O que a brincadeira nada infantil de Round 6 nos diz sobre um capitalismo destrutivo

Escrito por Márcio Silvestre ,

Em toda rede social por onde você flanar nos últimos dias, vai encontrar memes com a série 'Round 6'. As brincadeiras infantis universais como o jogo com bolinhas de gude, o carisma de personagens como o idoso frágil e a adrenalina da competição em si despertam muitos sentimentos e associações sobre a série. Mas há nela algo que precisa ser iluminado. 'Round 6' é uma alegoria do capitalismo financeiro.

Foi esse o objetivo do diretor Hwang Dong-hyuk quando bolou a trama mais acompanhada hoje na plataforma Netflix. A série traz, de forma exagerada, surreal, elementos que compõem a etapa desumana do capitalismo que todos estamos vivendo.

De um lado, estão os cidadãos que vivem endividados. Eles formam a base da pirâmide. E fala-se de todo tipo de cidadão, do preguiçoso que vive às custas de parentes ao trabalhador que tenta pagar suas contas em dia e não consegue porque acaba atropelado pela inflação, pelos impostos, pelos juros, pelos limites da própria saúde. A meritocracia, tão defendida, salva poucos na trama real da vida. É apenas a exceção que possa confirmar a regra da banalização da injustiça social, como alertou o psiquiatra Christophe Dejours.

No alto da pirâmide, está uma elite, um pequeno e bilionário grupo que ganha compulsivamente dinheiro sobre dinheiro, enquanto assiste impassível ao aumento da pobreza, sem questionar a causa, sem defender mudanças. Faz isso "escondendo o rosto", do alto dos seus lugares inacessíveis. Entre esses humanos da base e do topo, há aqueles que fazem a engrenagem rodar. Eles manejam o jogo (administram organizações), eliminam (demitem) jogadores quando é necessário e alguns procuram formas de corromper ainda mais o sistema, como a série mostrou, ao abordar a venda de órgãos dos jogadores que, derrotados nas competições, eram assassinados.

Assim é 'Round 6', numa alegoria do capitalismo que precisa se reimaginar, como afirma Rebecca M. Henderson. Os agentes do modo de produção que combina livre iniciativa e democracia precisam colocar na equação as variáveis justiça social e justiça ambiental. Sem elas, como diz a professora Henderson, o capitalismo caminha para destruir a si mesmo, o planeta e, como na série Round 6, quase ninguém vai sobreviver ao último jogo.

Consultor pedagógico
Davi Marreiro
16 de Abril de 2024