Políticas de industrialização possibilitam experiências em presídios

Ações contribuem na ressocialização das detentas e capacitam para o mercado de trabalho. Neste mês, a unidade penitenciária IPF Auri Moura Costa abriu 10 novas vagas, empregando um total de 50 mulheres

Escrito por Redação , metro@svm.com.br
Legenda: Detentas do Auri Moura Costa participam de programa que auxilia na ressocialização

A vivência de mulheres privadas de liberdade, reclusas entre quatro paredes, nem sempre precisa ser limitadora. Com as políticas de industrialização dentro de penitenciárias, são abertos novos caminhos de amadurecimentos e de reintegração das detentas na sociedade. Conforme a coordenadora de Inclusão Social do Preso e do Egresso da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), Cristiane Gadelha, o Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa emprega um total de 50 mulheres em duas fábricas da unidade, instaladas desde março do ano passado.

O programa "Tecendo o Futuro", iniciativa do Instituto Diageo, já possuía 30 participantes e, neste mês, 10 novas vagas foram abertas, enquanto a fábrica Mallory permanece empregando outras 10 detentas. O incentivo ao projeto de industrialização nos presídios foi intensificado em 2019, período em que a SAP começou a convidar empresas para se instalarem nas unidades prisionais, explica Cristiane. "A gente anualmente tem lançado um chamamento público para as empresas terem essa vontade de se instalarem nos presídios e fazerem seus trabalhos lá dentro", acrescenta.

As detentas recebem uma remuneração de 75% do salário mínimo ao mês, no valor de R$ 779,25, trabalhando 40 horas semanais. No caso da Ypióca, são destinadas pelo menos 8 horas ao longo da semana para realizar formações humanas, habilitando as mulheres para se planejarem para vida, traçando perspectivas e possibilidades de reinserção na sociedade.

Para ela, os projetos refletem positivamente nas detentas, uma vez que podem ocupar outros espaços para além das celas e vivenciar experiências de trabalhos profissionais. "Mexe na autoestima, na ansiedade e no comportamento. Quando ela vai para a empresa, se sente em um ambiente de trabalho. Têm um fardamento da empresa e são tratadas como funcionárias. Isso muda a forma como elas veem o aprisionamento". Além disso, para cada três dias de trabalho, é abonado um dia da pena prisional.

Humanizar

Para além da capacitação do trançado da palha de carnaúba e da elaboração das embalagens dos produtos Ypióca, o projeto "Tecendo o Futuro", em parceria com o Instituto Diageo, também busca proporcionar formações humanas para as detentas. Na manhã de ontem (12), a partir de uma peça teatral, foi levantado um debate acerca do consumo de bebidas alcoólicas.

"A gente entende a responsabilidade que temos em criar oportunidades; em ver as pessoas e não os estereótipos; e em oferecer tanto uma capacitação, quanto mostrar os caminhos que vão permitir que elas voltem a se inserir na sociedade", aponta o gerente executivo do Instituto Diageo, Paulo Mindlin. Ele percebe que o trabalho em conjunto das empresas com o poder público tem condição de fazer uma diferença significativa na vida dos detentos.

A coordenadora de Inclusão Social do Preso e do Egresso percebe as ações humanizadas como um diferencial, porque "trabalha não só a atividade, mas a pessoa também. Procura desenvolver a autoestima e a criatividade das mulheres envolvidas no trabalho da empresa", diz.

Cadastramento

Na unidade Auri Moura Costa estão presente um total de 954 internas, conforme aponta Cristiane, no entanto, apenas 50 mulheres são beneficiadas pelos serviços de emprego, representando somente 5,2% das detentas. Na visão de Paulo Mindlin, "é necessário que diversas empresas de iniciativas privadas atuem nos presídios, porque cada empresa tem um limite de sua capacidade de investir em um projeto como esse e de ter uma parte da sua produção acontecendo lá".

Segundo a coordenadora, os presídios já possuem espaços para receber as empresas e qualquer uma pode aderir aos editais que costumam ser abertos. "A gente deve lançar ainda outro este ano, mas em 2019 a gente lançou em dezembro" e já possuem empresas em fase de implantação.

Perspectivas

Interna no Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa, Gisele Cristina comenta que a ocupação dentro da detenção foi além de ser apenas um cargo de trabalho. "Com esse projeto, eu pude ter perspectivas. Pude perceber que eu sou uma mulher que pode fazer várias coisas e que não preciso percorrer caminhos de vida ruins, que me causam danos. Aqui, pude ser reconhecida como Gisele Cristina, como mulher que tece palha, uma mulher que trabalha com a mente e com sabedoria", pontua.

Para Gisele, a oportunidade de participar do projeto Tecendo o Futuro também contribuiu para o seu reconhecimento psicológico, dentro ou fora da cela. "Eu consegui me reconhecer como pessoa, que antes eu nem sabia que eu era. Aqui dentro, pude reconhecer quem eu sou, o que eu quero da minha vida e os valores que eu quero passar pra minha filha", diz.

Através do projeto, Gisele não só aprendeu valores como pretende leva-los para fora dos muros do Instituto, quando já estiver em liberdade. "Percebi outras habilidades minhas. Quando eu estiver livre, pretendo fazer uma faculdade de administração que é uma área que eu gosto, pois sempre estou à frente de projeto, de organização, e eu me identifico", revela.

Gisele conta ainda que amadureceu bastante desde que passou a ser interna. "Eu aprendi muitas coisas aqui dentro, mas o amor próprio foi o principal aprendizado. Foi esse sentimento que eu criei por mim aqui dentro: me amar em primeiro lugar. Fazer aquilo que eu quero com amor e carinho. Eu não sabia o que era isso", reflete.

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