Editorial: Avanço e retrocesso

O índice de vendas nos centros comerciais do País todo registrou incremento de 9,5% no desempenho do período natalino, se comparado com o faturamento de 2018. A informação foi divulgada pela Associação Brasileira de Lojistas de Shopping. A entidade explicou que analisou questionários respondidos por 400 empresas de varejo de cidades diversas, com dados do período de 1 a 20 de dezembro. É, não se discute, um resultado verdadeiramente auspicioso para uma economia que vinha marcando passo havia alguns anos.

A performance do comércio lojista é, sem dúvida, um avanço. Espera-se que seja replicado por outros setores produtivos e pode-se dizer que representa um impulso necessário à recuperação de tempo e lucro perdidos. É também um ganho para a geração de emprego e renda e para a arrecadação de tributos, o que significa consequentes melhorias na capacidade de investimentos, serviços e obras públicas.

Deve ser, sob qualquer ponto de vista, celebrado. Quem acredita no Brasil há de se animar, independentemente da orientação política ou dos fundamentos econômicos que adote.

Mas não é só essa a notícia da temporada. Enquanto a economia se tornava menos cambaleante, a liberdade de expressão e as garantias democráticas se viam mais uma vez confrontadas: registrou-se, no Rio de Janeiro, um episódio que vem sendo considerado com características de ato de terror – um ataque com artefatos artesanais, os chamados “coquetéis molotov”, contra a produtora de vídeos que serve ao grupo de humoristas Porta dos Fundos.

Está-se, portanto, diante de duas situações diametralmente opostas: a primeira indica a possibilidade de passos adiante, haja vista que aponta para a necessária e impostergável renovação da sustentação econômica da população, com reflexos evidentes no erário e nas finanças das famílias. A outra seria sinônimo de um inaceitável retrocesso, capaz de empurrar o País para as trevas de uma barbárie, impensável numa democracia.

Não interessa ao Estado Democrático de Direito a natureza dos conteúdos que uma  empresa venha a produzir. Vale, sim, apurar se respeitam a legalidade e se obedecem aos limites do bom-senso. Similares a crimes assim houve os que se verificaram nos anos 1970 e 1980 contra bancas de jornais, em Fortaleza, inclusive, que comercializavam publicações da imprensa alternativa.

Estabelece o artigo 5º da Constituição Federal que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, acrescentando no item X que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Isso, por princípio e fim, já ressalta o quanto merece de repúdio um ato que se pretende, agravado pelo uso da violência, como cerceador da criatividade e do pensar.

Temos uma sociedade em amadurecimento. Acatar agressões aos direitos de expressão e de julgamento é o mesmo que se curvar ao atraso. Cabe às instituições a resposta adequada e rigorosa a qualquer gesto que nem sequer vise a arranhar as liberdades civis.