Sede de esperança

Desde dezembro passado, a partir do surgimento dos primeiros casos de Covid-19, o intrincado momento de pandemia do novo coronavírus tem desgastado ainda mais a sociedade global, fraturada por acontecimentos que, antes mesmo dessa crise generalizada, já colocavam à prova o equilíbrio. Nos primeiros meses, de maior reclusão e incertezas, sensações de medo, insatisfação, solidão e insegurança espraiam-se pelos domicílios, por vezes sufocando esperanças e animosidades.

No Ceará, pouco a pouco os municípios, sobretudo Fortaleza, estejam retomando as atividades produtivas e sociais - passos cujo avanço depende fundamentalmente da consciência da população e do rigor das instituições, caso contrário o quadro de recuperação pode retroceder.

Contudo, a confiança ainda divide espaço com o receio e a dúvida. É possível realmente sair tranquilo para trabalhar? A prática de algumas atividades podem mesmo ser realizadas de modo mais seguro agora? Quando haverá o avanço para a próxima fase de reabertura econômica?

Diante de tantas questões, torna-se desafio diário recuperar o fôlego para minimamente continuar seguindo com cautela e serenidade. Felizmente, há instantes em que o panorama suaviza, quando o pavor dá lugar à fé. Os últimos dias, de modo especial, têm comprovado esse ponto com veemência. Notícias de encorajamento puderam revitalizar cotidianos e atestar a sede geral de boas novidades, convocando a nação a encarar melhores horizontes. Menos áridos, talvez.

Partindo do solo alencarino e ganhando as telas e ouvidos de todo o País, a história dos gêmeos Tomaz Maranhão e Gabriel Ferreira, separados no nascimento e unidos novamente após 23 anos, comoveu e engajou. Diversas foram as reações de ânimo dos leitores e espectadores frente a essa trajetória de alegrias e coincidências. Ali, em meio ao enlace tão almejado pelos irmãos, o gosto por acompanhar a felicidade acenando para a vida diminuiu, por um breve período, o ácido da realidade atual.

Os exemplos se avolumam. Em Mulungu, interior cearense, professores valem-se de uma rádio comunitária para dar aulas aos alunos sem internet; na Capital, a Associação de Moradores do bairro Serrinha já distribuiu cerca de cinco toneladas de alimentos a famílias em situação de vulnerabilidade social; por registrarem redução nas internações, os hospitais de campanha de Fortaleza destinados ao atendimento de pacientes com Covid-19 começam a ser desmontados; e os testes de vacina progridem, sendo a mais adiantada a da Universidade de Oxford, com a qual o Brasil tem parceria firmada.

Histórias do gênero reforçam a importância do vínculo entre as pessoas e o exercício da empatia. A pandemia deixou claro que, para ser superada, em todos os seus desdobramentos, será indispensável o comprometimento com o bem de todos. A superação passa a largo das atitudes sectárias; depende justamente de disposição oposta.

Atos de positividade, dos mais corriqueiros aos mais tentaculares, estilhaçam a monotonia da rotina. Percebê-los, reverberá-los e, mais ainda, tentar fazer a diferença nos dias, sinaliza compreensão e reavaliação do que se vive hoje. Este instante tão difícil, porém ainda permeado de vida.