Editorial: Economia e política

Há na tela de comando dos operadores do mercado, o desenho do grave quadro fiscal do País: o Estado brasileiro gasta, há cinco anos, mais do que arrecada. Para superar esse déficit, a única, clássica e tradicional saída é pela ampliação do endividamento. Hoje, a relação Dívida/PIB está chegando aos 100% (era de 76% antes de eclodir a pandemia da Covid-19). O mercado, que segue essa gangorra, já precificou esse rombo, razão pela qual o dólar se mantém acima dos R$ 5,50 e os juros exigidos pelos títulos do Tesouro Nacional não são os básicos da Selic, fixados em 2% ao ano, mas muito acima deles. Para papéis com vencimento em 2026, os juros cobrados são de 6,5% ao ano; os que se vencerão em 2031, estão pagando juros anuais de 7,20%.

O Banco Central tem o que já foi chamado de confortável colchão de liquidez, e ainda o é: reservas internacionais superiores a US$ 370 bilhões. Mas essas reservas, hoje, têm rendimentos quase nulos, uma vez que os juros nos mercados estrangeiros estão quase todos negativos. Usar essas reservas para o resgate de títulos da dívida será uma providência que necessitará de decisão do Conselho Monetário Nacional.

Mas, além dos números frios com os quais ordenam o que comprar, o que vender e em que momento isso deve ser feito, os investidores acompanham cada detalhe do que acontece na relação entre os poderes, atentos aos movimentos da política. Perscrutam qual o melhor caminho para o mercado, diante de suas possibilidades sobre as quais o Governo Federal pondera: a necessidade de se manter o teto dos gastos, com medidas econômicas austeras, capazes de minimizar o endividamento; e a possibilidade de se investir em grandes obras, decerto importantes para o País, como o Projeto de Transposição do Rio São Francisco e a Ferrovia Transnordestina.

Nas telas dos operadores do mercado acendem e apagam as luzes vermelhas, apontando para o caos financeiro que emergirá de uma crise fiscal ainda mais grave, se as chamadas reformas estruturantes - a tributária, a administrativa, a patrimonial e a política - não forem logo definidas, apreciadas e aprovadas pelo Congresso Nacional. São estas questões antigas, discutidas e aventadas repetidas vezes, mas por demasiado tempo proteladas.

Não menos importante nessa equação são as consequências da pandemia da Covid-19 - sanitária, social, econômica e financeira -, ainda não superada. Avança-se no País, é fundamental que se mantenha esse movimento, mas o cenário futuro permanece eivado de incertezas.

Na última semana, convergiram os entendimentos do Executivo e da Câmara dos Deputados quanto ao Renda Brasil - provável substituto do Bolsa Família, do Auxílio Emergencial e de outros programas sociais do Governo Federal. O programa é visto, nessas esferas do poder, como uma boa solução para atender às necessidades imediatas de milhões de famílias desassistidas. Faltam ser definidos o seu valor mensal e a origem dos seus recursos, que, na opinião da equipe econômica, sairiam da extinção de alguns programas, entre os quais o Abono Salarial.

Todas estas dificuldades registram-se no âmbito próprio da política, e é assim que deve sempre acontecer no regime democrático.


Assuntos Relacionados