A leitura como resistência
Em tempos de quarentena, o isolamento social, ao passo que distancia as pessoas fisicamente, permite outras formas de relacionamentos, tanto do indivíduo com seus pares, quanto com os elementos de sua própria rotina, que precisa se readequar. A casa passou a ser o espaço de socialização possível, e encontrar formas de lidar com o tempo disponível para além do trabalho tem gerado ansiedade nas pessoas, acostumadas com a exigência constante de produtividade.
Usar o tempo para ler, nesse momento, pode ser um fator de manutenção da saúde mental, que nos entretém e possibilita a vivência de experiências outras que só a leitura de um bom livro pode proporcionar. Como disse Proust uma vez, " sempre gostamos de sair um pouco de nós mesmos, de viajar, quando lemos". E às vezes é só isso que buscamos, espairecer a mente, estar no conforto de nosso lar vivenciando uma história e esquecendo um pouco da realidade ao redor.
Mas a leitura pode ser mais do que isso, a leitura pode ser resistência, em seu sentido de continuar, sobreviver, não ser derrotado, defender-se. É a aposta do sujeito em si mesmo através da palavra. É uma maneira de não estar a serviço do trabalho integralmente, incansavelmente produtivo. É uma forma lúcida de relaxamento e de um distanciamento do mundo através da imersão nas infinitas possibilidades que um livro pode oferecer. É silenciar para ouvir. A literatura pode ser sua forma de sobrevivência.
Ler é mais do que uma simples ação, é acreditar que o prazer também pode ser transformador e construtivo. Reservar um tempo para a leitura diária é um investimento em si mesmo, é sua contribuição para se tornar alguém mais consciente e que pode fazer diferença no mundo. Ler é aprender, é ouvir, é falar. Ler não é só absorver passivamente as palavras de um livro, é também o investimento ativo que você faz nela. E em você mesmo. Leiamos!
Allan Ratts de Sousa
Psicólogo e mestre em psicologia pela Universidade Federal do Ceará