Mudanças no Código de Processo Penal: antes feito do que perfeito, mas nunca de qualquer jeito
A proposta de revisão do Código de Processo Penal brasileiro tramita no Congresso Nacional há mais de 10 anos (Projeto de Lei nº 8.045/2010). Apesar dos bons tempos de dormência, o projeto ganhou atenção máxima do parlamento, que vem, nos últimos dias, discutindo seu texto “a todo vapor”.
A reforma do código se revela necessária, sobretudo porque a norma processual vigente (Decreto-Lei nº 3.689/41) remonta à época da ditatura do Estado Novo, com forte expressão fascista, porquanto explicitamente inspirada no Código Rocco italiano, de 1930, o qual, por sua vez, teve seu texto erguido sobre uma matriz inquisitorial, autoritária.
Realmente, com a superveniência da Constituição Federal de 1988, o Brasil assumiu valores que vão categoricamente de encontro à tradição autoritária (basta considerar a garantia do contraditório e da motivação das decisões judiciais). Desde então, consagrou-se, no âmbito do processo penal brasileiro, o sistema acusatório (ou adversarial), em que não há confusão entre as funções de acusar e de julgar, atribuídas, constitucionalmente, a órgãos distintos.
Com o projeto em tramitação, a missão do Congresso é a de compatibilizar o processo penal brasileiro com os preceitos estabelecidos no texto constitucional.
O projeto em discussão no parlamento não é perfeito. A lei perfeita talvez seja só aquela autoritária, à qual descabe até críticas. A “melhor” lei – pensamos – é exatamente aquela elaborada em ambiente democrático; construída pelo Parlamento, em representação da sociedade. Imperfeita, pois. O que não significa dizer que possa ser produzida de todo jeito.
Após tempos de letargia, o projeto teve sua tramitação acelerada em meio à pandemia, situação que pode ter um efeito deletério, ante a necessidade do satisfatório debate acerca das alterações promovidas no sistema processual penal brasileiro (que não são poucas!).
Nada obstante, caminha bem o projeto com as sugestões de fixação de prazo máximo para as medidas cautelares, de consolidação do juiz de garantias e da implementação da investigação defensiva, por exemplo.
Avancemos. Mas com debate e a devida cautela. E não de todo jeito.
Matheus Braga
Advogado. Presidente da Comissão de Estudos em Direito Penal da OAB/CE. Mestrando em Direito pela UFC.