Editorial: Saída pela política

Nos últimos dias, temos chamado a atenção para o agravamento da crise fiscal que ameaça o governo brasileiro, cujos gastos, por causa da pandemia, já atravessaram o limite do bom senso. O tamanho desta crise, pela tragédia que ela poderá gerar nos mercados mundiais, foi estampada pela agência Bloomberg, para cujos analistas a ansiedade tomou conta dos círculos financeiros, todos preocupados com o que farão o Brasil e o seu governo para “pagar pela farra dos gastos”. De acordo com a agência, os investidores estão se livrando, muito rapidamente, dos títulos da dívida pública brasileira, optando por adquirir somente os de curto prazo, ou seja, com data de resgate de poucos meses. Assusta, principalmente, a alta velocidade com que a relação dívida-PIB se aproxima dos 100%.

Desastrosa seria a declaração de “default”, isto é, o anúncio do calote, a suspensão do pagamento da dívida, o que a vizinha Argentina já fez duas vezes nos últimos 10 anos. Em 2021, o Brasil terá de pagar R$ 3,5 trilhões de sua dívida, e não poderá fazê-lo, simplesmente porque não dispõe desse dinheiro. Solução: emitir novos títulos, com prazos mais curtos, mas com juros altos exigidos pelo mercado. Este é o cenário visto de hoje. No radar dos investidores – e principalmente dos especuladores – estão expostos os problemas da relação entre os poderes, que retarda a apreciação e aprovação das reformas vistas como incontornáveis e urgentes: a administrativa e a tributária. A demora repercute na Bolsa de Valores, onde cai o preço das ações e sobe o dólar. O real já se desvalorizou mais de 40% neste ano em relação à moeda norte-americana, e isto fez subir a inflação, pois a indústria brasileira é muito dependente de matérias-primas e insumos importados, como o trigo e os princípios ativos dos medicamentos. Essa conta vai para o consumidor.

A crise está posta, mas ainda deve-se esperar as próximas semanas para se avançar em qualquer resolução. Por causa das eleições municipais, a serem realizadas no próximo dia 15, mesmo deputados e senadores estão mais voltados para o pleito, pois é nos municípios que está sua base de apoio. As mudanças a serem feitas, contudo, exigem dedicação total e, como são previsíveis os embates, não há quem queira, por ora, arriscar seu capital político. São os parlamentares, no Congresso Nacional, que podem dar solução, e de modo expedito, aos problemas da economia, que só se aprofundam e afetam o cotidiano de todos os setores da sociedade. Neste difícil ano, é importante que se abreviem. 

O Orçamento Geral da União para o exercício de 2021 ainda não foi aprovado porque, além das disputas paroquiais por mais verbas, prossegue o impasse em relação à fonte dos recursos que custearão o Renda Cidadão ou Renda Brasil, novo programa que substituirá o Bolsa Família. Como a Lei do teto dos gastos impede a ampliação da despesa, a solução será reduzir as dotações dos ministérios, contra o que vários ministros e parlamentares já se ergueram.

Só a política pode construir a saída para a crise. Então, é hora de a sociedade mobilizar-se para pressionar o Congresso Nacional e seus líderes a cuidar do que lhe cabe: aprovar, já, as reformas administrativa e tributária, que são, nesta nova emergência, a melhor opção para um feliz desenlace.


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