Editorial: Entre recuos e avanços

Crises imensas, como a que sacode a saúde e a economia globais, costumam monopolizar as atenções e jogar fumaça sobre outras movimentações que têm tamanho e importância próprios e que, em nenhum tempo, devem passar despercebidos. São embates internos da sociedade, que podem levar à superação de problemas históricos, por vezes, aparentemente simples de serem solucionados, mas demasiado calcificados para qualquer saída fácil.

A atenção dada pelos poderes Executivo e Legislativo à cultura é motivo de um debate antigo e contínuo. Alguns diagnósticos há muito foram estabelecidos, com prognósticos definidos, sem que seu reconhecimento tenha garantido que estes fossem postos em prática. Há, por exemplo, um histórico de investimentos minguados e insuficientes, alvos de cortes seguidos ao sinal da menor turbulência – o que, no Brasil, não chega a ser nenhuma exceção.

Em âmbito federal, a Cultura deixou de ter um ministério dedicado a ela, passando a ficar sob responsabilidade de uma secretaria especial – primeiro, no organograma do Ministério da Cidadania; atualmente, na Pasta do Turismo. O orçamento auge do antigo Ministério da Cultura (MinC) foi de R$ 4,3 bilhões, em 2014. Sucessivos cortes fizeram o montante previsto para este ano, a ser administrado pela Secretaria Especial da Cultura, chegar a R$ 2 bilhões. 

Principal mecanismo do Governo Federal para apoiar diretamente projetos artísticos, o Fundo Nacional da Cultura (FNC) chegou a dispor de R$ 195 milhões e R$ 344 milhões, em 2009 e 2010, respectivamente. No ano passado, contou com R$ 995 mil. O fundo é alimentado por recursos da própria União, e sua destinação é definida a partir de convênios, editais e premiações.

Contudo, há avanços no campo cultural  que devem ser reconhecidos e notados. São conquistas que coroam não apenas embates históricos do setor, em benefício da sociedade, mas que devem servir de faróis para ações futuras. Estas não podem ser pontuais, sob pena de terem efeitos aquém do necessário; é fundamental que façam parte de políticas de Estado, que sejam continuadas para além dos humores desta ou daquela administração pública. 

Ontem, 96 servidores tomaram posse, no Palácio da Abolição, passando a integrar o quadro funcional da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (Secult-CE). Essa nova equipe da Pasta é formada por aprovados em concurso público, realizado no ano passado. O certame foi o primeiro da história da Secult-CE. Criada em 1966, a secretaria  foi a primeira do gênero no País, antecedendo mesmo o MinC. Em mais de meio século sem concursos, é fácil imaginar as condições em que a Secult-CE operava.

A posse vem ao encontro de outra boa notícia, que é a reabertura da Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel – agora, Biblioteca Estadual do Ceará –, prometida para o primeiro semestre deste ano. Há seis anos fechado, o equipamento cultural já tem nova equipe gestora, que segue trabalhando para a retomada das atividades – e a criação de novas ações para a biblioteca.

Avanços como este, em âmbito local, devem ser valorizados. Tomam o curso que a cultura – essa esfera fundamental para qualquer sociedade – precisa seguir, para o bem maior de um país.