Editorial: Uma difícil solução

O Ministério do Desenvolvimento Regional comunicou que o rompimento do conduto de concreto da barragem de Jati, no Ceará, que danificou o seu talude, está corrigido: “foi uma falha na montagem e comissionamento do conjunto de válvulas do Ramal 2”. Não houve qualquer indício de sabotagem, como chegou a ser aventado. O comunicado pode ser entendido como mais um evento ligado ao Projeto São Francisco de Integração de Bacias, em torno do qual – desde 2007, quando começaram as obras de sua construção – vem sendo escrita uma crônica que mistura o interesse político, a demora excessiva dos serviços, os impressionantes recursos financeiros que o empreendimento já consumiu, cerca de R$ 12 bilhões, e a necessidade de outro tanto de dinheiro para conclusão, da qual constam os ramais do Apodi, cuja licitação foi anunciada, e do Salgado, ainda em fase de elaboração do projeto executivo. 

A discussão sobre o projeto dá-se, agora, a respeito de que modelo de operação e manutenção ele deve ter. O próprio MDR já admitiu a possibilidade de privatização da maior obra de infraestrutura hídrica realizada no Brasil. Um mergulho nas águas de projetos semelhantes implantados ao redor do mundo, porém, apurou que é o poder público, isoladamente, ou em parceria com a iniciativa privada, que os opera e os mantém. São bons exemplos desse modelo os vales do Colorado e do Tennessee, nos Estados Unidos, do Jordão, em Israel, e os dos vários dos rios da Espanha. 

No caso do Projeto São Francisco, há um conjunto de dúvidas aguardando solução em curtíssimo prazo. A principal delas é a divisão, entre os estados beneficiados – Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco – dos custos anuais da operação, estimados hoje em quase R$ 300 milhões. Há perguntas até agora não respondidas: esse custo será repartido igualmente entre as partes? Os estados de maior população, de maior orçamento e de maior consumo de água pagarão mais pela despesa da energia elétrica que já movimenta as nove estações elevatórias? Que custo terá a água do Projeto São Francisco para a indústria, para as atividades de produção agropecuária e para o consumidor final das grandes cidades e da zona rural? 

Sabe-se que a Chesf já exporta, com tarifa especial, isto é, reduzida, para o Sul e Sudeste, a energia que geram suas hidrelétricas. Por que não usar essa mesma tarifa para as atividades econômicas dos estados beneficiados pelo Projeto São Francisco? – é o que perguntam empresários cearenses, replicando seus colegas potiguares, paraibanos e pernambucanos. Na semana passada, o titular do MDR, Rogério Marinho, conheceu, pessoalmente, os grandes projetos hídricos dos EUA, que operam em parceria público-privada. Esse modelo poderá ser copiado aqui, respeitando as características da população e da economia do semiárido nordestino. Se fosse fácil superar este desafio, isso já teria acontecido. Há interesses diversos a serem conciliados e, na tentativa de encontrar a convergência, é que o ministro Marinho tem amiudado suas conversas com os governadores do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. 

É a crise financeira que castiga os governos da União e dos estados que retarda a solução. O lençol é curto para cobrir tantos interesses.