Editorial: Insegurança Alimentar

A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) revelada nesta semana pelo IBGE, dimensionando a insegurança alimentar no Estado, entre os anos de 2017 e 2018, só reforça a importância dos programas de transferência de renda mínima. Quase dois em cada dez cearenses teve quadro de insegurança alimentar moderada ou grave no período citado. Isso vai desde faltar algo para uma boa nutrição até a ausência do mínimo, ou seja, um quadro de fome. Certamente ficará para o próximo levantamento o impacto positivo gerado pelos programas assistenciais implementados mais recentemente pelo Governo do Estado e os meses de auxílio-emergencial pelo Governo Federal, mas o quadro apresentado é uma realidade que só poderá ser resolvida se não for omitida.

A insegurança alimentar é classificada em leve (existe preocupação quanto ao acesso no futuro), moderada (já tem quantidade restrita de alimentos) ou grave (privação severa na alimentação, chegando à fome). Conforme o levantamento, em 2,3 milhões de domicílios cearenses, cerca de 175 mil foram classificados em segurança alimentar grave.

Comparada à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013 e com 2,3 milhões de domicílios, os números registrados de insegurança alimentar moderada passaram de 196 mil para 375 mil, e a grave de 136 mil para 175 mil.

Pior do que um dado ruim é o seu crescimento. Revela que a fome precisa se manter no foco do debate das políticas públicas sociais. Sem alimentação saudável não se aprende na escola, não se tem saúde, nem trabalho. Logo, vê-se que qualquer item de desenvolvimento de uma sociedade passa, primeiro, pela alimentação.

Erradicar a fome deve ser o lema de qualquer nação. E não se trata da falta de oferta de alimentos, pelo contrário. Conforme a Organização das Nações Unidas, um terço dos alimentos produzidos no mundo é jogado no lixo. Se sobra comida e há fome, o problema é a distribuição, logo, a desigualdade social.

No Ceará, o Governo do Estado tem implementado o Cartão Mais Infância, que beneficia mais de 45 mil famílias em situação de extrema pobreza, e o Mais Nutrição, já tendo doado 500 toneladas de alimentos para 27 mil cearenses. O Governo Federal, por sua vez, tem o Bolsa Família e o mais temporário auxílio-emergencial, por conta da pandemia. Essas medidas ajudam, mas há uma demanda ainda maior. São dois os desafios mais importantes para os gestores: fornecer o subsídio para a alimentação e garantir que esse fornecimento se dará para quem realmente precisa.

O auxílio-emergencial tem proporcionado maiores oportunidades de uma segurança alimentar, números que serão refletidos em levantamentos futuros, mas isto só revela a importância de um programa de transferência de renda mínima. Encerrada, pelo Governo Federal, a discussão sobre o Renda Brasil, ainda é necessário algo que leve recurso para milhões de pessoas (como a massa trabalhadora na informalidade) que não está nos critérios de nenhum dos programas assistenciais vigentes, sobretudo o Bolsa Família.

Há quase três décadas o Brasil conheceu o lema “quem tem fome, tem pressa”, do sociólogo Herbert de Sousa. Passado todo esse tempo, ainda é preciso vencer essa corrida.