Editorial: Lições para o futuro

O tempo presente tornou incontornáveis duas experiências: a de recear pela própria saúde e pela das demais pessoas, agora e nas próximas semanas; e a de se de preocupar com os destinos da economia e, consequentemente, de toda a sociedade. São as mesmas partilhadas em todo o mundo. Mas não é apenas ansiedade o que mobiliza tantos discursos sobre o futuro, para quando a crise de saúde da pandemia tiver sido superada. Cada pessoa e instituição têm tido a oportunidade de reavaliar seu cotidiano sob uma nova ótica.

A situação que se vive, aqui mesmo no Ceará, é toda ela feita de exceções. São condições extraordinárias impostas pela necessidade, mas que deixam entrever imperfeições no tecido social, às quais caberiam aperfeiçoamentos. Quando se tem falado do futuro, não é apenas o que ele pode ter de difícil, mas de como, em alguns casos, ele pode ser até melhor do que os dias antes da pandemia.

Não há dúvidas de que a ameaça da Covid-19, que se lança sobre todos, sem exceção, terá como legado uma série de lições. Em pauta, estará o que cada sociedade pode e, em alguns casos, deve mesmo repensar e reformular. A principal lição que de imediato coloca-se é acerca do egoísmo. O isolamento social ao qual os especialistas da saúde convidam é exclusivamente físico. Poucas vezes se demandou da sociedade que ela fosse tão rigorosamente o que é: a união de todos que dela fazem parte, sejam pessoas ou instituições, em toda sua rica diferença, em vistas do bem comum.

As dificuldades enfrentadas cotidianamente por grupos vulneráveis tornam-se mais evidentes. Suas carências se multiplicam e suas mazelas se intensificam. Não faltam exemplos: são os casos das pessoas que vivem em situação de rua; aquelas que estão encarcerados em espaços superlotados; trabalhadores autônomos, sem condições de ofertarem seus serviços.

Diversas ações emergenciais têm sido promovidas, por parte da sociedade civil, ora aliada às instituições públicas, ora de forma independente. Arrecada-se, por meios diversos, valores ou produtos essenciais para serem repassados àqueles que ficaram em condições mais desfavoráveis num regime de reclusão para o qual não se pode tomar medidas previdentes. Nem tudo o que enfrentam é provocado pela pandemia e pela condição de isolamento, preexiste, mas foram amplificados por eles.

Outro caso sobre o qual a crise tem convidado a se pensar é o tipo de assistência dada por nossa sociedade aos mais velhos. Importante salientar que não se trata apenas da relação do poder público, das responsabilidades da União, dos estados e municípios com esta parcela da sociedade. O poder público, evidentemente, precisa ter responsabilidades para quem tanto já contribuiu à sociedade. Contudo, é igualmente indispensável o esforço da própria sociedade. Família, amigos, vizinhos: todos podem dar sua contribuição, seja material, nos gestos de empatia, como o de prestar auxílios, e no afeto a idosos, em especial, aqueles que precisam viver sozinhos e sem assistência.

Mudanças do gênero não devem ser proteladas para o ponto ainda incerto da superação da pandemia. Podem e devem ser promovidas agora, para que tenhamos desde já uma sociedade mais saudável e solidária.


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