Salvar vidas é necessário e urgente; salvar empregos e empresas, também

O que acontecerá com essas milhares de pequenas empresas – e com seus funcionários – quando chegar 30 de março, a próxima segunda-feira, daqui a cinco dias?

Esqueçam o que disse ontem, estabanadamente, o presidente da República, que cedinho da manhã desta quarta-feira, 25, em entrevista no portão de entrada do Palácio da Alvorada, explicou mais ajuizadamente o que pretendeu dizer na noite anterior: que está preocupado com o coronavírus e com o desemprego, e o que dele advirá se o isolamento decretado “por alguns governadores e prefeitos” prosseguir por mais tempo.

Pousemos os olhos na paróquia que habitamos – o Ceará, onde podem ser desempregados funcionários do setor de serviço de Fortaleza – bares, restaurantes, salões de beleza, empresas de eventos, agências de viagem e hotéis, por exemplo.

Todos esses estabelecimentos são pequenos negócios, que geram 70% dos empregos formais, isto é, com carteira assinada.

O caixa dessas pequenas empresas só tem capacidade de respirar durante um mês – o dinheiro entra do dia primeiro até o dia 30, quando sai de uma vez para o pagamento da folha salarial, das obrigações trabalhistas, das contas de água e luz, do aluguel e... dos impostos.

Pois bem. Esse dinheiro deixou de entrar desde o dia do início da vigência do decreto do governador que proibiu as atividades das atividades econômicas aglomeradoras de gente.

O que acontecerá com essas milhares de pequenas empresas – e com seus funcionários – quando chegar 30 de março, a próxima segunda-feira, daqui a cinco dias?

Reparem: o mesmo decreto do governador criou as exceções para a indústria e o comércio, e por isto mesmo continuaram funcionando as indústrias que produzem alimentos, material de limpeza e de higiene pessoal, produtos farmacêuticos, as empresas cujas plantas têm alto-forno, como a Companhia Siderúrgica do Pecém e as fábricas de cerâmica, os supermercados, ao armazéns e bodegas e as farmácias.

Tomemos o caso da usina siderúrgica CSP. Ela tem quatro mil funcionários, parte dos quais terceirizada.

Não há, na CSP, registro de um só caso de funcionário infeccionado pelo coronavírus - mérito da empresa que tomou todas as providências para preservar os idosos e para higienizar as instalações de sua usina, cujos locais de acesso estão mais vigiados – foram suspensas todas as visitas à fábrica.

Se houve lá algum caso de contaminação, não foi ainda comunicado às autoridades da Secretaria da Saúde.

Nas indústrias de massas e biscoitos, que operam normalmente com a mão de obra de milhares de pessoas na área de produção e nos escritórios administrativos, também não há registro de infectados.

Estes dados, certamente, conduzirão o governador Camilo Santana à revisão do seu decreto, cuja validade, é bom lembrar, terminará no próximo domingo, 29.

Há, neste momento, pressão – e a pressão é legítima, mesmo em tempos de coronavírus – dos empresários da construção civil, do comércio varejista de rua e de shoppings centers, do setor de serviços, incluindo a hotelaria, no sentido de que seus negócios retomem a normalidade, obedientes, contudo, às recomendações das autoridades sanitárias.

Empresários da indústria cearense da construção civil, com os quais esta coluna conversou, asseguram que, nos seus canteiros de obras, seus serventes, pedreiros, pintores, eletricistas, bombeiros hidráulicos e engenheiros estarão mais seguros do que nos bairros onde residem – eles usam obrigatoriamente o Equipamento de Proteção Individual e recebem alimentação.

Que fiquem bem claro: em primeiro lugar, nesta gravíssima emergência, está a tarefa dos profissionais da saúde – muito bem executada até aqui – de salvar vidas humanas,

Mas, em segundo lugar, está a preservação das empresas e dos empregos.

A quem interessa a paralisação total da atividade econômica – que seria o caos?

O presidente Bolsonaro, infelizmente, quando fala, mesmo lendo um texto previamente elaborado, só atrapalha o seu próprio governo, pois consegue contradizer à noite o que disse ao longo do dia.

Se Bolsonaro impuser à sua língua uma quarentena de 15 dias – igual à exigida para quem se contaminou pela Covid-19 – e permitir que seus competentes ministros administrem seus respectivos setores - terá dado uma grande ajuda à Nação e a ele mesmo.