Prisão preventiva: renovação no prazo nonagesimal

Escrito por Redação ,

No dia 15 deste mês de outubro, o traficante André do Rap, de altíssima periculosidade, obteve sua liberdade em liminar no HC 191836 concedida pelo Min. Marco Aurélio e, na condição de plantonista, o Presidente Luiz Fux, embora sem previsão legal em matéria penal, mas diante da provocação pelo procurador geral da República, suspendeu a referida liminar (SL 1395), ante à urgente perspectiva de fuga do liberado e, imediatamente, submeteu o assunto ao plenário virtual.

No Plenário, prevaleceu o entendimento de que, embora a suspensão de ato jurisdicional de outro ministro do STF, pelo presidente, seja excepcional, no caso, em razão da periculosidade do réu para a segurança pública, a gravidade concreta do crime, o deferimento da contracautela é justificado para preservar a ordem pública (tráfico transnacional de mais de quatro toneladas de cocaína, mediante organização criminosa violenta e que ultrapassa as fronteiras nacionais, de preso já condenado por 25 anos, tendo antes ficado foragido por 5 e agora procurado pela Interpol).

O Ministro Presidente Luiz Fux lembrou que, pela nova Lei nº 13.655/2018 de Introdução ao Direito Brasileiro, aplicada a qualquer área do Direito, todo magistrado no Brasil é obrigado a examinar as consequências de suas decisões. Já havia cerca de 700 HC "engatilhados" para semelhantes solturas de pessoas muito perigosas.

Quanto à matéria de fundo, o STF, contando inclusive com os votos dos ministros considerados excessivamente "garantistas", referendou a ordem de prisão determinada pelo ministro Fux e, ao fim do julgamento, por maioria de votos (8 a 1, dada ausência do ministro Tofolli), fixaram o entendimento de que a inobservância da reavaliação no prazo de 90 dias, previsto no artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), com a redação dada pela Lei 13.964/2019 (conhecida como pacote anticrime), não implica a revogação automática da prisão preventiva: o juízo competente deve ser instado a reavaliar a legalidade e a atualidade de seus fundamentos.

Juiz não deve ser "mero boca da lei" e sequer precisa buscar o ensinamento de Hans Kelsen: a norma jurídica permite mais de uma interpretação válida. Todavia, a verdadeira interpretação é a sistêmica, sendo a literal a que mais conduz o aplicador da norma, ao erro.

Embora o único que ficou vencido no citado julgamento tenha sido o ministro Marco Aurélio, imediatamente, após o julgamento, e já seguindo a maioria do STF, negou outro HC, que tinha o mesmo fundamento rejeitado, de que, ultrapassado o prazo nonagesimal a prisão seria ilegal e o acusado deveria ser posto em liberdade.

É importante lembrar que foi o próprio STF, por 6x5, em constante mudança de entendimento sobre o tema, que terminou contribuindo para esse problema porque, além de não admitir a prisão, após confirmação da condenação em 2ª instância, mas só após o trânsito em julgado da condenação, que poderá passar mais de 20 anos, ainda flexibilizou sua própria Súmula 691 ("Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar).

O traficante André do Rap já havia sido condenado duas vezes por tráfico ilícito de droga, no 1º e 2º graus. Se já estivesse preso, não se estaria agora falando da regra do art.316 do CPP, mas sim, de execução da pena.

A flexibilização da Súmula 691 fez com que o STF chamasse para si o julgamento de muitos HC, que não são da sua competência constitucional e propiciasse a que os advogados buscassem o melhor Relator para a liminar.

Conforme a CF/88, art. 102, I,"d", "i" e II, o STF só é competente para conhecer diretamente de "habeas corpus" oriundo de ato de "competência originária" -de Tribunal Superior-, cabendo, todavia, conhecer de "Recurso Ordinário em HC", nos demais casos. E, no caso, o referido traficante fora processado desde o inicio por juiz de 1º, recorrendo ao Tribunal de Justiça e depois ao STJ, onde teve negada a sua liberdade, não havendo sequer a chamada "teratologia". O ministro Fux acaba de publicar a Resolução n. 706, de 15/10, sobre a distribuição dos processos no STF para evitar que os interessados burlem a prevenção e cheguem ao ministro desejado. Falta só o Congresso levar à discussão Emenda que permitira a volta da prisão após condenação em 2ª. Instância.

Agapito Machado

Juiz Federal