Estádios sem alma e sem memória

Confira a coluna desta sexta-feira (23)

Após o encerramento da Copa do Mundo no Qatar, houve um belo show pirotécnico. Imagens internas e externas do Estádio Lusail, em Doha, mostraram os requintes desse equipamento que tem capacidade para 80 mil torcedores. Agora o Estádio Lusail vai ser demolido. Extravagâncias inexplicáveis. Absurda ostentação. Ainda hoje me pergunto a razão por que um país, sem a mínima tradição no futebol, cheio de tabus e preconceitos, ganhou o direito de sediar a Copa?

Depois que inventaram o padrão FIFA, perdi a graça pelos estádios assim enquadrados, inclusive o Castelão. São tão semelhantes por dentro que basta conhecer um deles. Viva o PVzinho de açúcar. Aliás, são profundos os laços sentimentais que me prendem ao estadinho da Gentilândia. A primeira vez que entrei no PV foi em 1956. Eu tinha nove anos de idade. Arquibancadas de madeira. Alambrados de madeira. Só uma parte de concreto, onde ficavam as duas cabines de rádio (também de madeira). Modificaram muito o PV, mas deixaram pedaços da história na entrada principal e em alguns setores. O Estádio Lousail vai virar pó. Desaparecerá para sempre. Decididamente, a Copa do Qatar estava fora do ninho.  

 

Já era 

 

O “Estádio 974”, palco do jogo Brasil 4 x 1 Coreia do Sul, válido pelas oitavas de final da Copa do Mundo do Qatar, começou a ser demolido um dia depois dessa partida. O Estádio tinha capacidade para 44.089 torcedores. Agora o Estádio Lusail está demolido. Acho tudo isso muito esquisito. Como essa Copa foi bater no Qatar? Segredos da Fifa... 

 

Uruguai 

 

Exemplo de compromisso com a memória é o Estádio Centenário, em Montevidéu, sede da primeira Copa do Mundo de 1930. Permanece intacto. Tem capacidade para 65.235 torcedores. Ventilaram a possibilidade de o Uruguai sediar a Copa de 2030, em comemoração ao centenário da primeira Copa. As autoridades já disseram que não aceitam qualquer tipo de reforma no “Centenário”. 

 

Carta 

 

Há um texto belíssimo, intitulado “Dois velhos amigos e uma carta”. Não sei quem é o autor. É uma obra prima. O texto narra um recado do Estádio Centenário ao Maracanã, lamentando a reforma que transformou o antigo “Maior Estádio do Mundo” num estádio qualquer, semelhante a tantos outros existentes por aí.  

 

Texto 

 

Quem ama a memória do futebol deve ler a carta citada no tópico anterior. É fácil de encontrar. Basta colocar no Google “Dois velhos amigos e uma carta”. Pronto. Aí você encontrará na íntegra a mensagem do Estádio Centenário para o Maracanã. Há uma passagem linda que diz: “O que fizeram contigo foi o que de pior pode acontecer a um estádio: tomaram sua alma”.  

 

Sem alma 

 

Pior foi o que fizeram no Qatar. Construíram estádios voláteis, sem compromisso com absolutamente nada. Não estão nem aí por ter sido o palco da maior final de todas as Copas. Não quiseram nem saber se Messi, um dos maiores jogadores de todos os tempos, viveu naquele cenário a sua maior glória.