Editorial: A força do altruísmo

Certas expressões de uso corrente no cotidiano traduzem bem a disposição do brasileiro. Disseminadas por vielas e apartamentos, das metrópoles aos rincões menos povoados, elas são repetidas, numa manifestação de um espírito acolhedor. "Aqui sempre cabe mais um", "Bota mais água no feijão", entre outras, emergem como exemplos desse misto de amparo e empatia.

Em momentos de crise como o que o País vive, tais palavras não arrefecem. Ao contrário, apresentam-se repaginadas, em distintas maneiras de cooperação. O cerne da questão leva a um inegável e oportuno entendimento: são atitudes de quem luta com criatividade e urgência para reduzir os danos, amenizando as formas de contágio do novo coronavírus e promovendo a busca por novos horizontes. Semeiam esperança, em meio a um presente de futuro nebuloso.

No Ceará, um bom número de ações realizadas nas últimas semanas aponta para um alerta quanto à necessidade de volver o olhar com mais afinco para pessoas socialmente vulneráveis e, consequente, de despertar para o senso de consciência coletiva. Por ora, não é possível se estar junto presencialmente, mas, com boa vontade e ciência das possibilidades à mão, surgem maneiras de driblar o dificultoso cenário.

É a pessoa que cria um grupo no WhatsApp para ajudar vizinhos empreendedores; são equipes que preparam refeições para doar em espaços onde pessoas em situação de rua se avolumam; são donos de restaurantes que, em face do decreto estadual de manter as portas dos estabelecimentos fechadas, fazem com que os alimentos não se percam, mas possam parar nas mãos e paladares de quem mais precisa.

Altruísmo. Palavra sucinta, mas carregada de força, é aquilo que move essas práticas. Surgido em território francês no século XIX, tendo como pai o filósofo Augusto Comte (1798-1857), o termo foi cunhado como uma espécie de antônimo do individualismo, justamente para definir pessoas que guiavam ações sempre em prol dos outros, privilegiando a coletividade. Registrando o comportamento em vocábulo, o pensador compreendia que aqueles capazes de controlar a natureza egoísta de seus atos, estavam aptos a pensar mais no todo. Nada diferente do que os milenares ensinamentos bíblicos já traziam, por exemplo, ou a própria dinâmica lógica do mundo, mimetizada em sentenças de apelo popular, a "juntos, somos mais fortes".

Nesse sentido, o que parece definir este instante singular que o mundo vive é exatamente o que ele deixará quando tudo tiver fim. Há muitas teorias. Mas certo é que, por lentes otimistas, há reais chances de se transformar expressões de mesquinhez e egocentrismo em solidariedade, doação. Porque se houve algo que ficou bastante exposto quando dessa nova realidade foi a completa interdependência das pessoas.

A crise que se abateu sobre o mundo é ampla, chegando a todos os territórios, classes sociais, grupos etários, culturas e credos. As respostas que se mostraram eficientes, até o momento, exigem sempre ações coletivas e conscientes da importância de se agir assim. Olhar o outro e entender o que une cada cidadão de um País - e, mesmo, do mundo - é um exercício oportuno para o presente e um legado desejável para o futuro.