(In)fidelidade partidária?
As regras que regem as eleições brasileiras costumam sofrer mudanças nos anos anteriores ao pleito. A mais recente “Reforma Eleitoral” acrescentou o parágrafo 6.º ao artigo 17 da Constituição Federal, tratando dos casos em que parlamentares podem desligar-se dos partidos em que foram eleitos sem perderem seus mandatos.
Dessa forma, foi pacificada uma das grandes discussões eleitorais desde a redemocratização: o mandato pertence ao partido ou ao eleito? Pode o eleito se desvincular do partido pelo qual obteve o cargo? Há diferença no tratamento de cargos proporcionais e majoritários? À permanência do eleito ao partido ao longo de seu mandato, deu-se o nome de Fidelidade Partidária.
Argumentos interessantes permeavam ambos os lados. Para os defensores da titularidade do mandato pelo eleito, a ausência da fidelidade partidária no artigo 55 impedia sua cassação. Além disso, o protagonismo no sistema majoritário seria do candidato e não da sigla, não sendo razoável a sua punição.
Os demais entendiam que, ao se exigir a filiação partidária como condição de elegibilidade (art. 14, § 3º, V da Constituição Federal), impossibilita-se candidatura fora da agremiação e, por conseguinte, o exercício de mandato sem vinculação à sigla que o viabilizou. Tal debate findou-se com o advento da Emenda Constitucional n.º 111/2021, estabelecendo que aos detentores de mandato majoritário (Senadores, Presidente, Governadores e Prefeitos) é permitida a livre migração e desfiliação. Já aos proporcionais (Deputados e Vereadores), só é autorizada
a desfiliação ou migração em algumas hipóteses.
Desse modo, pode o parlamentar sair da agremiação sem perder o mandato em casos de grave perseguição política pessoal, mudança ao programa partidário, autorização expressa do partido, não atingimento da cláusula de barreira pela sigla ou migração feita durante a janela partidária. Parece-me que, com a constitucionalização das regras do jogo, talvez
este seja mais bem jogado, com as siglas estimuladas a entender que seu papel institucional envolve também o ônus de buscar representantes alinhados com suas ideologias ou suportar os danos da escolha de infiéis.
Estevão Mota Sousa é advogado