Editorial: Projeções e desafios

Não há precedentes para o esforço empreendido pela comunidade científica internacional, com articulações políticas e econômicas transnacionais, para superar a Covid-19. A melhor saída é o estabelecimento e a produção em tempo recorde uma ou mais vacinas capazes de imunizar em massa populações nacionais, freando a escalada mortal da pandemia. Tratamentos têm sido testados, valendo-se de drogas disponíveis e adotadas para uma série de outros males. Nesse campo também se avança, com a medicina avaliando, metodicamente, a eficácia e a segurança de medicamentos e procedimentos.

A busca pela vacina, por vezes, lembra uma história contada em capítulos. Semanalmente, novos episódios têm sido adicionados numa trama internacional. China e Rússia alegam estar na frente, mas os conflitos geopolíticos tornam o quadro nebuloso. Críticas da comunidade científica – que adota padrões universais –, interesses políticos e orientações ideológicas divergentes e teorias da conspiração se entrecruzam, exigindo atenção de quem tenta entender em que pé está o mundo na tentativa de fazer da Covid-19 algo do passado.

Nesse contexto nem sempre claro, é animadora a projeção da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), organismo ligado à Organização Mundial da Saúde (OMS), que os países da América Latina e do Caribe devem conseguir iniciar a vacinação em massa de suas populações entre março e maio de 2021. Caso de concretize a previsão, o Brasil terá vivido pouco mais de um ano sob a ameaça do coronavírus que, por ora, já deixou quase 170 mil mortos.

A projeção da Opas veio acompanhada de avaliações acerca das dificuldades que os países encontrarão para levar a cabo uma vacinação da magnitude que é necessária. “Desafiadora e cara” foram as palavras escolhidas por Jarbas Barbosa, subdiretor da entidade, para falar da distribuição de futuras vacinas contra a Covid-19, na semana passada, no evento que apresentou cenários sanitários vindouros na região. 

Vacinar 20% da população dessa parte do mundo custará mais de US$ 2 bilhões. Parcerias da Opas com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, a União Europeia e outras instituições financeiras prometem facilitar a aquisição de grandes quantidades de doses da vacina pelos países da região.

Existem, contudo, problemas de estrutura para armazenagem que já demandam atenção dos países, na iminência da liberação definitiva de vacinas eficazes contra a Covid-19. Os imunizantes vão exigir um padrão de resfriamento atípico, com temperaturas bem mais baixas do que as que se costuma usar. Por não ser usual, os sistemas de saúde mundo afora ainda não dispõem de maquinário adequado na quantidade certa. O Brasil, infelizmente, não é exceção à regra.

Há lição de casa a ser feita. Infraestrutura, logística, recursos: tudo isso precisa ser visto com antecedência. Não há tempo a perder, porque muito já se perdeu no tempo que se passou, na crise sanitária e econômica. É fundamental que, em tempo, se eliminem os ruídos entre as instâncias de poder e as disputas políticas inoportunas. Colaboração é impreterível, claro, com uso responsável de recursos. Faz-se isso em benefício da sociedade e dos cidadãos.