Perdurar no tempo

Escrito por Lúcia Helena Galvão ,
Lúcia Helena Galvão Maya é filósofa
Legenda: Lúcia Helena Galvão Maya é filósofa

Uma das coisas mais difíceis e que exigem empenho em nossas vidas é a capacidade de fazer com que as coisas perdurem no tempo. Somos impulsivos e imediatistas, e nada preparados para caminhadas longas. Inclusive nossos valores atuais não tendem a ver com bons olhos este esforço pela perduração, e sim o impulso saltitante de uma ideia a outra, de uma paixão a outra, sem que nada se consolide.

Imaginem tal ideia projetada sobre nosso corpo físico, na infância: não vamos consolidar ossos, musculatura, tecidos, órgãos, nada: damos um impulso inicial a estes sistemas e saímos, com nossa consciência, borboleteando, em busca de outros interesses. Que tipo de corpo teria um ser humano assim? Para que tarefas estaria preparado?

Mas, felizmente, não é assim que ocorre: toda natureza elege um objetivo e persegue-o com perseverança e ritmo. A árvore já existe, como objetivo, dentro da mínima semente, e ela perdurará nesta busca até que os resultados sejam atingidos. A pequena lagarta já caminha resolutamente, embora com passinhos curtos, mas ritmados, rumo ao horizonte da borboleta.

Costumo dizer que qualquer objetivo, por distante que seja, tem como dificuldade não a sua execução, mas a perduração. Pegue algum código de conduta muito elevado e exigente, tal como o nobre óctuplo caminho de Budha. Não há um único ser humano que eu conheça que não seja capaz de fazer tudo aquilo que esse Código prevê por dez minutos; o problema está inteiramente no décimo primeiro, décimo segundo, décimo terceiro minutos, e daí por diante. Não é o fazer que é difícil; a dificuldade está em perdurar.

Mas o fato é que é bonito imaginarmos que não vamos abandonar nossos sonhos, e que vamos arrastá-los montanha acima até sua concretização; imaginarmos que não vamos abandonar nossos sentimentos, e que vamos caminhar com eles até que se tornem tão sólidos que beirem a imortalidade; acreditar que não vamos abandonar a nós mesmos, como um esboço mal acabado, pelo meio do caminho, mas que vamos chegar, com todo esforço necessário, ao ser humano que sonhamos ser. Sim, isso é belo de se imaginar e de se viver.

Em Nova Acrópole, estamos completando 65 anos como voluntários ensinando Filosofia prática para despertar o humanismo na vida das pessoas, e não desistimos, nem vamos desistir. E convidamos a todos para brindarem conosco por esta data, e pelo gosto de vitória que podemos experimentar quando simplesmente sabemos perdurar no tempo!

Lúcia Helena Galvão é filósofa