.

Diferentemente da revista de uma mochila, por exemplo, para fins de averiguar a existência ou não de drogas quando de uma abordagem policial, o acesso ao conteúdo de um aparelho celular carece, como regra, de autorização judicial específica para tanto, especialmente face aos direitos fundamentais à intimidade e à privacidade do cidadão (art. 5º, X, da CF).

A ânsia por adentrar no universo particular de um smartphone pode acabar, na prática, contribuindo para a impunidade, na medida em que os tribunais pátrios já vêm consignando a ilicitude da prova obtida a partir do acesso a aparelhos celulares sem autorização judicial, mesmo nos casos de flagrante.

Mas e quando, ainda que inexistente ordem judicial, a autorização de acesso é concedida pela própria pessoa do abordado?

Bem, neste caso, há de se considerar, inicialmente, que o abordado não tem o dever de proceder ao desbloqueio do aparelho para que o policial possa averiguar a sua inocência, a qual deve ser sempre presumida. Sem embargos, o consentimento espontâneo, livre e consciente do abordado, por certo, é suficiente para autorizar o acesso.

Assim, salvo por situação excepcional, em que o não acesso imediato aos dados do celular represente um risco iminente de perecimento de bem jurídico tutelado, não está autorizado o agente público a acessar os dados constantes do celular sem ordem judicial para tanto ou, em última análise, sem a liberação consciente e voluntária da pessoa do abordado.

Matheus Andrade Braga

Presidente da Comissão de Estudos em Direito Penal da OAB-CE


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