Internações por síndromes gripais caem 96% em relação ao pico

Na última semana de julho, os casos de hospitalização por SRAG no Ceará foram 28 vezes menores que em maio, na semana de maior registros. Mesmo com diminuição, especialistas mantêm alerta e necessidade de isolamento

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: O Ceará tem 8,9 de taxa de incidência de SRAGs a cada 100 mil habitantes, segundo o Observatório Covid-19
Foto: Kid Júnior

A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) já reconheceu que o Estado atravessou dois picos de casos da Covid-19: o primeiro no dia 20 de março, e outro entre 1º e 20 de maio, mais intenso. Contudo, atualmente, há uma tendência de desaceleração na transmissão da doença e menor demanda assistencial. Segundo o sistema Infogripe, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), os casos reportados de internação por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) no Estado, na última semana de julho, são 96% menores do que os da primeira semana de maio, que detém o recorde de registros.

Conforme os dados extraídos do Infogripe e analisados pelo Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares, a semana epidemiológica 19 - entre 3 e 9 de maio - registrou 1.883 notificações de SRAG, número 49 vezes maior do que os 38 da mesma semana de 2019. Já na semana 31 - entre 27 de julho e 1º de agosto -, foram apenas 66 registros, seis vezes maior que o igual período do ano passado, com dez registros. Em relação à semana 30, imediatamente anterior, a queda foi de 77%.

"Nasceu de novo". É como descreve Luciana Maria de Oliveira, esposa de Adão José de Holanda, sobre os cerca de 15 dias que o marido passou internado no Hospital de Campanha do Estádio Presidente Vargas, em Fortaleza. Diagnosticado com coronavírus em junho, ele foi tratado na unidade e já retornou ao convívio da família, no bairro Edson Queiroz. "Passaram medicação para tomar em casa e, graças a Deus, hoje ele está bem. A gente continua tomando cuidado porque ninguém sabe direito se pode ter de novo, mas ele não sentiu mais nada", comemora.

A introdução da Covid-19 entre as doenças respiratórias em circulação no Ceará teve efeito avassalador na demanda das redes de saúde. Ainda segundo o Infogripe, os casos registrados entre janeiro e julho de 2020 são 22 vezes maiores que os registrados no mesmo período do ano passado. O sistema dá conta de 15.796 ocorrências nos primeiros sete meses deste ano, contra 716 em igual intervalo anterior. Os 15.080 casos excedentes levam à preocupante porcentagem de 2.106% de aumento.

Ano atípico

Os dados do Infogripe se aproximam das informações divulgadas pela própria Sesa, no mais recente boletim epidemiológico semanal da Pasta. Até 3 de agosto, 15.415 pessoas com SRAG foram hospitalizadas; a maioria (56,7%) homens. Ao todo, neste ano, o Ceará notificou 30.360 casos de SRAG ao sistema de informações sobre gripe do Ministério da Saúde, sendo que 16.945 testaram positivo para o novo coronavírus e 270 para outros agentes - metade destes por influenza.

Magda Almeida, secretária-executiva de Vigilância e Regulação da Sesa, comenta que 2020 é um ano atípico, de epidemia, logo "teremos um número maior de síndromes gripais e respiratórias agudas graves". "Isso não significa que a gente esteja numa segunda onda, porque para isso precisamos comparar com semanas anteriores desse mesmo ano. Nossa análise de reabertura e controle de óbitos se faz assim, não comparando com o ano passado", garante.

Isolamento

O infectologista Robério Leite, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), reforça que a adesão dos cearenses ao isolamento foi fator importante para desacelerar a propagação da doença. "Se começa a diminuir a taxa de incidência em um determinado local, começa a ter uma curva de declínio. Menos pessoas estão sendo infectadas e menos precisam de atenção. O isolamento era para diminuir a velocidade de transmissão e a taxa de incidência", ressalta.

Porém, o especialista indica que o cenário ainda é muito "instável" para garantir a continuidade dos bons indicadores. Isso porque Fortaleza, embora com números em queda, mantém "comunicação forte" com municípios do Interior. "Você tem uma nova dinâmica chegando na região, retroalimentada na Capital. À medida que a gente vai voltando ao normal, com menos cuidados, os números vão mudando", explica. O alerta de casos retornando do Interior para as capitais, chamado "efeito bumerangue", foi divulgado por pesquisadores do Comitê Científico do Consórcio Nordeste no início de julho.

Atenção

Segundo o último boletim do Observatório Covid-19, também da Fiocruz, o Ceará tem 8,9 de taxa de incidência de SRAG a cada 100 mil habitantes, abaixo da média nacional de 10,2 entre a mesma população. Ainda assim, o Estado fica em terceiro no Nordeste, atrás de Alagoas (18,4) e Sergipe (12,3), e ocupa a 12ª posição entre as unidades federativas. Os pesquisadores indicam "situação de alerta para todo o País".

Nas últimas semanas, diante da "grande flutuação no número de casos" e aumentos em algumas áreas, os estudiosos recomendam avaliar com maior atenção a flexibilização do isolamento, a interiorização da pandemia e a disponibilidade de testes para detecção da doença.

Para o infectologista Robério Leite, ainda é incerto definir como a Covid-19 vai agir no Ceará neste segundo semestre, caracterizado por menor ocorrência de chuvas, baixa umidade do ar e tempo mais seco. Assim como outros vírus respiratórios, "é possível" que a doença tenha uma sazonalidade, embora no clima tropical essa característica não seja tão marcante.

"Nada impede que a gente tenha novos picos mais para frente. Os vírus respiratórios se comportam dessa maneira, podem ocorrer o ano todo. Como a Covid-19 vai se comportar, realmente é muito difícil de dizer. Quando você observa uma pandemia, isso muda, é realmente imprevisível", examina o médico.

Magda Almeida, da Sesa, reitera a impossibilidade da previsão, mas observa que o coronavírus segue um fluxo semelhante à influenza. "Ele entrou aqui na nossa quadra invernosa e, quando começamos a entrar em outra estação, diminuiu. No Sul, também entrou na época do inverno, mas São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, foram atingidos antes disso. Parece ter relação com a sazonalidade, mas não dá pra falar com certeza", afirma.

Os destaques das últimas 24h resumidos em até 8 minutos de leitura.