Editorial: Onda do descuido

A cada fim de semana tem se repetido uma cena que remete à vocação turística cearense, comum nos dias anteriores à emergência da pandemia da Covid-19. Atividades ao sol, praia lotada, banho de mar. Uma ode à saúde, bem-estar, sensação de liberdade. A imagem imediata, o que de fato é visível e pode ser registrado em fotos ou vídeos, está em descompasso com a realidade de período excepcional.

O enfrentamento à doença continua, porque é necessário que suas ações sejam continuadas. O contágio ainda existe, assim como os casos graves e a morte decorrente desses. A retomada de atividades sociais e profissionais é importante, contudo exige que uma nova dinâmica, com rigor e disciplina, torne-se habitual. É preciso que assim seja para que os passos dados até aqui não precisem ser refeitos na direção contrário, num indesejado recuo a fases anteriores do plano traçado pelo Governo do Estado.

A imagem idília do lazer no fim de semana, sem o cuidado necessário, orientado de forma explícita no decreto estadual, é um pesadelo para as autoridades de saúde, com base na ciência e na experiência de quem já viu, de perto, os riscos da Covid-19.

Há muito o que se discutir a partir das imagens das praias lotadas, em Fortaleza e em outras partes do litoral cearense. Da parte de quem frequenta a orla, sem respeitar as medidas protetivas, é risco desnecessário, tendo em vista todo o sufoco enfrentado pela sociedade nestes cinco meses de pandemia do novo coronavírus. Doença que ceifou milhares de vidas de forma repentina e trouxe danosos efeitos ao desenvolvimento econômico, social e educacional.

O que é visto nas praias também alerta para a necessidade de se reforçar a fiscalização, por parte dos órgãos competentes; e o compromisso das instituições, públicas e privadas, para que sigam os protocolos de segurança, sob pena de contribuírem para o retrocesso do quadro de convivência com a pandemia.

É bom que se repita: o novo coronavírus ainda não foi vencido. Não há qualquer comprovação científica que respalde qualquer pessoa a se autodeclarar livre da enfermidade. Nem mesmo os que contraíram o vírus em algum momento podem se considerar livres da Covid-19, tendo em vista que também não se comprovou a durabilidade da condição imune de quem já se infectou.

A onda do descuido, que se configura uma verdadeira ressaca moral, se persistente, não vai apenas encharcar a sociedade cearense de maus exemplos para uma geração que já cresce sob a sombra deste triste episódio, mas pôr em risco a saúde de muitos que têm a consciência do momento de exceção e que podem ser vítimas, até dentro das próprias casas, da inconsequência de quem não pensou no outro.

Vale a reflexão para que todos exerçam a empatia, que se tenha consciência e paciência, para o momento certo de voltar ao velho convívio social. Muitas amarras já foram desfeitas nesse processo, fruto de um esforço coletivo que resultou em bons números de avanço contra a doença. Mas a batalha ainda está longe de acabar, e não é hora para perdemos para nós mesmos. A brisa, o sol e o mar estarão diariamente nas praias, com toda força e beleza, disponíveis novamente para que, com saúde, se possa aproveitar o melhor da vida.


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