Mulheres ainda precisam da autorização do marido para fazer laqueadura no Brasil de 2022

Projeto de lei aprovado por deputados para retirar consentimento de cônjuges ainda precisa passar pelo Senado e pelo Poder Executivo

Legenda: Projeto aprovado na Câmara sobre laqueaduras cumpre apenas a primeira etapa do processo até se tornar lei efetiva no Brasil
Foto: Agência Brasil

A aprovação na Câmara dos Deputados do projeto que derruba a exigência de consentimento do marido para a cirurgia de esterilização da mulher, diminui a idade mínima para o procedimento e permite a realização na mulher logo após o parto foi um primeiro passo a ser comemorado na luta dos direitos reprodutivos - ainda que a aprovação tenha acontecido oito anos após apresentação da proposta. 

Ainda assim, a saga continua. A aprovação na Câmara dos Deputados na terça-feira (8) é o primeiro passo de um caminho que passa ainda pelo Senado e pela Presidência da República para que seja efetivado e posto em prática nos hospitais. 

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Ou seja, a proposta segue agora para o trâmite de discussões no Senado. Se houver mudanças, voltará para a Câmara. Se não, seguirá para análise do presidente da República que poderá sancionar ou vetar a proposta. 

O presidente tem 15 dias úteis para decidir. O veto pode ser total ou parcial. Todos os vetos têm de ser votados pelo Congresso. Para rejeitar um veto, é preciso o voto da maioria absoluta de deputados (257) e senadores (41). Se foram oito anos para discussão na Câmara, nada garante celeridade no Senado.

A realidade no Brasil

A lei que estabelece as políticas de planejamento familiar no Brasil é de 1996. A exigência do consentimento para esterilização de homens ou de mulheres que estejam em um casamento reconhecido por lei é um dos critérios para os procedimentos de vasectomia e laqueadura.

Ambas as cirurgias são oferecidas pelo SUS. No entanto, no caso das mulheres - que são as que mais se submetem ao procedimento - há outros obstáculos a serem enfrentados, desde opiniões médicas sobre o possível arrependimento da paciente até a recusa expressa de profissionais da saúde para realizar o procedimento - o que é caso de Justiça, aliás.

Dados do Ministério da Saúde de 2019 mostram que 80.654 mulheres se submeteram à laqueadura e 58.772 homens à vasectomia.

Hoje, tanto para homens como para mulheres, é necessário ter mais de 25 anos ou, pelo menos, dois filhos vivos. A laqueadura, vale ressaltar, só pode ser feita no parto do terceiro filho. A solicitação do pedido deve ser feita 60 dias antes do procedimento, com suporte da Assistência Social na Unidade Básica de Saúde - um processo longo que, segundo a lei, visa "desencorajar a esterilização precoce".

O projeto aprovado na Câmara garante ainda a oferta de qualquer método e técnica de contracepção no prazo máximo de 30 dias. A idade mínima para a cirurgia pode cair para 21 anos.

Embora seja um dos métodos mais efetivos para evitar gravidez, há um percentual de falha de 2%, que independe do paciente ou do médico. A reversão, apesar de possível, tem poucas chances de sucesso e nem sempre tem cobertura garantida dos planos de saúde. Essas informações constam nos termos de consentimento da cirurgia.

As leis devem servir para nos dar retaguarda e proteção, não para decidir por nós. A decisão de uma mulher sobre não querer ter filhos (ou mais filhos, no caso da legislação em discussão sobre a laqueadura no Brasil) e optar por recorrer a um método de esterilização tem de ser respeitada e assegurada pela lei. 

Não é novidade para ninguém que a responsabilidade sobre contracepção e criação de filhos recai principalmente sobre as mulheres. 

A assistência social deve atuar de modo a orientar sobre planejamento familiar, caminhos legais, riscos à saúde e outras informações importantes que baseiam qualquer decisão na vida. Jamais essa orientação deve ter o intuito de se sobrepor aos direitos individuais.

O debate é antigo e vem sendo protelado nos espaços de poder, afinal, eles são feitos majoritariamente por homens. É torcer para que não sejam necessárias tantas outras datas comemorativas, tantos outros dias internacionais da mulher, para que o parlamento atue sobre questões que já deveriam estar superadas no século XXI.



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